O temor e a esperança
Quando um ano termina e outro começa, é humano desejar que o desconhecido seja melhor do que aquilo que já conhecemos. Por isso, gostaria de partilhar as esperanças de um ano de 2011 melhor para todos, sobretudo para quem está desempregado, para quem sofre as consequências do congelamento das reformas e pensões baixas, dos cortes salariais e cortes de apoios sociais, para quem são particularmente difíceis e penalizadores os aumentos de impostos como o IVA, dos transportes, da electricidade e de outros bens essenciais.
Sabemos, no entanto, que vai ser muito difícil conseguir a ruptura na caminhada para um autêntico desastre económico e uma verdadeira tragédia social face às políticas actuais em Portugal e na União Europeia. O Conselho Europeu, que terminou em 17 de Dezembro passado, ficará nos anais da história da União Europeia como responsável por ter metido a cabeça na areia e ter continuado a adiar soluções essenciais para enfrentar a grave crise social que se vive. Aliás, ignorou-a. Tal como, de certo modo, o primeiro-ministro, José Sócrates, continua a fazer em Portugal.
Nas conclusões do Conselho, nada é dito sobre o desemprego ou sobre a situação de pobreza que ameaça cerca de 120 milhões de pessoas dos Estados que são membros da União Europeia. A sua única preocupação é o mercado financeiro. Por isso, decidiu alterar o Tratado de Lisboa para satisfazer a Alemanha e o mercado financeiro europeu (grupos financeiros alemães, franceses e seus aliados), para criar o chamado Mecanismo de Estabilidade Financeira. Os condicionalismos que estabelece para o Estado-membro da zona euro que o tiver de utilizar significam, na prática, transformar esse país num protectorado do «directório» comandado pela Alemanha e, sobretudo, dos grupos financeiros europeus.
O apoio à especulação financeira
Pelo caminho ficaram todas as promessas, sucessivamente adiadas, e agora esquecidas, de decisão sobre uma taxa relativa a movimentos de capitais, sobre restrições ao mercado de derivados e aos paraísos fiscais.
Registe-se que ainda consta do site do PE, com data de Maio de 2010, que «a União Europeia está a considerar proibir esta prática», referindo-se aos «swaps» especulativos detidos por investidores que não detêm as obrigações subjacentes, já que os especuladores podem adquirir CDS (uma espécie de títulos de seguros contra incumprimento de pagamento da dívida) contando com o incumprimento por parte dos governos. É preciso não esquecer que, quanto maior for a probabilidade de incumprimento por parte dos governos de pagamento da sua dívida soberana, maior será o valor do CDS, o qual funciona como garantia contra o incumprimento. E aí está uma base essencial da especulação financeira dos mercados de que Portugal e os portugueses estão a ser vítimas.
Sabemos que a generalidade dos governos da União Europeia, incluindo Portugal, estão controlados pelos ditos «mercados». E, como é da sua natureza, estão empenhados em chegar o mais longe possível nos seus ganhos, seja através da especulação com matérias-primas e bens alimentares, seja de bens mobiliários ou imobiliários, incluindo títulos de dívida pública ou até de reformas e pensões. Tudo serve. Mas se a isso conseguirem juntar os baixos salários e o trabalho escravo, então é «ouro sobre azul». Mais uma vez, Portugal aí está a servir de exemplo, sob a ameaça de medidas mais graves se tiver de recorrer ao FMI.
Medidas urgentes
Por isso, proibir as práticas acima referidas é algo essencial para acabar com a especulação financeira e com a verdadeira sucção da riqueza dos países de economias mais frágeis por parte do sector financeiro internacional. Daí a importância de serem os estados a controlar o sector financeiro e outros sectores básicos da economia, como a energia, os transportes e as comunicações, além da importância de cada país ter o direito de garantir a segurança alimentar do seu povo.
Mas, como temos referido, é também essencial apostar num programa de crescimento económico, de aumento da produção (agrícola, industrial, pescas…), de criação de emprego com direitos e de apoio a serviços públicos de qualidade. O que vai passar por muitas pequenas e grandes lutas, em Portugal e noutros países da União Europeia, incluindo por um grande reforço da luta ideológica, que permita tornar claro que há políticas alternativas e que é possível uma ruptura com estas políticas e estes políticos serventuários dos ditos mercados financeiros. A luta vai ser dura, mas é essencial e é a base da esperança num futuro melhor, que temos de construir em conjunto com todos os que o desejam e o esperam de nós, do PCP.