A propósito de novas freguesias

Vicente Costa

Esta con­versa eu­fé­mica com que nos en­volvem cons­tan­te­mente, di­zendo coisas su­aves e pro­messas fa­gueiras que nos vão trans­formar a vida, só van­ta­gens e me­lho­rias di­ri­gidas a uma qua­li­dade de vida in­ve­jável, tudo a fazer para nosso bem e dos nossos, como ja­mais se viu e di­fi­cil­mente se verá em fu­turo pró­ximo; esta con­versa que vem ten­tando se­duzir-nos para que fa­cil­mente nos leve ao con­ven­ci­mento de que as me­didas pre­co­ni­zadas e todas as que foram já postas em prá­tica são ex­ce­lentes e não se vis­lumbra nada me­lhor que se com­pare, se­quer, para a nossa con­dição hu­mana; esta con­versa, di­zíamos, chega bem fresca à lem­brança tra­zida por pan­fletos com o tí­tulo «Novo Mapa de Lisboa – Fre­gue­sias mais fortes» onde, uma vez mais, se cantam loas às ini­ci­a­tivas que se pre­param para cuidar do nosso bem-estar.

Se re­cor­darmos o bem-estar in­di­zível que nos pro­voca a des­truição de es­colas por todo o País, pe­rante o ina­cre­di­tável as­sombro e de­sa­grado de alunos, pais e pro­fes­sores, gente in­grata que não des­cor­tina que tudo é feito para seu bem, para que au­mente a de­se­jável qua­li­dade do en­sino, para que todos te­nham a ele o gra­tuito di­reito, cada dia mais gra­tuito como toda a gente vê, menos esses que gostam de se ma­ni­festar sem que al­guma razão lhes as­sista...

Se nos ocorrer à me­mória a enorme sa­tis­fação, ainda bem pre­sente, ex­pe­ri­men­tada ao as­sis­tirmos à ico­no­clastia le­vada a cabo no de­sa­pa­re­ci­mento e en­cer­ra­mento de hos­pi­tais, ma­ter­ni­dades, cen­tros de saúde; à per­se­guição mo­vida sem quartel pelos ico­no­clastas a pro­fis­si­o­nais da Saúde que nada fazem, face aos mi­li­o­ná­rios sa­lá­rios que usu­fruem, tudo na pers­pec­tiva dos que, esses sim, nos tratam da saúde...

Se nos lem­brarmos, e lem­bramo-nos todos os dias, que temos a es­pan­tosa van­tagem de ver de­crescer sa­lá­rios e ver ins­ti­tuir e au­mentar taxas, im­postos, preços, ali­men­tação, o que é per­fei­ta­mente justo já que, con­forme nos vão me­tendo nos ou­vidos, a po­pu­lação está a en­gordar a olhos vistos...

Se aten­tarmos na fa­lência de mi­lhares de em­presas que pro­vocam ou­tros muitos mi­lhares de de­sem­pre­gados; se é por isso com cer­teza, por não terem tra­balho, que há os tais gordos e ana­fados, em ba­nhos de sol nas praias das Ca­raíbas...

Se aten­tarmos em tudo o que atrás se enu­mera com sa­tis­fação, já que tudo é feito para que todos ex­pe­ri­men­temos os be­ne­fí­cios vindos da­queles que nos querem bem, é caso para se per­guntar: que raio de gente é esta, in­grata, mal-agra­de­cida, que ainda é capaz de querer mais?

Ah! Pois quer!

An­si­o­sa­mente, aguar­davam-se novas fre­gue­sias!

A juntar às que existem?

Não se­nhor! Nem pensar! Casam-se umas com ou­tras e das 54 pas­sa­riam para 24! Mesmo assim ainda fi­ca­riam umas onze para se­gundas núp­cias...

Há quanto tempo se es­pe­rava uma ini­ci­a­tiva tão fixe, para «com mais com­pe­tên­cias e mais re­cursos os nossos pro­blemas serem re­sol­vidos» (mas então... es­pera aí...); «com uma gestão mais pró­xima das pes­soas...» (logo te ex­plico como isto é...); «com mais di­mensão para gerir...» (esta não estou a ver bem...); «com mais qua­li­dade de vida...» (ah, com esta já fico des­can­sado, já de­sa­pa­re­ceram as dú­vidas)!

Já es­tava a su­ceder con­nosco aquilo que ul­ti­ma­mente tem su­ce­dido com aquela mul­tidão de in­gratos que se ma­ni­festam a torto e a di­reito por esse País fora: a du­vidar do bem que nos querem ofe­recer!

Só se la­menta aquilo que ainda não foi feito, mas que se julga ser da mais ele­mentar jus­tiça fazer-se sem tar­dança: que sejam pro­por­ci­o­nadas ao Go­verno e seus mem­bros todas as be­nesses com que nós temos sido con­tem­plados e atri­buir-lhes, mesmo, uma Fre­guesia pri­va­tiva para que possam ir pregar sos­se­ga­da­mente para outra Fre­guesia, longe dos in­gratos ma­ni­fes­tantes.

Aí, sim, o País fi­cava mesmo por­reiro! E Lisboa ga­nhava uma nova fre­guesia.



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