Tempo de mudança

Anabela Fino

Os se­nhores ana­listas que falam em nome das agên­cias de ra­ting dizem que estas te­mí­veis ava­li­a­doras da cre­di­bi­li­dade das eco­no­mias dos países estão sa­tis­feitas com o re­sul­tado das elei­ções em Por­tugal. Se­gundo um deles (Dou­glas Renwick) de­clarou ao Diário Eco­nó­mico, a sa­tis­fação de­corre da con­vicção das ditas agên­cias de que «um go­verno mai­o­ri­tário tor­nará a im­ple­men­tação de me­didas mais fácil e é por isso po­si­tivo». Sa­bendo que as donas agên­cias «lêem» todas pela mesma car­tilha – esta hu­ma­ni­zação das agên­cias é con­ta­gi­ante – não se du­vida de que o que agrada a uma agrada a todas. Valha-nos isso, ima­gine-se cada qual com as suas exi­gên­cias, era só o que nos fal­tava.

Temos pois que as três-agên­cias-três – de­fi­ni­ti­va­mente as troikas estão na moda – a quem Por­tugal deve a clas­si­fi­cação de «lixo» no res­pei­tante à cre­di­bi­li­dade – Mo­ody's, Stan­dard & Po­or's e Fitch de seu nome – acham, e acham muito bem, que uma mai­oria de di­reita é a me­lhor ga­rantia para im­ple­mentar ra­pi­da­mente o pro­grama da outra troika acor­dado ainda antes de elei­ções com a (também) troika na­ci­onal, esta en­ri­que­cida, diga-se em abono da ver­dade, com a pres­ti­mosa co­la­bo­ração do Pre­si­dente da Re­pú­blica, cujo está tão di­li­gente que nem es­perou pela di­vul­gação dos re­sul­tados ofi­ciais das elei­ções para en­car­regar Passos Co­elho de formar go­verno. O tempo urge e a si­tu­ação não se com­pa­dece com es­qui­si­tices de prazos e pro­ce­di­mentos, dizem-nos, por mais le­gais que sejam.

«Quanto mais de­pressa se formar a co­li­gação, mais de­pressa o novo go­verno po­derá co­meçar a cum­prir as con­di­ções do pro­grama UE/​FMI», diz Renwick fa­lando em nome da Fitch, a qual por sinal está em es­tado de alerta e pronta a baixar outra vez o ra­ting de Por­tugal de­vido ao «risco de as metas or­ça­men­tais fi­xadas para este ano [um dé­fice de 5,9%] po­derem der­rapar de­vido à con­tracção eco­nó­mica». Esta é uma opi­nião par­ti­lhada pela Stan­dard & Po­or's, que já no seu re­la­tório de 11 de Maio fazia notar: «A lon­ge­vi­dade do pró­ximo go­verno por­tu­guês vai de­pender não só da força do seu man­dato, mas também do im­pacto co­la­teral que as me­didas de aus­te­ri­dade exi­gidas vão ter no ren­di­mento dos elei­tores e no em­prego». Também a Mo­ody's está à es­pera para ver em que ponto param as modas, man­tendo Por­tugal em vi­gi­lância para «re­visão em baixa».

Como se pode per­ceber pelo acima ex­posto, as donas agên­cias de ra­ting de modo algum podem ser acu­sadas de ig­no­rantes. Sabem que os pro­gramas im­postos podem matar o do­ente, mas estão dis­postas a ar­riscar porque entre um tra­ta­mento e outro sempre vão abo­ca­nhando al­guma coisa. Veja-se o caso da Grécia, com em­presas ven­didas ao des­ba­rato à Ale­manha e à França, tal qual como está pre­visto su­ceda em Por­tugal, a co­meçar já pelo BPN, que está na pri­meira linha para ser ven­dido ao des­ba­rato de­pois de nele se ter en­ter­rado mi­lhões do erário pú­blico.

A coisa faz lem­brar a pa­rá­bola da rã e do es­cor­pião. Como se sabe, es­cor­pião não pode deixar de matar a rã que o trans­porta apesar de tal ditar a sua morte, porque isso é da sua na­tu­reza. Mas não es­tando na na­tu­reza das rãs trans­portar es­cor­piões, por que ha­ve­riam de o fazer? Mude-se a his­tória e vai ver-se o im­pacto co­la­teral que isso terá.



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