A pontapé

Anabela Fino

A Comissão Permanente de Concertação Social reuniu ontem, 27, pela primeira vez desde a formação do novo Governo PSD/CDS. À mesa, com os parceiros sociais, ter-se-ão sentado o primeiro-ministro, o ministro de Estado e das Finanças, o ministro da Economia e do Emprego, a ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território e o ministro da Solidariedade e da Segurança Social. Era o que estava previsto à hora de fecho desta edição.

Da agenda constava a «apresentação dos grandes objectivos do Governo em matéria económica e social, bem como o «ponto da situação» do acordo de concertação social assinado a 22 de Março com o então governo do PS por todos os parceiros à excepção da CGTP-IN. Este acordo, recorda-se, contempla a redução das indemnizações por despedimento, proposta entretanto aprovada em Conselho de Ministros e que hoje estará em debate no Parlamento.

Perguntar o que se pode esperar desta reunião é quase uma questão de retórica, coisa que não atrapalha o secretário-geral da UGT, João Proença, que em declarações à Lusa esta segunda-feira disse que «o ponto fundamental» da reunião da Concertação Social, é dar «o pontapé de saída» para uma discussão tripartida para um pacto para a competitividade. Proença também espera para ver as medidas do Governo sobre o emprego, e não descarta que em cima da mesa estejam as questões quentes do momento, como é o caso do aumento dos transportes, da redução das compensações em caso de despedimento dos trabalhadores, a diminuição Taxa Social Única (TSU) dos empregadores e as privatizações.

Aparentemente, Proença não sente qualquer incómodo nem regista a mínima contradição no facto de a Comissão Permanente de Concertação Social se sentar a «debater» matérias – como é o caso da lei dos despedimentos – que estão a ser votadas e/ou em vias disso no Parlamento sem prévia discussão pública, ao contrário do estipulado na lei. Mais, acha tudo tão natural que ainda declara publicamente que esta reunião é o «pontapé de saída» para a discussão... do que já está a ser implementado.

Mas – diga-se em abono da verdade – a UGT está inquieta. E por isso lá foi a Belém transmitir a Cavaco Silva «a preocupação com que todos os trabalhadores e os portugueses, em geral, vêem a atual situação, que é a de um país em dificuldades, com o desemprego a aumentar e as desigualdades sociais a crescerem». Os trabalhadores e os portugueses em geral ficaram certamente agradecidos com a diligência, mas por mais que o tentassem não conseguiriam vislumbrar a presença da UGT em qualquer acção, pequena que fosse, de combate, resistência e luta contra as tais medidas que os preocupam. Não. Isso é para os suspeitos do costume, os da CGTP-IN, que há muito perceberam que a mal chamada concertação social não é nem nunca foi o «pontapé de saída» para uma negociação séria, mas sim uma forma encapotada de «muito democraticamente» e sempre com o aval da UGT correr a pontapé direitos dos trabalhadores duramente conquistados na luta de muitos anos.



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