«Os reféns» era o título da prosa no Público de Correia de Campos, ex-ministro da Saúde do PS. Atirava-se à greve dos maquinistas da CP, de quem procurava demonstrar «um típico abuso de posição dominante».
Explica que os maquinistas, «conhecendo o valor estratégico e a natureza escassa da sua profissão no mercado de trabalho, que impede a substituilidade, estão objectivamente a forçar a mão da empresa».
Pelos vistos, para o Campos, apenas os trabalhadores passíveis de «substituidade» é que podem fazer greve. Obviamente que «substituindo» os trabalhadores em greve, a greve fracassa.
Este discurso de original anti-sindicalismo podia ser inteiramente aplicado às greves dos pilotos de aviação, mas Correia de Campos não toca nesses, a sua vergasta vai para os maquinistas da CP. Deve ser por estarem mais perto «da ferrugem» e dos operários –
Acontece que, do mais humilde camionista (que são aos milhões, por esse mundo) aos sofisticados aviadores, a luta sindical assenta invariavelmente no mesmo pressuposto: assumir, o mais possível, a tal «posição dominante» para forçar o patrão (seja ele público ou privado) a ouvir e a negociar as suas reivindicações. E para essa «posição dominante» (que é o estado normal do patronato, que tem sempre na mão a «posição dominante») os trabalhadores em luta devem usar todos os meios de que disponham. É isto que a democracia consagra.
Campos sabe isto – o coração é que lhe «bate» no lado direito..
Os «reféns» (II)
Mas Correia de Campos faz mais – argumenta a favor do patronato. Diz ele que «não é difícil concluir que a empresa não poderá ter outra posição. Se cedesse, abdicaria de um dos mais preciosos poderes funcionais, o poder disciplinar, estaria doravante na mão dos sindicatos».
O que Correia de Campos não diz é que as largas dezenas de maquinistas (e não «alguns maquinistas», como escreve) a quem os camaradas em greve exigem que lhes sejam levantados os processos disciplinares, foram assim castigados pela administração da empresa a pretexto do «não cumprimento dos serviços mínimos» sem qualquer motivo de facto (os ditos serviços mínimos estipulados foram cumpridos escrupulosamente), de uma maneira absolutamente ilegal e concretizando um abuso de poder (aqui, sim, em evidente «abuso de posição dominante») que, a deixar-se passar em branco, deixaria os trabalhadores e os seus sindicatos totalmente à mercê do patronato.
Os «reféns» (III)
O que Campos diz é isto mesmo... mas na posição do patronato, de quem afirma que «se cedesse», «estaria doravante na mão dos sindicatos».
Como se vê, este homem, de um partido que se diz «socialista», pensa como já agiu, como ministro da Saúde: com uma visão de direita, demagógica e burlona, ao serviço dos interesses do grande capital.