Reduzir salários não aumenta a produtividade

Eugénio Rosa

Uma das afirmações mais repetidas em Portugal, nomeadamente pelo governo e pela troika estrangeira, assim como pelos patrões e pelos defensores do pensamento económico neoliberal dominante nos media, é a baixa produtividade do trabalho em Portugal. E para isso comparam a produtividade portuguesa com a de outros países da União Europeia. No entanto, nunca comparam os salários dos portugueses com os dos outros países da UE.

Prosseguir este caminho, como o Governo PSD/CDS e a troika estrangeira estão empenhados, só agravará ainda mais a crise económica e social em Portugal

E a partir daquela afirmação, que se transformou num lugar comum dos ultraliberais (as causas nunca são profunda e honestamente analisadas) insinua-se ou afirma-se mesmo que a culpa é dos trabalhadores e que estes recebem salários que não correspondem à produtividade que têm. Com base nisso aparece a estranha teoria de que, para aumentar a produtividade e a competitividade das empresas, é necessário baixar os salários em Portugal entre 15% e 20%. E é esse um objectivo das medidas que a troika estrangeira e o Governo PSD/CDS estão a impor aos trabalhadores portugueses através do congelamento e mesmo corte de salários; por meio da destruição do emprego e consequente disparar do desemprego que depois é utilizado para pressionar os trabalhadores a aceitarem salários cada vez mais baixos; por meio das alterações na lei do subsídio de desemprego (redução do valor e da duração), para obrigar os desempregados a aceitarem salários inferiores aos que recebiam antes de serem despedidos; por meio do aumento do trabalho gratuito (redução das férias e dos feriados), etc. Actualmente, já mais de 10,5% dos trabalhadores portugueses, ou seja, 500 000 recebem apenas o salário mínimo nacional, e este número está a crescer de uma forma rápida (entre Outubro de 2007 e Outubro de 2010 aumentou em 75%). E se retirarmos ao salário mínimo o desconto para a Segurança Social (11%) restam 431,65€ um valor próximo do limiar da pobreza.

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Esta estranha teoria de que se impuser salários ainda mais baixos em Portugal a produtividade e a competitividade aumentarão não tem correspondência real. E isto porque os custos do trabalho em Portugal já são significativamente inferiores aos médios da União Europeia e esse facto nunca resolveu o problema da baixa competitividade das empresas portuguesas. O Quadro 1, construído com dados recentemente divulgados pelo Eurostat, mostra que os custos do trabalho em Portugal já são bastante inferiores aos da União Europeia.

Segundo o Eurostat, em 2011, o custo do trabalho por hora em Portugal, para toda a economia (não incluía a Administração Pública) correspondia a 52,4% do custo médio da União Europeia; a 30,8% do custo da hora do trabalho na Bélgica; a 40,2% do custo da hora de trabalho da Alemanha; e a 58,7% do custo da hora do trabalho na Espanha.

Se a comparação entre Portugal e os países da União Europeia for feita com os custos do trabalho na indústria, as percentagens obtidas ainda são mais baixas para Portugal. Assim, também em 2011, e de acordo também com o Eurostat, os custos do trabalho por hora na indústria em Portugal correspondiam apenas 43,8% da média dos países da União Europeia; a 25,4% dos da Bélgica; a 30,1% dos Alemanha, e a 47% dos da Espanha.

E tenha-se presente que os custos do trabalho não correspondem na sua totalidade aos salários recebidos pelos trabalhadores. E isto porque os custos do trabalho, para além de incluírem os salários, também incluem as contribuições patronais para a Segurança Social, as remunerações e despesas dos administradores, etc., e também as indemnizações por despedimentos em cada ano.

Afirmar, como diz o Governo e a troika estrangeira, assim como os seus «amigos» estrangeiros e os seus defensores internos nos media, que são os custos do trabalho em Portugal a causa da baixa competitividade das empresas e da economia portuguesa, é mais uma mentira e insere-se numa campanha que visa condicionar e manipular a opinião pública com o objectivo de a levar a aceitar passivamente, como inevitável, a terapia de choque ultraliberal que está a ser imposta a Portugal e a conduzir a economia e a sociedade portuguesa para o abismo.

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Por outro lado, se compararmos os níveis de produtividade em Portugal com os dos outros países da UE, e se os relacionarmos com os custos do trabalho anteriores, fica clara mais uma mentira da campanha de manipulação da opinião pública que está em curso no nosso país. Para isso interessa analisar os dados do Quadro 2 sobre a produtividade da mão-de-obra por empregado, que foram calculados com base em dados divulgados também pelo Eurostat.

Em 2010, a produtividade da mão-de-obra por empregado em Portugal correspondia a 76,5% da produtividade média da União Europeia, enquanto os custos do trabalho por hora em Portugal correspondiam, como se referiu anteriormente, apenas a 45,4% dos da União Europeia, no mesmo ano. Em relação aos outros países do Quadro 2, a relação era a seguinte: a produtividade por empregado em Portugal era 60% da produtividade da Bélgica, enquanto os custos de trabalho eram apenas 26,1% dos da Bélgica; em relação à Alemanha, a produtividade média em Portugal correspondia 72,6% da alemã, mas o custo de trabalho por hora em Portugal correspondia apenas 31,4% do custo do trabalho por hora na Alemanha; finalmente, a produtividade por empregado em Portugal era 70,2% da de Espanha, mas o custo do trabalho por hora em Portugal correspondia apenas a 47,5% do custo do trabalho por hora em Espanha.

Portanto, existe uma grande diferença, em prejuízo dos trabalhadores portugueses, entre a produtividade em Portugal quando a comparamos com a dos outros países da União Europeia e os custos do trabalho, que incluem os salários pagos, quando fazemos idênticas comparações com as dos outros países da União

Europeia. Em percentagem dos salários médios da União Europeia, os salários em Portugal estão muito abaixo da percentagem que a produtividade portuguesa representa em relação à produtividade média dos países da União Europeia.

Os dados anteriores, que são oficiais pois são os divulgados pelo Eurostat, para além de revelarem um nível de exploração do trabalho em Portugal muito superior ao nível de exploração na União Europeia, também provam, de uma forma quantificada, que não é o nível de salários em Portugal a causa da baixa produtividade e competitividade das empresas e da economia portuguesa.

Prosseguir este caminho, como o Governo PSD/CDS e a troika estrangeira estão empenhados, só agravará ainda mais a crise económica e social em Portugal, aumentando a exploração dos trabalhadores, agravando ainda mais as desigualdades, e atirando o País para uma recessão económica ainda mais prolongada e profunda. E isto porque, como afirma mesmo Robert Reich, ex- secretário de Estado do presidente Clinton, em «After shoc – A economia que se segue e o futuro da América», «Quando o rendimento está concentrado em relativamente poucas mãos, a procura global de bens e serviços contrai-se porque os muito ricos não gastam nem de perto tudo o que ganham. As poupanças deles são acumuladas, para circularem numa fúria de especulação ou, sobretudo nos nossos tempos, para serem investidas no estrangeiro».

Em Portugal, com a redução dos salários dos trabalhadores e com a destruição da classe média, está-se a verificar uma aceleração rápida deste processo de concentração da riqueza em poucas mãos, de que as

privatizações a saldo e a protecção fiscal dos mais ricos são as faces mais visíveis e chocantes.



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