Milhões assinalaram Dia Internacional do Trabalhador

Maio de contestação e festejo dos avanços progressistas

Em todo o mundo, o 1.º de Maio saiu à rua evi­den­ci­ando que a luta de classes se agu­diza no con­texto da ac­tual crise do sis­tema ca­pi­ta­lista, e que a re­sis­tência, os avanços pro­gres­sistas, anti-im­pe­ri­a­listas e até re­vo­lu­ci­o­ná­rios pro­ta­go­ni­zados pelos povos são os mo­tores da eman­ci­pação so­cial do tra­balho face ao ca­pital.

«Um mundo sem tra­ba­lha­dores é im­pos­sível. Um mundo sem ca­pi­ta­listas é ne­ces­sário», su­bli­nhou a Fe­de­ração Sin­dical Mun­dial numa sau­dação ao 1.º de Maio

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Na Eu­ropa, o prin­cipal foco dos pro­testos foi a ofen­siva da grande bur­guesia contra os di­reitos so­ciais, la­bo­rais e eco­nó­micos con­quis­tados nas úl­timas dé­cadas, agressão mul­ti­fa­ce­tada cujo ob­jec­tivo é ga­rantir a ren­ta­bi­li­dade do ca­pital à custa do au­mento da ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores e da pro­le­ta­ri­zação de am­plas ca­madas e sec­tores não-mo­no­po­listas, e da de­gra­dação dos me­ca­nismos de in­ter­venção eco­nó­mica e de pro­tecção so­cial da res­pon­sa­bi­li­dade dos es­tados so­be­ranos, co­lo­cados pela di­reita e pela so­cial-de­mo­cracia na mão do ca­pital fi­nan­ceiro.

Con­fron­tados com a pau­pe­ri­zação abrupta, com ní­veis de de­sem­prego e pre­ca­ri­e­dade re­cordes, e com um ataque aberto à le­gis­lação la­boral, se­gu­rança so­cial, edu­cação e saúde, mais de um mi­lhão de tra­ba­lha­dores, mo­bi­li­zados pelas mai­ores cen­trais sin­di­cais e por ou­tras es­tru­turas de classe, ma­ni­fes­taram-se em cerca de 80 ci­dades de todas as re­giões do Es­tado Es­pa­nhol. Em Ma­drid, Bar­ce­lona, Murcia, Se­vilha ou Va­lência, as ac­ções de massas foram das mai­ores dos úl­timos anos.

Em Itália, ao acto cen­tral di­na­mi­zado pelas três grandes cen­trais sin­di­cais - CGIL, CISL e UIL – em Rieti, a 100 qui­ló­me­tros da ca­pital, Roma, acres­ceram ma­ni­fes­ta­ções e con­cen­tra­ções nas mai­ores ci­dades do país contra a po­lí­tica de aus­te­ri­dade im­posta ao povo pelo exe­cu­tivo de turno, o qual, acusam, apro­funda as po­lí­ticas an­ti­po­pu­lares im­ple­men­tadas pelo go­verno re­ac­ci­o­nário de Ber­lus­coni. Em Turim, sede da po­de­rosa FIAT, tra­ba­lha­dores, de­sem­pre­gados e jo­vens pre­cá­rios não es­que­ceram, no en­tanto, a res­pon­sa­bi­li­dade da so­cial-de­mo­cracia na si­tu­ação em que se en­contra a Itália. Mos­trando que o Par­tido De­mo­crá­tico (PD) e seus ali­ados não só não podem sa­cudir a água do ca­pote como não se apre­sentam como al­ter­na­tiva, ten­taram pedir contas ao se­cre­tário-geral do PD, Pi­er­luigi Ber­sani, e ao ex-líder do par­tido e ac­tual pre­si­dente da câ­mara de Turim, Piero Fas­sino, que en­ca­be­çavam um des­file sin­dical.

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Mais a Norte, em França, a di­nâ­mica elei­toral em torno da se­gunda volta das pre­si­den­ciais não foi capaz de abafar o 1.º de Maio. Ainda que Fran­çois Hol­lande e Ni­colas Sar­kozy te­nham mar­cado o ponto na caça ao voto, apre­sen­tando-se como vir­tu­osos de­fen­sores dos tra­ba­lha­dores, mi­lhões de gau­leses com­pa­re­ceram às 290 ini­ci­a­tivas re­a­li­zadas em todo o ter­ri­tório. De manhã, grandes ini­ci­a­tivas de massas ocor­reram em ci­dades como Mar­selha ou Es­tras­burgo. Ao final da tarde, uma mul­tidão cal­cu­lada em 250 mil pes­soas en­cheu a Praça da Bas­tilha, em Paris.

Contra as po­lí­ticas de em­po­bre­ci­mento e au­mento da ex­plo­ração do factor tra­balho que be­ne­fi­ciam ex­clu­si­va­mente o ca­pital, so­bre­tudo o fi­nan­ceiro; em de­fesa da so­be­rania na­ci­onal e da al­ter­na­tiva so­ci­a­lista, a Frente Mi­li­tante de Todos os Tra­ba­lha­dores (PAME) da Grécia re­a­lizou um enorme co­mício junto à si­de­rurgia do grupo Hel­lenic Haly­vourgia em As­propyrgos, a 35 qui­ló­me­tros de Atenas. A ini­ci­a­tiva foi sim­bo­li­ca­mente mar­cada para aquele local com o pro­pó­sito de, uma vez mais, de­mons­trar que a luta dos si­de­rúr­gicos em greve há seis meses é a mesma que a do con­junto dos tra­ba­lha­dores gregos.

O ca­minho é «a or­ga­ni­zação de uma luta di­fícil e du­ra­doura», sa­li­entou Gi­orgos Si­fo­nios, di­ri­gente sin­dical dos me­ta­lúr­gicos em As­propyrgos e orador cen­tral no co­mício. «Al­guns ques­ti­onam “o que é que os me­ta­lúr­gicos ga­nharam até agora?”», lem­brou ainda. Ga­ran­tiram o lugar de van­guarda e mos­tram que «as lutas não podem ser ava­li­adas apenas pelos ga­nhos ime­di­atos, mas pelo que sig­ni­ficam de pre­pa­ração e ex­pe­ri­ência nas ba­ta­lhas de classe que se se­guem», con­cluiu.

So­li­dá­rios com os ca­ma­radas do Sul da Eu­ropa, na Ale­manha os tra­ba­lha­dores também se mo­bi­li­zaram para as 450 ac­ções con­vo­cadas pela Con­fe­de­ração dos Sin­di­catos ale­mães (DGB). Em Es­tu­garda, o se­cre­tário-geral da DGB sa­li­entou pre­ci­sa­mente essa uni­dade ao acusar os po­lí­ticos eu­ro­peus de não en­fren­tarem os bancos e os es­pe­cu­la­dores, de des­truírem a Eu­ropa com as cha­madas po­lí­ticas de aus­te­ri­dade im­postas aos povos e com a pro­moção dos ne­gó­cios do sector fi­nan­ceiro.

Mi­chael Sommer des­mis­ti­ficou ainda a falsa ideia de que os tra­ba­lha­dores ger­mâ­nicos estão a salvo da ofen­siva em curso e voltou a exigir po­lí­ticas de com­bate à pre­ca­ri­e­dade e a im­ple­men­tação de um sa­lário mí­nimo de 8,5 euros por hora de tra­balho, pro­posta que a chan­celer An­gela Merkel tem re­cu­sado com ar­ro­gância.

Já na Tur­quia, o 1.º de Maio foi as­si­na­lado pela pri­meira vez em 35 anos sem con­frontos de grande di­mensão. Cen­tenas de mi­lhares de turcos en­cheram a Praça Taksim, no centro de Is­tambul e lem­braram a cha­cina de de­zenas de tra­ba­lha­dores em 1977. An­kara, Izmir ou Diyar­bakir foram ci­dades onde de­zenas de mi­lhares de tra­ba­lha­dores também ce­le­braram o seu Dia In­ter­na­ci­onal, e na Rússia, o Par­tido Co­mu­nista da Fe­de­ração Russa (PCFR) pro­moveu mar­chas co­me­mo­ra­tivas do Dia In­ter­na­ci­onal dos Tra­ba­lha­dores alheias à con­vo­cada pelos acó­litos de Vla­dimir Putin e Dmitri Med­vedev, onde a tó­nica do­mi­nante foi a con­ci­li­ação dos in­te­resses de classe e o chau­vi­nismo.

Em Mos­covo, o pre­si­dente do PCFR, Guen­nadi Ziu­ganov, apro­veitou a oca­sião para en­tregar o cartão do Par­tido aos novos mi­li­tantes.


Con­quistar pela luta 

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Se na Eu­ropa o com­bate se de­sen­rola no campo da re­sis­tência à re­ti­rada de di­reitos, na Ásia e África a ba­talha centra-se na con­quista de ga­ran­tias de­mo­crá­ticas, la­bo­rais, so­ciais e eco­nó­micas, estas úl­timas cres­cen­te­mente co­lo­cadas em causa pelo agu­di­zado fosso entre o poder aqui­si­tivo de quem tra­balha e o preço dos bens es­sen­ciais. Exemplo disso foram as ma­ni­fes­ta­ções do 1.º de Maio na In­do­nésia, onde de­zenas de mi­lhares de tra­ba­lha­dores ven­ceram o medo e inun­daram a ca­pital Ja­carta. «Só ga­nhamos o su­fi­ci­ente para comer, não temos di­nheiro para a edu­cação dos nossos fi­lhos e vi­vemos com medo de perder o em­prego», re­sumiu um dos par­ti­ci­pantes no pro­testo.

Em Ma­nila, nas Fi­li­pinas, a marcha do 1.º de Maio di­rigiu-se ao pa­lácio pre­si­den­cial acu­sando o pre­si­dente Be­nigno Aquino de ser um cão obe­di­ente dos ca­pi­ta­listas es­tran­geiros, e em Kuala Lumpur, na Ma­lásia, a ma­ni­fes­tação pa­cí­fica qua­li­ficou de «sá­tira elei­toral» o anun­ciado au­mento do sa­lário mí­nimo feito pelo pri­meiro-mi­nistro.

Na Tu­nísia, pelo menos 20 mil pes­soas mar­charam na ca­pital para exi­girem o cum­pri­mento das as­pi­ra­ções re­vo­lu­ci­o­ná­rias, so­bre­tudo a ele­vação das con­di­ções de vida do povo, e no Egipto

pelo menos três grandes ma­ni­fes­ta­ções rei­vin­di­caram sa­lá­rios, di­reitos e o fim do poder mi­litar.

Em Mar­rocos, o 1.º de Maio foi apro­vei­tado para pro­testar contra a mo­nar­quia e pela de­mo­cra­ti­zação do ter­ri­tório.

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Do outro lado do Atlân­tico, nos EUA,o Dia In­ter­na­ci­onal do Tra­ba­lhador foi as­si­na­lado em 120 ci­dades, nú­mero digno de re­gisto con­si­de­rando que no auto-pro­cla­mado país da li­ber­dade o 1.º de Maio não é fe­riado na­ci­onal, e se se tiver em conta que o mo­vi­mento rei­vin­di­ca­tivo po­pular se en­contra numa fase de re­cu­pe­ração e re­con­fi­gu­ração.

Não obs­tante, uma mul­ti­pli­ci­dade de es­tru­turas re­pre­sen­ta­tivas de tra­ba­lha­dores, de de­fesa de di­reitos so­ciais, da li­ber­dade e da de­mo­cracia e pa­ci­fistas re­a­li­zaram, iso­la­da­mente ou em con­junto, pro­testos em ci­dades como Se­attle, Oa­kland, São Fran­cisco, Chi­cago, Atlanta, Los An­geles, Al­bu­querque, Bal­ti­more, Boston, New Haven, Phi­la­delphia, Pitts­burgh, Washington ou Sa­cra­mento.

Em Nova Iorque, vá­rias mar­chas e con­cen­tra­ções di­na­mi­zadas por co­li­ga­ções he­te­ro­gé­neas de or­ga­ni­za­ções di­ri­giram-se a bancos, sedes de mul­ti­na­ci­o­nais, de­par­ta­mentos fe­de­rais e à prin­cipal praça fi­nan­ceira mun­dial, exi­gindo que os in­te­resses do grande ca­pital deixem de pre­va­lecer sobre os in­te­resses da es­ma­ga­dora mai­oria da po­pu­lação.

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Mais a Sul, no Centro e Sul do con­ti­nente Ame­ri­cano, o povo das Hon­duras mar­chou de­baixo de chuva in­tensa na ca­pital, Te­gu­ci­galpa, e na se­gunda maior ci­dade do país, São Pedro de Sula, exi­gindo de­mo­cracia, o fim dos as­sas­si­natos de sin­di­ca­listas e ac­ti­vistas po­lí­ticos (Santos Do­mín­guez, 24 anos, di­ri­gente do Con­selho Cí­vico de Or­ga­ni­za­ções Po­pu­lares e In­dí­genas, foi a mais re­cente ví­tima), e a ele­vação dos ren­di­mentos do povo.

Me­lhores sa­lá­rios foi igual­mente a rei­vin­di­cação comum aos tra­ba­lha­dores do Pa­namá, que res­pon­deram ainda com uma marcha mas­siva na Ci­dade do Pa­namá à re­ti­rada do fe­riado do 1.º de Maio; aos tra­ba­lha­dores me­xi­canos, que na Ci­dade do Mé­xico e nou­tras me­tró­poles do país re­pu­di­aram também a pro­posta de al­te­ração à le­gis­lação la­boral que co­loca em causa a con­tra­tação co­lec­tiva, o di­reito à greve e a li­ber­dade de acção e or­ga­ni­zação sin­dical; e aos tra­ba­lha­dores da Gua­te­mala e Costa Rica. Os pri­meiros acres­cen­taram à exi­gência de uma mais justa re­par­tição dos ren­di­mentos a de­núncia de que 70 por cento das em­presas do país não cumpre a le­gis­lação la­boral, e fri­saram a ca­la­mi­dade so­cial que pro­voca a fraca co­ber­tura da se­gu­rança so­cial e a in­for­ma­li­dade dos vín­culos; os se­gundos trans­for­mando o 1.º de Maio numa jor­nada igual­mente em de­fesa do sis­tema de se­gu­rança so­cial e de uma re­forma fiscal que be­ne­ficie o povo.

Na ca­pital do Chile, San­tiago, mais de cem mil par­ti­ci­param numa marcha pa­cí­fica até ao mo­mento em que um grupo de en­ca­pu­zados in­ter­rompeu a in­ter­venção do pre­si­dente da CUT-Chile, e na Colômbia, apesar da re­pressão, mi­lhares de pes­soas inun­daram as prin­ci­pais ci­dades do país em pro­testo contra a en­trada em vigor do Tra­tado de Livre Co­mércio com os EUA, contra o re­gime fas­cista servil do ca­pi­ta­lismo e em de­fesa da al­ter­na­tiva so­ci­a­lista. Em Bo­gotá, tal como em Bar­ran­quilha e Me­dellin, as au­to­ri­dades pre­ten­deram su­focar os pro­testos, que ter­mi­naram com um saldo de vá­rios fe­ridos graves.


Con­so­lidar avanços 

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Nas an­ti­podas das ma­ni­fes­ta­ções re­a­li­zadas nou­tros países, em Cuba um total de três mi­lhões de tra­ba­lha­dores co­me­mo­raram o seu dia nas 15 pro­vín­cias do país, tendo como prin­cipal con­signa a de­fesa e apre­fei­ço­a­mento da re­vo­lução.

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Na Ve­ne­zuela, o 1.º de Maio também foi fes­tivo de­pois da apro­vação, no dia an­te­rior, da nova Lei Or­gâ­nica do Tra­balho. «Re­cebam a minha sau­dação re­vo­lu­ci­o­nária todas e todos os tra­ba­lha­dores dignos da pá­tria bo­li­va­riana. Viva a classe ope­rária! Viva o 1.º de Maio!», es­creveu o pre­si­dente no Twitter.

Apesar da au­sência for­çada de Hugo Chávez, uma mul­tidão acorreu a Ca­racas para a ini­ci­a­tiva con­vo­cada pelo Par­tido So­ci­a­lista Unido da Ve­ne­zuela. Pa­ra­le­la­mente, o Par­tido Co­mu­nista da Ve­ne­zuela la­mentou a falta de uni­dade do con­junto das forças que apoiam o pro­cesso re­vo­lu­ci­o­nário e as­si­nalou o 1.º de Maio unido ao mo­vi­mento sin­dical de classe.

Na Ni­ca­rágua, as ra­zões para ce­le­brar também se sa­li­en­taram, já que desde que Da­niel Or­tega re­as­sumiu a pre­si­dência, no país cresceu o em­prego, o nú­mero de tra­ba­lha­dores com vín­culos efec­tivos e co­bertos pelo sis­tema de se­gu­rança so­cial, e a li­ber­dade sin­dical e o mo­vi­mento co­o­pe­ra­tivo vol­taram a ga­nhar pro­ta­go­nismo. O Dia do Tra­ba­lhador na Ni­ca­rágua foi, no en­tanto, en­som­brado pela no­tícia da morte de Tomás Borge, úl­timo dos fun­da­dores vivos da Frente San­di­nista de Li­ber­tação Na­ci­onal.

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Em São Paulo, no Brasil, as mai­ores cen­trais sin­di­cais re­a­li­zaram um acto comum no qual re­pre­sen­tantes do go­verno ou­viram a de­fesa da re­dução da jor­nada de tra­balho sem re­dução de sa­lá­rios ou va­lo­ri­zação dos ser­viços pú­blicos, e em Quito, no Equador, or­ga­ni­za­ções sin­di­cais e so­ciais mar­charam pela de­fesa e apro­fun­da­mento da re­vo­lução ci­dadã im­pul­si­o­nada pelo pre­si­dente Ra­fael Correa.

Na Bo­lívia, o 1.º de Maio foi pela pri­meira vez fe­riado na­ci­onal e pre­texto para ce­le­brar a apro­vação, na vés­pera, de um di­ploma que re­co­nhece a uni­ci­dade sin­dical. Em La Paz os tra­ba­lha­dores sau­daram também a na­ci­o­na­li­zação da em­presa de dis­tri­buição eléc­trica e exi­giram me­lhores au­mentos sa­la­riais ao go­verno, o qual mantêm como um aliado nos avanços pro­gres­sistas, anti-im­pe­ri­a­listas e, até, de cariz re­vo­lu­ci­o­nário em curso.