Um colete de forças imobiliza os católicos

Jorge Messias

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«O con­junto de con­di­ções da vida so­cial pode e deve de­ta­lhar-se... Cor­recta or­ga­ni­zação do Es­tado e dos seus po­deres. De­pois, a pro­pri­e­dade pri­vada con­si­de­rada como um pro­lon­ga­mento da li­ber­dade hu­mana. O ter­ceiro prin­cípio per­ma­nente é o da sub­si­di­a­ri­dade. Pôr-se em ati­tude de ajuda – e por­tanto de apoio, pro­moção e in­cre­mento – em re­lação às es­tru­turas me­nores» (Ma­nuel Cle­mente, bispo do Porto, Abril de 2011).

Car­deal pa­tri­arca de Lisboa, em in­ter­ven­ções pú­blicas dis­tintas :

«Nin­guém sai da po­lí­tica com as mãos limpas»... (10.9.2011).

«A uni­dade na di­ver­si­dade é um grande de­safio pas­toral» (4.5.2012).

«A Igreja tem um papel a exercer como or­ga­ni­zação da so­ci­e­dade civil mais sig­ni­fi­ca­tiva e com maior ca­pa­ci­dade de res­posta» (20.5.2012).

«Quanto à crise... Sem uma re­volta cul­tural, a Eu­ropa po­derá en­con­trar so­lu­ções mas não a So­lução!» (7.6.2012).

«Os co­mu­nistas re­cusam-se, desde já, a aban­donar a sua de­ter­mi­nação na acção comum, in­dis­pen­sável entre eles e os crentes. Chamam estes, tal qual são, a par­ti­cipar nas lutas exi­gidas pelo pro­gresso hu­mano, em qual­quer etapa em que o de­sen­vol­vi­mento so­cial o exija» (Karl Marx, «Os mar­xistas e a re­li­gião», M. Verret).

O clima de de­gra­dação moral em que se de­bate o uni­verso ca­pi­ta­lista causa in­có­modos, mesmo aos crentes por­tu­gueses. A crise é evi­dente e não diz res­peito a um só país, um grupo de países ou de uma única Igreja. É uni­versal, ca­minha a passos largos e vai ter efeitos ir­re­ver­sí­veis. A crise geral ou so­bre­po­sição de crises é do sis­tema ca­pi­ta­lista com o qual o poder fi­nan­ceiro se iden­ti­ficou. Há, pois, ra­zões de sobra para que toda a so­ci­e­dade se sinta in­co­mo­dada.

A crise ca­pi­ta­lista do sé­culo XXI tem tudo a ver com o modo de for­mação do ca­pital ecle­siás­tico através dos tempos. A Igreja en­ri­queceu com a Ex­pansão e a Con­quista, impôs-se como enorme la­ti­fun­diária, foi a força que mais ouro e prata acu­mulou mercê dos Des­co­bri­mentos, au­mentou os seus te­souros com a Na­ve­gação e o Co­mércio, ab­sorveu as for­tunas dos in­fiéis e por fim, quando a in­dus­tri­a­li­zação as­sumiu o papel de lo­co­mo­tiva do Oci­dente, soube con­ti­nuar a ca­pi­ta­lizar lu­cros gi­gan­tescos, trans­for­mando-se no nú­cleo con­dutor do mo­derno ca­pi­ta­lismo. A cha­mada Igreja, Mis­tério e Sa­cra­mento, foi desde sempre sede dos mitos tó­xicos e da acu­mu­lação de ca­pi­tais. É a que cons­titui o po­de­roso nú­cleo cen­tral, mul­ti­mi­li­o­nário e anti-de­mo­crá­tico, que co­manda o Va­ti­cano, as igrejas na­ci­o­nais, as hi­e­rar­quias re­li­gi­osas e o es­sen­cial da acção so­cial ca­tó­lica . Di­recta ou in­di­rec­ta­mente, a Igreja co­manda o ca­pi­ta­lismo ou seja, or­ga­niza o saque dos mais po­bres.

 

A banca es­pa­nhola

 

O de­sen­vol­vi­mento da crise eco­nó­mica e fi­nan­ceira mun­dial vem ne­ces­sa­ri­a­mente dar re­levo à in­ti­mi­dade que une o poder re­li­gioso e o poder cego do di­nheiro. Nuns países mais do que nou­tros, a Igreja soube aco­modar-se a con­di­ções ad­versas, res­surgir das cinzas e con­ti­nuar a do­minar o poder. Isto acon­teceu nos cinco con­ti­nentes. Mas de entre os exem­plos dis­po­ní­veis de Igreja Triun­fante, a es­pa­nhola me­rece uma par­ti­cular atenção. A Igreja toda de oiro, é um velho sonho bar­roco que atra­vessa a his­tória. A Es­panha foi a pá­tria de Loiola, Tor­que­mada e Es­crivá de Ba­la­guer. E estão pa­tentes factos e nú­meros que fun­da­mentam crí­ticas se­veras à Igreja, ao ca­pi­ta­lismo e ao em­buste sis­te­má­tico dos povos.

Antes mesmo da pre­sente crise, banca era para os es­pa­nhóis si­nó­nimo de Igreja. Todos os grandes bancos na­ci­o­nais par­tiam de in­ves­ti­mentos ca­tó­licos de Or­dens ou de as­so­ci­a­ções re­li­gi­osas: do Opus Dei (no­me­a­da­mente do Grupo Cen­tral) que in­cluía de­zenas de ins­ti­tui­ções fi­nan­ceiras, tais como o Ur­quijo, o Va­lência, o Agrí­cola, o Ubeda, o Po­pular Es­pa­nhol, o Po­pu­la­rinsa, etc.; da So­ci­e­dade de Jesus e da Ordem dos Do­mi­ni­canos, com o Con­ti­nental, o Her­rero Y Gijón, o Mer­cantil, o Valls, o Docks, e muitos ou­tros pe­quenos e mé­dios bancos par­ti­cu­lar­mente di­ri­gidos ao cré­dito e às classes mé­dias. Num «ran­king» ban­cário ne­ces­sa­ri­a­mente in­com­pleto, des­ta­cavam-se ainda, em Es­panha, o San­tander (So­ci­e­dade de Jesus e Do­mi­ni­canos), o Ba­nesto (Opus Dei e Grupo Roc­ke­feller), o San­paolo/Lobby da Ca­ri­dade (Mi­se­ri­cór­dias Por­tu­guesas e Ita­li­anas) e o Deutsch Bank (Opus Dei/Krupp).

A partir de 1980, ve­ri­fica-se uma fe­bril ac­ti­vi­dade em todo este pa­no­rama fi­nan­ceiro vi­sando, so­bre­tudo, a ca­pi­ta­li­zação ban­cária. De fraude em fraude, assim se chega ao caso Bankia.

(con­tinua)



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