Eu sei como queriam que fosse o Verão

Paulo Raimundo (Membro da Comissão Política)

Gos­taria cer­ta­mente o ca­pital e as ma­ri­o­netas ao seu ser­viço que a che­gada de Agosto se ca­rac­te­ri­zasse pela che­gada dos ba­nhos de Verão e por uma nova fase do roubo a quem tra­balha. Tudo es­tava pro­gra­mado e pla­neado: de­cidia-se na As­sem­bleia da Re­pú­blica umas normas, co­lo­cava-se a co­mu­ni­cação so­cial ao seu ser­viço a ex­plicar, ilus­trar e tornar tudo ine­vi­tável e pronto!, já es­tava, lá iriam todos para fé­rias com o tra­ba­lhinho em franco de­sen­vol­vi­mento.

O ca­pital com­prou uma guerra que lhe pode custar caro

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Mas será mesmo que o Go­verno PSD/ CDS pen­sava que bas­tava que a mai­oria da As­sem­bleia da Re­pú­blica vo­tasse mais uma vez a von­tade do ca­pital para que de um dia para o outro se acen­tu­asse o roubo a quem tra­balha? Acharia o PS que o seu voto fa­vo­rável em tudo o que é de­ci­sivo e a sua abs­tenção vi­o­lenta na vo­tação final do có­digo da ex­plo­ração seria es­que­cida?

Pas­saria pela ca­beça dos di­ri­gentes da UGT que o seu ca­rimbo na con­cer­tação so­cial seria su­fi­ci­ente para que os tra­ba­lha­dores acei­tassem as mal­fei­to­rias do Có­digo? E o que terão pen­sado re­al­mente o Pre­si­dente da Re­pú­blica e a troika es­tran­geira? Que os tra­ba­lha­dores es­tavam para comer e calar? Pen­saria o pa­tro­nato que po­deria surfar em normas an­ti­cons­ti­tu­ci­o­nais e rasgar uni­la­te­ral­mente os con­tratos co­lec­tivos de tra­balho lan­çando-se num ataque de­sen­freado a quem tra­balha e acen­tuar o roubo aos seus di­reitos e ren­di­mentos?

Cer­ta­mente que não con­tavam com um por­maior – é que há quem não goste de ser su­ces­si­va­mente rou­bado e fe­rido na sua dig­ni­dade; e há quem es­teja farto de ver o es­forço do seu tra­balho ser su­ces­si­va­mente trans­fe­rido para os bolsos de um pu­nhado de grupos eco­nó­micos. Há quem não es­teja dis­po­nível para aceitar que, ao mesmo tempo que lhe vão li­te­ral­mente ao bolso, 13 grupos eco­nó­micos te­nham tido, nos pri­meiros seis meses de 2012, 10 mi­lhões de euros de lu­cros por dia.

E que acima de tudo há quem, apesar da brutal pressão, pre­ca­ri­e­dade, de­sem­prego, chan­tagem e clima de medo que se vive nas em­presas e lo­cais de tra­balho, es­teja dis­posto a dizer basta!.

Afir­mação de dig­ni­dade

Que pen­sarão, por exemplo, os tra­ba­lha­dores da EDP quando con­fron­tados com a in­tenção da em­presa de «ade­quar o con­teúdo do Acordo Co­lec­tivo de Tra­balho ao novo en­qua­dra­mento legal la­boral», ao mesmo tempo que a em­presa dis­tri­buiu 532 mi­lhões de euros de lu­cros (re­sul­tado ob­tidos nos pri­meiros seis meses de 2012) pelos seus ac­ci­o­nistas?

Ou os tra­ba­lha­dores do sector têxtil, ves­tuário e cal­çado das pro­postas do pa­tro­nato de zero por cento de au­mentos para este ano em sec­tores em que uma parte sig­ni­fi­ca­tiva dos tra­ba­lha­dores está abran­gida pelo sa­lário cada vez mais mí­nimo na­ci­onal? E os os tra­ba­lha­dores do sector dos trans­portes que em muitos casos se­riam rou­bados todos os meses em um terço dos seus ren­di­mentos? E o que sentem os tra­ba­lha­dores dos ser­viços quando con­fron­tados com as ten­ta­tivas de im­po­sição de mais horas de tra­balho à borla, sa­bendo dos 152 mi­lhões de euros de lucro da Je­ró­nimo Mar­tins?

Está em curso uma mag­ní­fica res­posta dos tra­ba­lha­dores, uma luta de grande co­ragem e de­ter­mi­nação, uma luta que apesar das di­fi­cul­dades está em con­di­ções de travar os ob­jec­tivos do ca­pital. O pa­tro­nato con­tará cer­ta­mente com a in­ten­si­fi­cação da luta nas em­presas, lo­cais de tra­balho e nas ruas. Uma luta que não é para o pós-fé­rias, ela trava-se já. Uma luta contra o roubo, uma luta que os tra­ba­lha­dores unidos em cada local de tra­balho serão ca­pazes de travar e de vencer. Uma luta que está para lá do Có­digo da Ex­plo­ração, que é pela dig­ni­dade e pelos di­reitos de quem tra­balha.

Vale a pena lutar

Uma res­posta que exi­girá uni­dade, so­li­da­ri­e­dade, pron­tidão, co­ragem, de­ter­mi­nação e con­fi­ança: co­ragem como a de­mons­trada re­cen­te­mente pelos tra­ba­lha­dores da Cares (na sua mai­oria com con­tratos pre­cá­rios), Car­ristur, Ro­do­viária de Lisboa; de­ter­mi­nação como a re­ve­lada por todos os 270 ope­rá­rios das Minas da Pa­nas­queira, que de­ci­diram não baixar às ga­le­rias, re­cu­sando a re­dução do valor do tra­balho su­ple­mentar; pron­tidão na res­posta como se vê na Secil, Por­tucel, Par­malat, Ser­lima, So­mincor, Lis­nave, Vis­teon, Galp, EDP, PT; uni­dade, bem pa­tente nos tra­ba­lha­dores por­tuá­rios e no sector dos trans­portes (Metro Sul do Tejo, Refer, CP, CP Carga, Metro, STCP) e em tantas ou­tras em­presas e sec­tores.

O ca­pital, o pa­tro­nato e as suas ma­ri­o­netas de­ci­diram com­prar uma guerra que lhes pode custar caro. A his­tória está re­cheada de exem­plos de grande co­ragem e de­ter­mi­nação dos tra­ba­lha­dores, como a luta que os tra­ba­lha­dores do sector têxtil tra­varam pela im­ple­men­tação das 40 horas de tra­balho. Cerca de 40 se­manas con­se­cu­tivas de greve ao tra­balho ao sá­bado; uma luta di­fícil, exi­gente, em que em vá­rios mo­mentos muitos se terão ques­ti­o­nado se va­leria a pena tanto sa­cri­fício. Mas valeu.

Valeu e vale a pena travar a luta contra o roubo e si­mul­ta­ne­a­mente pela va­lo­ri­zação do tra­balho e dos tra­ba­lha­dores. Uma luta pela me­lhoria das con­di­ções de vida dos tra­ba­lha­dores e fun­da­mental à di­na­mi­zação eco­nó­mica do País.

 



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