Basta de desemprego!

João Frazão (Membro da Comissão Política)
Mais de 1,3 milhões pessoas de todos os sectores de actividade, de todas as camadas etárias, de todos os distritos do País, homens e mulheres, estão desempregadas.

O capital precisa de desempregados para pressionar os direitos e os salários

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Oscilando entre o encolher de ombros e a demagogia populista, o Governo ora afirma que o desemprego pode ser uma oportunidade, ora saca de medidas que visam obrigar os desempregados a trabalhar de borla, ora anuncia, largamente amplificado na comunicação social, que, em 15 dias, o seu mais recente programa criou 35 postos de trabalho (que permitirá resolver o problema em pouco mais de 1500 anos), ora se refere à subida brutal do desemprego, como mera nota negativa da governação, como fez Passos Coelho.

As políticas de direita, potenciadas pelo pacto de agressão do PS, PSD e CDS, destruíram o aparelho produtivo nacional, e dezenas de milhares de empregos públicos, condenando centenas de milhares de famílias ao desemprego, à pobreza e a uma situação de incerteza difícil de suportar.

Não se pretende fazer aqui a leitura dos números, chamando-se a atenção para o artigo do último Avante! sobre o tema.

Procurar-se-á tão somente contribuir para a profunda batalha ideológica que, em torno do desemprego e dos desempregados, se desenvolve.

O capital, e os governantes de turno ao seu serviço, usam todos os meios para responsabilizar os desempregados pela sua situação, para os catalogar como preguiçosos, para incutir nas massas a ideia de que esses malfeitores não querem trabalhar e vivem à custa do erário público, para esconder as suas responsabilidades e os seus interesses com a situação existente.

É por isso que se afirma que vivem, à larga, com subsídios de desemprego e outras mordomias, nas quais é preciso cortar para desincentivar o ócio, tese repetida em peças de televisão que mostram esta ou aquela empresa que não consegue arranjar quem queira trabalhar, faltando acrescentar «sem direitos e mesmo sem garantia de salário»!

Ora nem os desempregados vivem, na sua maioria, à conta do subsídio de desemprego (apenas 27 por cento recebem aquela prestação social), nem é verdade que possam, com facilidade, rejeitar propostas de emprego. De facto, as situações em que um trabalhador a receber subsídio de desemprego pode recusar uma oferta de trabalho estão tipificadas na lei e foram muito agravadas nos últimos anos, por proposta do PSD mas também do PS.

Outro dos argumentos que vão procurando consolidar é que quem recebe um apoio no desemprego deve prestar um serviço em troca (de que a ideia de que os desempregados deviam ir limpar matas é talvez a mais boçal expressão), medida que o Governo anunciou agora, com a institucionalização de um serviço social obrigatório.

Na declaração de anúncio da medida, o sinistro ministro da Solidariedade, exemplificou: limpeza de espaços exteriores, como jardins; pequenas obras nas instituições sociais; eventos culturais e desportivos; apoio a arquivos e museus municipais. São tarefas que se «enquadram no conceito de actividade socialmente útil». Mais adiantou que este «serviço social» não pode exceder as 15 horas por semana e deixou a ameaça de que quem não aceitar perderá o direito ao Rendimento Social de Inserção.

Sobre isto, assinalemos apenas que «actividade socialmente útil» é um conceito suficientemente amplo para nele caberem todas as esferas da actividade produtiva; que, com três pessoas a prestar este serviço, à borla, se pode eliminar um posto de trabalho; e que, ao contrário do que nos querem fazer crer, os apoios sociais não são esmolas que o Estado distribui aos pobres, mas sim direitos sustentados com os impostos de todos.

Não lhes chegava ainda que, rotulando os desempregados de madraços, os obriguem quer a apresentações quinzenais nos centros de emprego ou nas juntas de freguesia, como se fossem arguidos com termo de identidade, quer a mendigar por carimbos que atestem que, num espaço de tempo, se procurou emprego. Situações aviltantes para a dignidade de quem desespera por um emprego e não recebe, quantas vezes durante anos, do Centro de Emprego onde se encontra inscrito, qualquer proposta de emprego.

Uma das linhas da ofensiva ideológica em que o capital mais tem apostado é a de que em Portugal é difícil despedir (logo, se está desempregado, alguma deve ter feito!) e que seria um desígnio nacional, para melhorar a competitividade e ajudar à criação de emprego (pasme-se o cinismo!), facilitar as condições de despedimento.

A vida mostra que, ao contrário, o que é preciso é mais protecção no emprego e que o único objectivo destas campanhas é o aumento da exploração de todos os trabalhadores e a criação de falsas divisões colocando uns contra os outros.

O capital, já se sabe, precisa sempre de um exército de desempregados para pressionar os direitos e os salários dos que estão nas empresas e serviços.

A convocação, pela CGTP-IN, a que se associou o MTD, para Outubro, da Marcha contra o Desemprego, é uma tarefa de todos. Não apenas porque cada um de nós olha para o lado e conhece um familiar, um amigo, um vizinho, uma família já atingida por este flagelo. Principalmente porque, para a ruptura que defendemos com a política de desastre nacional, para reerguer o País do declínio, da pobreza e da injustiça, precisamos destas forças e destas energias.



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