Pobreza infantil alastra a olhos vistos

Flagelo que é o espelho desta política

 

São bru­tais os im­pactes da crise eco­nó­mica e so­cial sobre os por­tu­gueses, em par­ti­cular sobre as cri­anças e jo­vens. O PCP levou o as­sunto ao ple­nário da AR e deixou um alerta: há uma «es­piral de em­po­bre­ci­mento que ar­rasa a vida de largos mi­lhares de fa­mí­lias».

Há fome na es­cola porque há fome em casa

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O tema es­teve em des­taque faz hoje oito dias sus­ci­tado por uma de­cla­ração po­lí­tica da de­pu­tada co­mu­nista Rita Rato, que pôs o dedo na fe­rida ao as­si­nalar que há hoje «fome na es­cola, porque há fome em casa», res­pon­sa­bi­li­zando por essa si­tu­ação o ac­tual Go­verno e a sua po­lí­tica de feroz aus­te­ri­dade e de apli­cação das me­didas do pacto de agressão da troika.

Fome que é talvez a face mais negra dessa dura e dra­má­tica re­a­li­dade que é a da po­breza, en­vol­vendo um sem nú­mero de pes­soas atin­gidas pelas con­sequên­cias de uma po­lí­tica ge­ra­dora de «fa­lên­cias e en­cer­ra­mento de em­presas», que so­frem com «os sa­lá­rios em atraso, o de­sem­prego, os cortes nos apoios so­ciais» – no sub­sídio de de­sem­prego, no abono de fa­mília, no ren­di­mento so­cial de in­serção –, que sentem na pele o au­mento do custo de vida.

De tudo isso falou a par­la­mentar do PCP, dando exem­plos e nú­meros con­cretos como seja o da es­ti­ma­tiva que aponta para que o nú­mero de cri­anças com fome e ca­rên­cias ali­men­tares na nossas es­colas ronde as 13 000. Ou esse outro nú­mero não menos pre­o­cu­pante a que foi pos­sível chegar, tendo em conta os alunos abran­gidos pelo es­calão A e B da acção so­cial es­colar – pre­sen­te­mente mais de me­tade dos alunos do pré-es­colar e 1.º ciclo na Área Me­tro­po­li­tana de Lisboa estão nessa con­dição –, que é o de em fi­nais de 2012 haver mais 50 000 cri­anças do que em 2007 oriundas de fa­mí­lias com ren­di­mentos men­sais de re­fe­rência até 419 euros.

 

Quadro de ar­re­piar

 

Aos de­pu­tados Rita Rato lem­brou ainda a re­cente de­núncia da So­ci­e­dade Por­tu­guesa de Pe­di­a­tria sobre o sur­gi­mento de casos nos hos­pi­tais que não eram re­gis­tados há 20 anos, de «mães que acres­centam água ao leite ar­ti­fi­cial ou dão leite de vaca a bebés de meses, cri­anças que à se­gunda-feira nos re­fei­tó­rios es­co­lares re­petem tudo o que pu­derem, pais que não têm con­di­ções de acom­pa­nhar os fi­lhos no in­ter­na­mento hos­pi­talar».

E foi com in­dig­nação e tris­teza que trouxe a lume a si­tu­ação desse nú­mero cres­cente de fa­mí­lias que têm di­fi­cul­dades em sa­tis­fazer as ne­ces­si­dade bá­sicas dos seus fi­lhos (ali­men­tação, ves­tuário, ha­bi­tação, ma­te­rial es­colar e cui­dados de saúde), cha­mando a atenção, por outro lado, para as con­sequên­cias ne­fastas sobre a vida das cri­anças ad­vindas do de­sem­prego dos pais e de «ins­ta­bi­li­dade emo­ci­onal e psi­co­ló­gica» que lhes está nor­mal­mente as­so­ciada e que «in­flu­encia a sua vi­vência» pro­vo­cando em muitos casos «pro­blemas de apren­di­zagem, in­serção no meio, dis­cri­mi­nação, vi­o­lência».

Abor­dando as causas es­tru­tu­rais da po­breza do nosso País, e sem ig­norar que há causas mais re­motas, Rita Rato deixou vin­cada a ideia de que aquelas foram «pro­fun­da­mente agra­vadas com mais de 36 anos de po­lí­ticas de di­reita», com o «pro­cesso de in­te­gração ca­pi­ta­lista na União Eu­ro­peia», sem es­quecer a «na­tu­reza do ca­pi­ta­lismo e da crise» e, mais re­cen­te­mente, o pacto de agressão.

E por isso a der­rota deste é tão im­por­tante e ur­gente, con­cluiu, pois só ela abre ca­minho ao de­sen­vol­vi­mento eco­nó­mico, à va­lo­ri­zação do tra­balho e dos tra­ba­lha­dores, a uma mais justa dis­tri­buição da ri­queza, à ele­vação das con­di­ções de vida do povo – con­dição para um efec­tivo com­bate à po­breza e à ex­clusão so­cial.

 

Nem cana nem peixe

A po­breza in­fantil é uma das ex­pres­sões mais vi­o­lentas da aus­te­ri­dade e das po­lí­ticas pro­fun­da­mente in­justas deste Go­verno agra­vadas pela apli­cação do pacto da troika, in­sistiu em afirmar Rita Rato, em res­posta à per­gunta que lhe di­ri­gira a de­pu­tada Nilza de Sena do PSD, que em de­fesa do Go­verno con­si­derou que este ini­ciara fun­ções «no mo­mento em que os ní­veis de po­breza eram ele­va­dís­simos», razão pela qual «adoptou o pro­grama de emer­gência so­cial».

Con­cor­dando que «a po­breza co­meçou há muito», a de­pu­tada do PCP re­cordou no en­tanto que a esse facto não é es­tranho desde logo o travão im­posto por su­ces­sivos go­vernos ao au­mento do sa­lário mí­nimo na­ci­onal, go­vernos que «ati­raram todos os dias para a po­breza mi­lhares e mi­lhares de pes­soas que mesmo tra­ba­lhando não con­se­guem romper com esse ciclo de po­breza».

Re­co­nhe­cendo ainda que a po­breza no nosso País tem «causa es­tru­tu­rais», a par­la­mentar co­mu­nista sa­li­entou que não é menos ver­dade que desde a sua to­mada de posse este Go­verno se trans­formou numa «má­quina de fazer po­bres», ati­rando para con­di­ções in­dignas não apenas cri­anças como fa­mí­lias in­teiras.

E dis­cordou que o Go­verno diga que «não dá o peixe mas dá a cana e en­sina a pescar», como su­geriu a de­pu­tada do PSD. «Nem cana, nem peixe, nem mar», ri­postou a par­la­mentar co­mu­nista, que acusou ainda o Go­verno de «dizer aos jo­vens por­tu­gueses e às fa­mí­lias para emi­grarem»

E sobre as me­didas em curso do Go­verno com vista a ga­rantir a «co­esão so­cial», se­gundo a de­pu­tada la­ranja, que não lhes poupou elo­gios apon­tando entre ou­tras me­didas as «can­tinas so­ciais», Rita Rato con­si­derou que teria sido mais in­te­res­sante que aquela afir­masse – como foi dito por IPSS na au­dição re­a­li­zada pelo PCP (ver pá­ginas 26 e 27) – que ver­da­dei­ra­mente im­por­tante seria «um tra­balho de en­cer­ra­mento de can­tinas porque isso sig­ni­fi­caria que a fome e a po­breza es­ta­riam a ser er­ra­di­cadas».

 

 

 



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