Álvaro Cunhal – temo-lo dito e escrito repetidas vezes, e com inteira justiça – foi o principal obreiro do PCP como hoje o conhecemos: um Partido revolucionário, marxista-leninista, profundamente enraizado na classe operária e nos trabalhadores e com forte influência noutras camadas antimonopolistas da população. Os alicerces deste edifício situam-se nos anos 40 do século passado, os anos da reorganização do Partido e do III e IV congressos, das grandes greves e jornadas de luta, da construção da unidade antifascista.
Em todo este processo, Álvaro Cunhal teve um papel preponderante e entre as muitas e exigentes tarefas que desempenhou nesta década conta-se a de redactor principal do Avante!, que assumiu durante cerca de cinco anos, em dois períodos.
Não se podia, neste ano de 2013, assinalar o aniversário do Avante! sem lembrar o valioso contributo de Álvaro Cunhal, nos duros anos 40 do século XX, para fazer dele a tribuna da classe operária e do seu Partido, o jornal da unidade e da resistência antifascistas, a voz dos que não tinham voz – e, como jornal comunista, parte activa na mobilização da luta contra o fascismo e na construção e consolidação do Partido.
Quer enquanto destacado dirigente do Partido quer enquanto redactor principal do Avante! – tarefa que desempenhou entre 1942 e 1947 e, depois, de 1948 até à sua prisão, no início do ano seguinte –, Álvaro Cunhal deixa o seu nome gravado na história heróica do órgão central do PCP, que cumpre no próximo dia 15 o seu 82.º aniversário.
Na primeira destas vertentes, inseparáveis entre si, Álvaro Cunhal – sempre inserido no trabalho colectivo do Secretariado, do qual faziam parte, com ele, José Gregório, Manuel Guedes e, a partir de 1946, Militão Ribeiro – deu um inestimável contributo teórico e prático para fazer do PCP um grande partido nacional e a principal força da resistência antifascista, capaz de resistir à sanha repressiva do fascismo e de mobilizar as massas trabalhadoras e o povo português para poderosas jornadas de luta, como as grandes greves de 1943 e 1944 ou as jornadas da vitória, em Maio de 1945.
O «coração da luta popular»
A publicação ininterrupta do Avante! clandestino entre Agosto de 1941 e Abril de 1974 – sempre composto e impresso no interior do País – é uma das mais notáveis realizações do PCP nos anos da longa noite fascista, em que era a única voz livre da feroz censura que amordaçava o País. Tal façanha, ímpar no movimento comunista internacional, só foi possível graças às medidas organizativas e conspirativas levadas à prática a partir da reorganização, em cuja elaboração Álvaro Cunhal deu uma destacada contribuição.
No caso da imprensa, por razões de defesa, o aparelho técnico passou a estar desligado da organização partidária, muito mais exposta à repressão. A localização das tipografias clandestinas era do conhecimento de um número muito restrito de dirigentes, o que as tornou muito menos vulneráveis à sua captura pela PIDE. Também os tipógrafos clandestinos se dedicavam exclusivamente a essa árdua e solitária tarefa.
Assim, e apesar de as tipografias serem um dos alvos preferidos da repressão fascista, a partir da reorganização a imprensa do Partido funcionou sem interrupções, apoiando a luta popular com jornais e manifestos. Das raras vezes em que uma tipografia caiu nas mãos da polícia, logo outra entrava em funcionamento, garantindo-se a saída atempada do Avante! e das restantes publicações. Tratava-se de defender o que José Moreira (membro do Comité Central do Partido e responsável pela ligação às tipografias clandestinas, assassinado na tortura em Janeiro de 1950) apelidava de «o coração da luta popular».
Pela mesma razão – a segurança do aparelho de imprensa – a entrega dos materiais impressos para distribuição era feita em locais distantes quer das tipografias quer das regiões a que se destinavam. Essas longas viagens eram feitas, nos anos 40, principalmente de bicicleta, obrigando a longuíssimas viagens de milhares de quilómetros por mês.
O Avante!, que nascera em 1931 e que ao longo dessa década tivera uma saída irregular – ora semanal e por vezes com elevadas tiragens, ora interrompida durante largos meses –, tinha agora as condições organizativas para cumprir o seu papel de vanguarda na luta pela liberdade e pela democracia. No VI Congresso do Partido, realizado em meados de 1946, Álvaro Cunhal apresenta um informe sobre Organização, no qual traça o panorama geral do impetuoso reforço da organização partidária nos anos que passaram desde o congresso anterior, realizado menos de três anos antes: quatro vezes mais militantes e uma tiragem do Avante! cinco vezes superior é registada em 1943.
Redactor principal
Álvaro Cunhal, já o referimos, foi redactor principal do Avante! em dois períodos durante a empolgante década de 40. Este trabalho de redacção coube sempre, durante os anos da clandestinidade, a dirigentes do PCP. E, em cada período, apenas a um – as rigorosas necessidades de defesa do aparelho clandestino e a grande responsabilidade política da tarefa a isso obrigavam.
Ao redactor principal do Avante! clandestino – designado pelo Secretariado do Comité Central – cabia sistematizar as numerosas informações chegadas através da organização do Partido (sobre os problemas dos trabalhadores e do povo, as lutas, os avanços orgânicos, a repressão policial), bem como a redacção final dos textos e a sua preparação com todos os elementos necessários à composição tipográfica e paginação. Igualmente por razões de segurança, esta tarefa encontrava-se separada do contacto com as tipografias, asseguradas por outro funcionário clandestino, a quem cabia recolher os originais e encaminhá-los para as tipografias, onde eram depois compostos e impressos segundo as indicações expressas pelo redactor.
Durante os anos do Avante! clandestino, asseguraram a função de redactor principal os seguintes dirigentes do Partido: Bento Gonçalves (1931-1935); Miguel Wager Russel (1935-1936); Alberto de Araújo (1936); Francisco Paula de Oliveira (1937-1938); Júlio Fogaça (1941-1942); Álvaro Cunhal (1943-1947); Sérgio Vilarigues (1947-1948); Álvaro Cunhal (1948-1949); Sérgio Vilarigues (1949-1954); Júlio Fogaça (1955-1956); Joaquim Pires Jorge (1957); António Dias Lourenço (1957-1962); Fernando Blanqui Teixeira (1962-1963); Jaime Serra (1963); Joaquim Gomes (1963-1965); Sérgio Vilarigues (1966-1972); e Octávio Pato (1972-1974).