Álvaro Cunhal e o Avante! – da Fuga de Peniche ao 25 de Abril

Rumo ao levantamento nacional

Os anos que vão da he­róica fuga de Pe­niche, em Ja­neiro de 1960, à ma­dru­gada li­ber­ta­dora de 25 de Abril de 1974 foram par­ti­cu­lar­mente in­tensos. Na sequência da rec­ti­fi­cação do desvio de di­reita, o Par­tido alarga as suas fi­leiras e cla­ri­fica a sua tác­tica e es­tra­tégia, num pro­cesso que cul­mina na apro­vação, no VI Con­gresso, do Pro­grama para a Re­vo­lução De­mo­crá­tica e Na­ci­onal, já com Álvaro Cu­nhal como Se­cre­tário-geral (cargo para o qual fora eleito em 1961). 

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Es­crever sobre Álvaro Cu­nhal e o Avante! nos 14 anos que me­deiam entre a fuga de Pe­niche e a Re­vo­lução de Abril en­cerra uma di­fi­cul­dade par­ti­cular, entre muitas ou­tras: a se­lecção dos as­suntos a abordar. Nesta quase dé­cada e meia, o Par­tido es­teve en­vol­vido num amplo de­bate in­terno com vista à cor­recção do desvio de di­reita e à re­cu­pe­ração da via do le­van­ta­mento na­ci­onal para o der­ru­ba­mento da di­ta­dura – via esta que houve que afirmar, com de­ter­mi­nação, no campo an­ti­fas­cista pe­rante opor­tu­nistas e ra­di­cais pe­queno-bur­gueses.

Para além deste in­tenso tra­balho ide­o­ló­gico, outra questão – que não lhe é alheia – marca in­de­le­vel­mente estes anos: o po­de­roso e im­pa­rável as­censo da luta po­pular, que se alargou aos povos das co­ló­nias afri­canas e agravou as já pro­fundas con­tra­di­ções do re­gime. O des­fecho, todos o co­nhe­cemos: a re­vo­lução de Abril.

Mas para lá chegar muitas lutas foram tra­vadas – nas em­presas, nos campos, nas pri­sões, mas também nas ruas, de­sa­fi­ando as forças re­pres­sivas. Já no final de 1960, o Avante! pu­bli­cava um ar­tigo onde se re­co­lhia «en­si­na­mentos e ex­pe­ri­ên­cias» das lutas sin­di­cais, con­cluindo-se que «só é pos­sível obter êxitos no ter­reno sin­dical quando a luta se apoia na acção de massas».

No mesmo ano, o Avante! des­taca: «Corre o sangue do povo de An­gola – O go­verno sa­la­za­rista or­dena o mas­sacre de po­pu­la­ções in­de­fesas!». Era um pre­núncio para o que se havia de se­guir, e que o Avante! no­ti­ciou em Fe­ve­reiro de 1961: «O povo de An­gola inicia a luta ar­mada pela sua in­de­pen­dência.» Até ao 25 de Abril, sempre, mas sempre o jornal do PCP acom­pa­nhará, apoi­ando, a luta dos povos afri­canos.

Maio maior

Esta luta atinge em 1962 um ponto alto. De­pois de no­ti­ciar, em Abril, que 25 mil es­tu­dantes es­ti­veram em greve, o Avante! re­alça, em Maio, a «grande jor­nada do 1.º de Maio – cen­tenas de mi­lhares de tra­ba­lha­dores em ma­ni­fes­ta­ções». Nessa edição, re­lata-se as mo­bi­li­za­ções em todo o País, das mai­ores até então contra o fas­cismo, e a te­na­ci­dade com que os ma­ni­fes­tantes en­fren­taram co­ra­jo­sa­mente a po­lícia. No dia 8 ti­veram lugar novas jor­nadas de luta, igual­mente com ade­sões sig­ni­fi­ca­tivas.

É igual­mente a partir deste mês que os ope­rá­rios agrí­colas do Sul do País con­quistam a jor­nada de oito horas, aca­bando com o es­cra­vi­zante tra­balho de sol a sol. Em Julho, o Avante! re­alça: «A grande luta dos ope­rá­rios agrí­colas pela jor­nada das oito horas for­ta­lece-se e alarga-se». Não tar­dará muito para que seja esse o ho­rário pra­ti­cado no la­ti­fúndio. Este ano fi­cará ainda mar­cado pelas po­de­rosas lutas es­tu­dantis. Em todas estes com­bates, o Par­tido teve o prin­cipal papel na sua or­ga­ni­zação e mo­bi­li­zação.

A ca­minho do le­van­ta­mento na­ci­onal

Até ao 25 de Abril nunca mais a luta do povo sairá das pá­ginas do Avante! e das ruas, campos e em­presas do País. Ao mesmo tempo que a luta se alarga e abrange ou­tros sec­tores e ca­madas – são destes anos o Con­gresso Re­pu­bli­cano de Aveiro, as ac­ções contra a guerra co­lo­nial, as cam­pa­nhas po­lí­ticas da CDE – é a classe ope­rária que está na van­guarda e des­fere os mais po­de­rosos golpes no edi­fício fas­cista.

Em 1973, o Co­mité Cen­tral do Par­tido apela à in­ten­si­fi­cação da luta em todas as frentes. O Avante! dá ex­pressão a este ob­jec­tivo: «Por uma grande cam­panha po­lí­tica de massas (pela li­ber­dade, pelo fim da guerra co­lo­nial, por uma vida me­lhor)». Nos úl­timos meses de 1973 e nos pri­meiros de 1974 su­cedem-se vagas de greves e am­plas mo­vi­men­ta­ções sin­di­cais. De­zenas de mi­lhares de tra­ba­lha­dores en­con­tram-se então em luta.

Em Março de 1974, o Avante! des­taca na pri­meira pá­gina: «Está em marcha um grande mo­vi­mento de massas» e, noutra no­tícia na mesma pá­gina, acres­centa-se: «Mais de 100 000 tra­ba­lha­dores em luta – cerca de 60 000 fi­zeram greves e pa­ra­li­sa­ções».

No mês se­guinte, o Mo­vi­mento das Forças Ar­madas, sus­ten­tado por um im­pa­rável le­van­ta­mento po­pular, der­ru­bava o go­verno fas­cista. Pá­ginas glo­ri­osas da his­tória na­ci­onal se­riam es­critas nos meses e anos se­guintes – com o PCP a apa­recer fi­nal­mente à luz do dia como a grande força da re­sis­tência e da luta por um Por­tugal livre, so­be­rano e de­sen­vol­vido a ca­minho do so­ci­a­lismo.



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