Chipre e a crise capitalista

Albano Nunes

As classes dirigentes recorrem cada vez mais ao autoritarismo

Ao mesmo tempo que os portugueses eram confrontados com novas notícias sobre o dramático agravamento da situação económica e social do país, o Chipre, uma vez quebrada a resistência às receitas do FMI e da UE pela vitória da direita nas eleições de 24.02.13, tornava-se no quinto país da União Europeia sujeito aos ruinosos «planos de resgate» impostos pelo grande capital e objecto de um ataque sem precedentes aos depósitos bancários dos cipriotas, provocando uma onda de indignação e de revolta que está a encostar à parede o novo governo reaccionário.

Em Chipre como em Portugal, a pretexto da «ajuda» para impedir a «bancarrota» (da banca), as mesmas exigências de cortes nos salários e rendimentos, de desmantelamento dos serviços públicos, de privatizações, de «reformas estruturais». A mesma linha de intensificação da exploração, liquidação de direitos, centralização e concentração de capital, limitações à soberania. As mesmas consequências de empobrecimento, desemprego, recessão e ainda maior endividamento. Os mesmos mecanismos de sucção de mais valia e de drenagem para o sector privado e monopolista do património público. Tudo isto num quadro cada vez mais assumido de que a austeridade veio para ficar, que não há que contar com o regresso à situação anterior à falência do Lehman Brothers em 2008, que o empobrecimento, o desemprego, os cortes sociais, a desregulação laboral e tudo o mais que tem estado no centro da ofensiva do grande capital é para continuar para lá do famoso «regresso aos mercados».

É esta a perspectiva que o grande capital anuncia aos povos português e ciprota e demais povos onde a classe operária, pela sua luta e beneficiando da existência do campo socialista, alcançou históricos avanços libertadores. Uma perspectiva que confirma não só a incapacidade do capitalismo para dar satisfação aos problemas da humanidade como a sua inexorável evolução num sentido cada vez mais improdutivo, rentista e parasitário (ligada com a lei da baixa tendencial da taxa de lucro) em que as contradições entre o capital e o trabalho e entre o carácter social da produção e a sua apropriação privadas se agudizaram extraordinariamente, colocando na ordem do dia a necessidade de profundas transformações antimonopolistas e anti-imperialistas na perspectiva do socialismo.

Para impor o recuo civilizacional exigido pela hegemonia do capital financeiro, para impedir que o crescimento inevitável da resistência e da luta popular ameace o sistema, para contornar a crise manifesta dos mecanismos de representação liberal-burguês e do seu perverso sistema de alternância direita/social-democracia, para tentar reverter os processos progressistas que abrem caminho como na Venezuela bolivariana, as classes dirigentes recorrem cada vez mais ao autoritarismo, ao militarismo e às guerras de agressão e ocupação. É por isso necessária grande atenção ao arrastar de espadas imperialista, seja no Médio Oriente, em África ou na Península da Coreia onde estão em desenvolvimento manobras militares EUA-Coreia do Sul-Japão de tal envergadura que não podem deixar de ser consideradas como preparativos de guerra. E lembrar que em Chipre, com a sua estratégica localização no Mediterrâneo Oriental, a sua tradição de Não Alinhamento, a sua luta patriótica pela unificação do país, o seu poderoso movimento operário e sindical e o mais influente partido comunista da Europa, estão em jogo questões de grande importância regional e internacional.



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