Comentário

A «crise» e a igualdade dos géneros

Inês Zuber

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Na se­mana pas­sada, uma De­le­gação da Co­missão dos Di­reitos da Mu­lher e Igual­dade dos Gé­neros do Par­la­mento Eu­ropeu vi­sitou Por­tugal. Entre reu­niões com mem­bros do Go­verno e da AR, vá­rias de­pu­tadas por­tu­guesas e de ou­tros países en­con­traram-se também com or­ga­ni­za­ções vo­ca­ci­o­nadas para a de­fesa dos di­reitos das mu­lheres, como «o Ninho» ou de de­fesa da ví­tima, como a APAV. Reu­niram ainda com a CITE – Co­missão para a Igual­dade no Tra­balho e no Em­prego, e a CIG – Co­missão para a Ci­da­dania e Igual­dade de Gé­nero. «Sen­timo-nos de­pri­midas» foram os co­men­tá­rios de al­gumas das in­te­grantes es­tran­geiras desta de­le­gação, ao to­marem con­tacto com a evo­lução da re­a­li­dade das mu­lheres em Por­tugal. Sur­presa que é cu­riosa, do nosso ponto de vista. É que entre os mai­ores grupos po­lí­ticos eu­ro­peus – os So­ci­a­listas e De­mo­cratas e o Par­tido Po­pular Eu­ropeu – para além das en­ce­na­ções sobre a pos­si­bi­li­dade de dis­tinção entre uma con­so­li­dação or­ça­mental mais ou menos «justa», o que é certo é que existiu sempre (e, so­bre­tudo, no que mais in­te­ressa – as vo­ta­ções) uma con­ver­gência para aprovar os pa­cotes da Go­ver­nação Eco­nó­mica e o Tra­tado Or­ça­mental, que con­di­ci­onam fa­tal­mente as pos­si­bi­li­dades de in­ves­ti­mento pú­blico, obri­gando aos cortes na cha­mada des­pesa pú­blica que, em 2011, era, em Por­tugal, já abaixo da média da UE (48,9% do PIB para Por­tugal e 49,1% para a UE). Nos dias que correm – e com par­tidos na­ci­o­nais como o PS e o CDS a ten­tarem de­sa­ver­go­nha­da­mente, di­a­ri­a­mente, fazer de­cla­ra­ções que bran­queiam a sua cum­pli­ci­dade e apoio com o pacto de agressão as­si­nado com a troika – é im­por­tante re­lem­brar o que estes se­nhores as­si­naram. «Re­duzir o nú­mero de ser­viços da ad­mi­nis­tração cen­tral», «re­duzir os custos na área da edu­cação», «con­gelar sa­lá­rios e li­mitar pro­mo­ções», «re­formar as pres­ta­ções de de­sem­prego ob­tendo pou­panças de 150 mi­lhões de euros» (ano de 2012), «ra­ci­o­na­li­zação do sector da edu­cação e da rede de es­colas em 175 mi­lhões de euros...» (ano de 2013), e etc., etc., etc...

A pro­pó­sito das novas me­didas anun­ci­adas pelo pri­meiro-mi­nistro, An­tónio José Se­guro disse «re­cusar pa­tro­cinar a aus­te­ri­dade e os cortes» que «agravam a es­piral re­ces­siva», e Paulo Portas, que só por acaso as­sinou o pacto de agressão e pre­side um tal par­tido que faz parte da co­li­gação de Go­verno, afirmou que aban­do­námos uma «par­cela da nossa so­be­rania», fa­zendo votos de que «essa cir­cuns­tância seja apenas tran­si­tória».

Na vi­sita que a Co­missão su­pra­ci­tada fez a Por­tugal, os mem­bros do Go­verno fa­laram com­pun­gi­da­mente das con­sequên­cias dessa en­ti­dade di­vina – a «crise» –, as de­pu­tadas por­tu­guesas do PS e do PSD ex­pres­saram também cons­ter­nação e as de­pu­tadas es­tran­geiras, já dis­semos, uma certa «de­pressão». Os cortes nos sa­lá­rios, nas pen­sões, nas pres­ta­ções so­ciais, na ad­mi­nis­tração pú­blica, o au­mento dos im­postos e do custo de vida em geral, para além de cri­arem de­sem­prego, po­breza e fome, têm con­sequên­cias in­di­rectas ao nível dos re­tro­cessos na igual­dade entre ho­mens e mu­lheres, como nos foi re­la­tado. Há menos mu­lheres que de­nun­ciam o agressor em caso de vi­o­lência do­més­tica porque a sua in­de­pen­dência e se­gu­rança eco­nó­micas re­du­ziram-se ou mesmo porque não têm di­nheiro para com­prar o bi­lhete do au­to­carro para apre­sentar a de­núncia. Há mu­lheres de 30 e 40 anos que se pros­ti­tuem pela pri­meira vez – às es­con­didas dos fi­lhos e ma­rido – para con­se­guirem pagar os es­tudos dos fi­lhos. Há menos mu­lheres a re­correr à linha verde da CITE para de­nun­ciar casos de dis­cri­mi­nação no local de tra­balho, pensa-se, de­vido ao medo da si­tu­ação de de­sem­prego, que as im­pede de avan­çarem para a luta. São re­tro­cessos ci­vi­li­za­ci­o­nais inad­mis­sí­veis em ma­téria de di­reitos que a luta de muitas mu­lheres e ho­mens con­quis­taram. Mas de quem é a culpa? Quem é o res­pon­sável? A «crise», pois claro, essa en­ti­dade que nos go­verna e aprova me­mo­randos de en­ten­di­mento, ou seja, pactos de agressão. 



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