À conversa na Exposição do Centenário

«A luta nas empresas e locais de trabalho»

Hugo Janeiro

De­bater uma com­po­nente es­sen­cial da vida, pen­sa­mento e obra de Álvaro Cu­nhal foi o de­safio lan­çado a Amável Alves, An­tónio Quintas e Ar­mando Fa­rias.

Os en­si­na­mentos de Álvaro Cu­nhal são va­li­osos

Ao início da noite de sexta-feira, 10, no au­di­tório da Ex­po­sição do Cen­te­nário de Álvaro Cu­nhal, os mi­li­tantes co­mu­nistas e di­ri­gentes da CGTP-IN foram acom­pa­nhados por uma as­sis­tência in­te­res­sada, par­ti­ci­pa­tiva e li­gada ao pulsar da re­a­li­dade, lá onde o con­fronto entre tra­balho e ca­pital é mais evi­dente e, por isso, cons­ti­tuiu desde sempre o ponto nodal da acção dos co­mu­nistas na mo­bi­li­zação para a luta, no es­cla­re­ci­mento e ele­vação da cons­ci­ência de classe dos ex­plo­rados, como, aliás, notou Amável Alves logo a abrir a con­versa.

Álvaro Cu­nhal foi o mais des­ta­cado de entre os mi­li­tantes que co­lo­caram a luta nas em­presas e lo­cais de tra­balho no centro da in­ter­venção do PCP, Par­tido fun­dado pelos sec­tores mais com­ba­tivos e avan­çados do mo­vi­mento sin­dical por­tu­guês e que logo nos pri­meiros anos do re­gime fas­cista e na sequência da re­or­ga­ni­zação das fi­leiras co­mu­nistas de 1929, im­pul­si­o­nada pelo então Se­cre­tário-geral, Bento Gon­çalves, agrupa os tra­ba­lha­dores para a re­sis­tência à di­ta­dura. A greve geral de 18 de Ja­neiro de 1934 contra a fas­ci­zação dos sin­di­catos, que teve na Ma­rinha Grande um he­róico bas­tião, é uma pri­meira res­posta, de­fendeu An­tónio Quintas. Segue-se a dis­cussão e apli­cação em todo o co­lec­tivo par­ti­dário de ori­en­ta­ções sobre a in­ter­venção dos co­mu­nistas onde estão as massas, a di­na­mi­zação da uni­dade com tra­ba­lha­dores hon­rados, mesmo não-co­mu­nistas, e a pro­moção de lutas de va­riada di­mensão por ob­jec­tivos con­cretos como fun­da­men­tais para o as­censo e am­pli­ação dos pro­testos la­bo­rais.

Tal como a re­or­ga­ni­zação do Par­tido de 1940/​41, a con­cre­ti­zação destas li­nhas po­lí­ticas deve-se a Álvaro Cu­nhal, sin­te­tizou, antes de acres­centar que são exem­plos mai­ores da sua jus­teza a con­quista aos fas­cistas de de­zenas de sin­di­catos a partir do fim da Se­gunda Guerra Mun­dial, as grandes greves de 1942/​43 e as vagas rei­vin­di­ca­tivas de então até ao 25 de Abril de 1974, a mul­ti­pli­cação das Co­mis­sões de Uni­dade nas em­presas e lo­cais de tra­balho com ul­te­rior sequência e su­cesso. Um su­cesso apenas in­ter­rom­pido pelo desvio de di­reita na se­gunda me­tade dos anos 50, que re­sulta num re­fluxo das ini­ci­a­tivas rei­vin­di­ca­tivas e na cons­ti­tuição de cé­lulas do PCP e de Co­mis­sões de Uni­dade, sa­li­entou, desvio cor­ri­gido por Álvaro Cu­nhal que per­mite um ime­diato afluxo da luta, uni­dade e com­ba­ti­vi­dade dos tra­ba­lha­dores, e re­forço do Par­tido.

En­si­na­mentos de Álvaro Cu­nhal que, a par da apre­ensão prá­tica pelo co­lec­tivo da ne­ces­si­dade de avançar e re­cuar or­ga­ni­za­da­mente, e da im­por­tância da cons­tante li­gação às massas como fonte de vi­ta­li­dade do PCP, con­servam acu­ti­lante va­li­dade, re­feriu também An­tónio Quintas.

Acção rei­vin­di­ca­tiva

«A CGTP-IN [criada em 1970 por sin­di­catos ar­ran­cados a pulso às mãos dos fas­cistas] foi a pri­meira or­ga­ni­zação a apoiar o 25 de Abril. Logo no dia 26 re­a­lizou um ple­nário na­ci­onal apre­sen­tando um con­creto rol de rei­vin­di­ca­ções.

«Lé­nine con­cluiu que após uma re­vo­lução inicia-se ime­di­a­ta­mente a contra-re­vo­lução. Foi isso que su­cedeu, e po­demos afirmar que sem o Rumo à Vi­tória, de Álvaro Cu­nhal, sem o con­junto de ob­jec­tivos da Re­vo­lução De­mo­crá­tica e Na­ci­onal, ali sin­te­ti­zados cla­ra­mente, não só não teria sido pos­sível avançar tanto, como não teria sido pos­sível re­sistir», disse, por seu lado Ar­mando Fa­rias.

Para o mi­li­tante co­mu­nista e di­ri­gente da In­ter­sin­dical Na­ci­onal, outro as­pecto que ilustra a in­fluência de Álvaro Cu­nhal na pre­pon­de­rância das lutas de massas e das or­ga­ni­za­ções re­pre­sen­ta­tivas dos tra­ba­lha­dores nas con­quistas re­vo­lu­ci­o­ná­rias e na sua de­fesa, é o dis­curso pro­fe­rido no pri­meiro 1.º de Maio em li­ber­dade, quando Álvaro Cu­nhal in­dica «duas con­di­ções para a vi­tória: uni­dade dos tra­ba­lha­dores e li­gação às massas, e uni­dade do povo com as Forças Ar­madas».

Uni­dade que, a par da or­ga­ni­zação e re­forço das es­tru­turas de classe nas em­presas e lo­cais de tra­balho – linha que já vinha de trás, con­so­li­dada e tem­pe­rada na luta contra o fas­cismo –, está no centro da ini­ci­a­tiva da CGTP-IN. «Os lemas do 1.º, 2.º e 3.º con­gressos re­fe­riam-no», lem­brou.

Para Ar­mando Fa­rias, a in­ter­venção de Álvaro Cu­nhal é fértil em en­si­na­mentos que con­servam ac­tu­a­li­dade. Quando se trata de lutar nas em­presas e lo­cais de tra­balho, im­porta não es­quecer que essa luta deve ser ar­ti­cu­lada com a acção de massas e a con­tra­tação co­lec­tiva; que é cen­tral a ba­talha do es­cla­re­ci­mento e do con­ven­ci­mento para con­trastar a acção do ca­pital vi­sando «di­vidir os tra­ba­lha­dores para reinar», que a uni­dade pre­va­lece nos lo­cais de tra­balho sempre que os in­te­resses co­muns dos tra­ba­lha­dores se so­bre­põem a even­tuais di­fe­renças po­lí­ticas e ide­o­ló­gicas, con­cluiu.

A im­por­tância da ini­ci­a­tiva rei­vin­di­ca­tiva e da uni­dade, ar­ti­cu­ladas com a di­nâ­mica de massas, as di­fi­cul­dades co­lo­cadas pela re­pressão e per­se­guição pa­tro­nais e pela de­gra­dação dos vín­culos e di­reitos dos tra­ba­lha­dores, foram al­gumas das ques­tões abor­dadas pelos in­ter­ve­ni­entes no de­bate, na sua mai­oria jo­vens mi­li­tantes li­gados ao mundo do tra­balho e à ac­ti­vi­dade sin­dical. Ali não se ou­viram la­mú­rias, porém, nem im­perou o de­ses­pero. So­bres­saiu a con­fi­ança e a cer­teza de que o ca­minho mais só­lido para um fu­turo de pro­gresso e eman­ci­pação so­ciais é or­ga­nizar os tra­ba­lha­dores para que lutem, sinal, afinal, de que a vida, obra e pen­sa­mento de Álvaro Cu­nhal fazem parte do quo­ti­diano dos co­mu­nistas que se en­con­tram na pri­meira linha do com­bate de classe.



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