Poses e posses

Henrique Custódio

Reduzidos à loquaz ninharia do quotidiano, Passos e Portas encolheram até ao tamanho que sempre tiveram – o da insignificância. Por isso recolheram ao único estado que lhes convém – o da pose –, «de Estado», pois claro, dado o estado a que isto chegou.

Pedro Passos Coelho cedo se percebeu que pouco mais tinha do que a pose. Ajudava-o uma voz de barítono bem colocada, em treinos certamente erráticos – como tudo o que não fez na vida, a começar nos vários cursos e desembocando num de Economia, atamancado na Lusíada –, bem como um perfil de menino de Cascais à la page. O poder ir-lhe-ia caindo no colo através de amigos estratégicos do gabarito de Miguel Relvas e de Ângelo Correia, acabando – nem ele próprio saberá muito bem como –, em primeiro-ministro de Portugal.

Aí, a pose foi-se escarolando ao ritmo dos seus dislates, aqui chamando «piegas» aos portugueses, ali considerando o desemprego uma «oportunidade», além proclamando que «a ideia que se foi gerando de que um governo do PSD vai aumentar o IVA não tem fundamento», mais à frente que «estas medidas põem o País a pão e água. Não se põe o País a pão e água por precaução» ou também que «para salvaguardar a coesão social prefiro onerar escalões mais elevados do IRS de modo a desonerar a classe média e baixa» ou ainda que «se formos governo, posso garantir que não será necessário despedir pessoas nem cortar mais salários para sanear o sistema português» e por aí fora até ao descrédito generalizado.

Quanto a Paulo Portas, os vários papéis que tem interpretado ao devir da sua já longa carreira política falam por si: ele já foi o «paulinho das feiras», o «paulinho da lavoura», o «paulinho dos reformados», o «paulinho ministro da Defesa» (onde lhe bastou dúzia e meia de meses para a dúbia compra de milhares de milhões em submarinos e carros Pandur), ele é agora «ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros» e é no papel de governante que se péla por estar, como transborda das suas já famosas «poses de Estado», tudo encenado ao milímetro, o narigudo perfil à posteridade apontando, um dedinho aqui outro acolá agitando autoritarices, as frases tão marcadas de solenidade que todas soam à mais pascácia irrelevância.

Que fazer? A criatura saiu assim...

A última moda destes putativos líderes consumou-se a semana passada, quando Passos-primeiro-ministro veio anunciar mais um pacote de austeridades na sexta-feira, a que se seguiu imediato pré-anúncio de Portas de que «falaria ao País» no domingo, o que o levaria a traçar «linhas vermelhas» que o próprio «não ultrapassaria» em matéria de cortes nas pensões dos reformados para, três dias depois e por imposição da troika, ultrapassar não apenas linhas vermelhas mas também as de cor-de-burro-quando-foge.

É neste preparo em que o País se encontra: com um Governo que se engalfinha em poses entre si e que já não tem um mínimo de posses para se aguentar de pé.



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