Urbano Tavares Rodrigues, destacado intelectual comunista e figura cimeira da cultura portuguesa, faleceu na sexta-feira, 9, a poucos meses de cumprir 90 anos.
No seu funeral, realizado ao fim da tarde de sábado no cemitério do Alto de São João, em Lisboa, compareceram centenas de pessoas – familiares, amigos, camaradas, admiradores –, que fizeram questão de homenagear o escritor, o homem generoso, o militante comunista. Entre os presentes, contavam-se diversas personalidades da vida política e cultural, com destaque para os representantes da Sociedade Portuguesa de Autores, do qual era membro activo e em cuja sede o corpo do escritor esteve em câmara ardente, de lá saindo para o cemitério, e do Partido Comunista Português, no qual militava há décadas.
A urna estava coberta por uma grande bandeira do PCP, respeitando aquele que era o seu desejo, expresso aliás no prefácio daquele que será o seu último livro, Nenhuma Vida, a ser editado pela D. Quixote: «Daqui me vou despedindo, pouco a pouco, lutando com a minha angústia e vencendo-a, dizendo um maravilhoso adeus à água fresca do mar e dos rios onde nadei, ao perfume das flores e das crianças, e à beleza das mulheres. Um cravo vermelho e a bandeira do meu Partido hão-de acompanhar-me e tudo será luz.» A delegação do PCP era composta pelo Secretário-geral, Jerónimo de Sousa, e pelos membros da Comissão Política Armindo Miranda e Jorge Pires, mas estiveram também presentes muitos outros dirigentes e militantes do Partido.
Na nota que o Secretariado do Comité Central do PCP emitiu a propósito do seu falecimento, salienta-se que Urbano Tavares Rodrigues «fica na história da literatura portuguesa como um dos seus mais relevantes expoentes», autor de uma vasta obra literária que abarca todos os domínios da escrita: romance, novela, conto, teatro, poesia, crónica, ensaio, jornalismo, viagens. Na sua obra, destaca ainda o PCP, «estão presentes os valores humanos que nortearam toda a sua vida – a liberdade, a justiça social, a paz, a solidariedade, a fraternidade».
Intensa actividade política
Urbano Tavares Rodrigues, realça-se na nota do Secretariado, «desenvolveu uma igualmente intensa actividade política, iniciada muito cedo e muito cedo com ligação ao PCP, e que se prolongou ao longo de toda a sua vida». Em 1949, participou na campanha eleitoral do General Norton de Matos, após o que foi para França onde foi leitor de Português em Montpellier e na Sorbonne, em Paris. Em 1955, regressava a Portugal para assistente na Faculdade de Letras de Lisboa, de onde viria a ser afastado pouco depois, por motivos políticos. Este impedimento de leccionar prolongar-se-ia por alguns anos e não se limita à universidade.
Em Dezembro de 1962, participa em Cuba num encontro de escritores solidários com a revolução cubana e, no ano seguinte, enquanto membro das Juntas de Acção Patriótica, preside à delegação portuguesa presente no congresso em defesa da liberdade da cultura, realizado pela Comunidade Europeia de Escritores, em Florença. No mesmo ano é preso, acusado de pertencer ao PCP e às Juntas de Acção Patriótica. Trata-se da primeira de três prisões que virá a sofrer, em todas elas submetido a brutais torturas pela PIDE.
Em 1966, participa novamente num congresso promovido pela Comunidade Europeia de Escritores, no decorrer do qual denuncia a extinção da Sociedade Portuguesa de Escritores e a situação de Luandino Vieira, preso no Tarrafal. Ao longo dessa década, Urbano Tavares Rodrigues participa activamente em acções do Conselho Mundial da Paz e do Conselho Português para a Paz e a Cooperação, então semi-clandestino em Portugal. Esta ligação ao movimento da Paz leva-o a Bruxelas, em 1971, onde participa nos trabalhos preparatórios da Conferência de Helsínquia sobre a Paz e o Desarmamento.
Activista destacado da Oposição Democrática, Urbano Tavares Rodrigues participou em várias campanhas «eleitorais» e foi membro da Comissão Nacional do III Congresso da Oposição Democrática, realizado em Aveiro em 1973. Após o 25 de Abril, teve uma intervenção activa no processo revolucionário e na luta em defesa das conquistas da Revolução, revela ainda o PCP, acrescentando que o escritor integrou o Sector Intelectual da Organização Regional de Lisboa e foi candidato a deputado pelo círculo da Emigração.