no sector público
Luta dá força à Constituição
Os sindicatos insistem no apelo à luta, para que se cumpra a Constituição e os diplomas sobre o aumento do horário de trabalho e sobre a «requalificação» sejam devolvidos à procedência.
O eufemismo visa dissimular a violação da Lei fundamental
No dia 13, quando o Presidente da República revelou ter decidido enviar ao Tribunal Constitucional, para fiscalização preventiva, o decreto da Assembleia da República que determina as regras da «requalificação» – novo nome para a «mobilidade especial» e uma porta maior para o despedimento sem justa causa na Administração Pública –, a Frente Comum de Sindicatos emitiu um comunicado a congratular-se com a decisão de Cavaco Silva. Mas alertou que a iniciativa do PR não incidiu sobre todas as normas que devem suscitar dúvidas quanto à constitucionalidade e, declarando que «a luta continua», reafirmou que «tudo fará para impedir a entrada em vigor desta lei».
Reportando-se ao comunicado oficial da Presidência, a Frente Comum registou que a fiscalização incidirá sobre as normas relativas à cessação do vínculo laboral, também aplicáveis a funcionários que estavam com nomeação definitiva, no momento da entrada em vigor da Lei 12-A/2008.
Ora, todo o diploma da «requalificação» constitui «um mecanismo de redução salarial, numa primeira fase, e de despedimento dos trabalhadores», que dá continuidade à política de «destruição do serviço público, dos direitos dos trabalhadores e de reconfiguração do Estado, subordinando-o aos interesses do capital».
A iniciativa legislativa partiu do Governo e teve, na AR, a 29 de Julho, os votos favoráveis do PSD e do CDS-PP. No período de discussão pública, os pareceres dos sindicatos denunciaram os objectivos e apontaram várias normas contrárias à Constituição. «O Governo pretende dar suporte legal ao despedimento de milhares de trabalhadores da Administração Pública», acusou a FNSTFPS, salientando que «a eufemística designação de “requalificação” não esconde o confronto directo deste objectivo com a Constituição». No parecer enviado pela federação da CGTP-IN, recorda-se a proibição de despedimentos sem justa causa, a consagração do direito ao trabalho e a obrigação de execução, pelo Estado, de políticas de pleno emprego.
Na elaboração da lei, o Governo desrespeitou também a lei da negociação colectiva, como demonstrou a federação.
Falsa «convergência»
Já a proposta de lei que pretende aumentar o horário de trabalho – e que o PR não enviou ao Tribunal Constitucional, até dia 16, ficando com mais doze dias para vetar ou promulgar o diploma – assenta em argumentos falsos e produzidos de má-fé, quando invoca a intenção de «maior convergência entre trabalhadores do sector público e do sector privado». O Governo até chegou a invocar, num estudo prévio da DGAEP, o objectivo de aproximação aos restantes países da UE, quando esse mesmo documento registava durações médias do trabalho de 37,4 horas na UE, 35,6 horas na Alemanha e 39,1 horas em Portugal.
Como a FNSTFPS, o STAL e outros sindicatos da Frente Comum realçaram, as 40 horas semanais são, no sector privado, um limite máximo da duração semanal do trabalho, mas o Governo pretende que na Administração Pública esse seja o limite mínimo. Esta opção contraria a convergência que já existe e impõe aos trabalhadores do sector público um horário superior ao que vigora nas empresas privadas.
Foram citados, então, dados de Abril deste ano, do Banco de Portugal: no final de 2012 mais de um milhão de trabalhadores tinha horário laboral inferior a 35 horas semanais; mais de dois milhões tinham horários entre 36 e 40 horas.
O pretendido aumento do horário corresponderia a mais de 128 milhões de horas de trabalho gratuito, com o valor estimado de 1640 milhões de euros, e equivalendo ao trabalho anual de 72 mil pessoas.
Os números do saque
O Governo pretende que os trabalhadores da Administração Pública prestem gratuitamente mais 41 dias de trabalho por ano. Este é o resultado dos sete dias de trabalho a mais (três dias de férias e quatro feriados) e do aumento de uma hora de trabalho por dia.
Este brutal aumento do tempo de trabalho, como se refere num estudo publicado pelo STAL/CGTP-IN, equivale também a uma intolerável desvalorização salarial:
– menos 14,3 por cento, com o aumento do horário de trabalho para 40 horas semanais;
– menos 17,9 por cento, somando à desvalorização anterior a supressão de três dias de férias e feriados.
Ao ser aumentado o horário de trabalho, diminuirá o valor da hora de trabalho, com repercussões no valor de subsídios e suplementos, nomeadamente no valor do trabalho extraordinário.
Estas desvalorizações resultam da comparação com valores de 2012 e são agravadas pelas perdas anteriores: a não actualização salarial desde 2009; o corte nos subsídios de férias e de Natal em 2012; o corte nos salários acima dos 1500 euros, desde 2011; o pagamento de sobretaxas extraordinárias; a desvalorização do trabalho extraordinário; o aumento das comparticipações para a CGA e a ADSE; o aumento do custo de vida; e o aumento dos impostos (IRS e IVA).