Do alto da Medideira vê-se o Tejo com barcos à vela que parecem tocar a copa dos pinheiros e o casario de Lisboa descendo até ao rio numa paleta de cores. No ar calmo e quente da tarde o céu é quase branco comparado com o azul forte das águas e o verde intenso das árvores. O tempo parece parar por instantes enquanto se guarda na memória a beleza do cenário e é já de olhar lavado que se desce à terra e se começa – devagarinho, para não perder pitada – a (re)descobrir cada recanto de um espaço que todos os anos se veste de novas roupagens para celebrar o que de melhor o País tem para oferecer: o seu povo, a sua cultura, as suas tradições, a sua inesgotável coragem de seguir lutando.
Os obreiros desta obra – reconhece quem, olhando, vê – só podiam ser o que são: gente dedicada a uma causa por causa de um ideal que visa a construção de uma sociedade sem exploradores nem explorados. Numa palavra, os comunistas.
Estranha gente, esta – diz quem olha mas não vê – que em vez de ficar em casa a lamber as feridas (e que profundas elas são) da cada vez mais feroz agressão do capitalismo, vai buscar forças sabe-se lá onde, acrescenta trabalho ao trabalho, cansaço ao cansaço, e constrói, desenha, pinta, costura, cozinha, escreve, e inventa e cria e recria uma cidade que é um país e um mundo que durante três escassos dias abre as portas ao País e ao mundo a afirmar, ano após ano, que é necessário e possível transformar o sonho em realidade.
Estranha gente, esta – diz quem olha mas não vê – que se esfalfa o ano inteiro a resistir, a lutar, a sobreviver, e continua a ter forças para celebrar a vida e a dar o melhor de si para transformar o mundo.
Como disse o poeta, quem assim se espanta não sabe nem sonha que o sonho comanda a vida. Por isso há quem não consiga entender, e tenha até medo de o fazer, que esta Festa dos que não se resignam a ser explorados não é não foi nem nunca será um festival para esquecer mágoas, desgraças, tristezas, mas é e sempre será, isso sim, uma festa no mais nobre sentido do termo, um tempo de retemperar forças para a luta que não dá tréguas. Nem que para tal seja preciso, e é nos tempos que correm, fazer sacrifícios para juntar cada cêntimo para a EP, planear ao ínfimo pormenor cada despesa, dividir o prato, levar farnel, partilhar o pouco de que se dispõe – materialmente falando – para comungar dessa imensa força que existe no colectivo comunista.
É por isso que, quando se abrem as portas da Atalaia, quem entra pisa com firmeza este chão que é nosso, como nosso é o País e a vida que nos querem roubar, na certeza de que estar ali faz bem, que quem por ali anda sabe para onde vai e não se engana nos caminhos onde é preciso, indispensável, lançar raízes de futuro. E se na abertura todos os caminhos vão dar à Praça da Paz – onde não há, que pena, uma azinheira – muito antes de ser declarada oficialmente aberta mais uma edição da Festa já todos sentem e sabem que o povo é quem mais ordena.