Os chamados nem-nem

Vasco Cardoso

Não gosto da ex­pressão, por algo que esta en­cerra de me­no­ri­zação e res­pon­sa­bi­li­zação dos pró­prios, mas os dados são re­le­vantes e che­garam até nós por via de uma in­sus­peita Fun­dação Eu­ro­peia para a Me­lhoria das Con­di­ções de Vida e de Tra­balho (Eu­ro­found). São os cha­mados «nem-nem». Jo­vens entre os 15 e os 34 anos que não têm em­prego, não es­tudam, nem estão em for­mação. De 2008 para cá – data em se ini­ciou o es­tudo – são mais 92 mil aqueles que em Por­tugal estão nesta si­tu­ação. O es­tudo re­vela ainda uma dis­tri­buição que não é ho­mo­génea. Em Por­tugal, o fe­nó­meno dos «nem-nem» é mais ex­pres­sivo entre os jo­vens adultos, dos 25 aos 34 anos, com uma taxa 18,9%, acima da média eu­ro­peia (16,8%).

São dados que re­velam muito do país que temos e das op­ções po­lí­ticas que têm sido im­postas na União Eu­ro­peia e em Por­tugal, mas também da pró­pria na­tu­reza do ca­pi­ta­lismo.

Sig­ni­ficam desde logo um enorme des­per­dício de re­cursos. Jo­vens em idade ac­tiva que pura e sim­ples­mente estão «em lista de es­pera». O es­tudo adi­anta como es­ti­ma­tiva um pre­juízo para uma eco­nomia como a nossa na casa dos 1,3% do PIB (cerca de dois mil mi­lhões de euros). Mas sig­ni­ficam mais do que isso.

As con­sequência no plano so­cial e na vida de cada um destes in­di­ví­duos é de­vas­ta­dora. Nuns casos, jo­vens que aban­do­naram pre­co­ce­mente os es­tudos, muitos sem cum­prirem a es­co­la­ri­dade obri­ga­tória e que fi­caram pri­vados do acesso ao co­nhe­ci­mento, à cul­tura, à for­mação. Nou­tros, jo­vens que se ar­rastam na con­dição de de­sem­pre­gados, al­guns com ele­vadas ha­bi­li­ta­ções es­co­lares. O pro­lon­ga­mento da vida em casa dos pais, na au­sência de qual­quer ren­di­mento ou ocu­pação, é se­gu­ra­mente o des­tino de muitos, que ficam não só pri­vados da sua au­to­nomia e eman­ci­pação, como cons­ti­tuem em muitas si­tu­a­ções um en­cargo fi­nan­ceiro que pe­sará muito nesta al­tura de agra­va­mento brutal do custo de vida, de cortes nos sa­lá­rios e pen­sões. E há ainda uma di­mensão hu­mana, na vida de cada um e das suas fa­mí­lias, cujo im­pacto, não po­dendo ser quan­ti­fi­cado, não pode ser su­bes­ti­mado.

Mas esta ne­gação de di­reitos, este rolo-com­pressor que es­maga a vida de mi­lhões de seres hu­manos, não pode e não vai ser o fu­turo. E também por isto a luta con­tinua!



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