Uma questão de escolhas

Jorge Cordeiro

Governo e pri­meiro-mi­nistro estão in­con­so­lá­veis. Para Passos e Portas, não poder go­vernar à margem da Cons­ti­tuição é si­nó­nimo de con­tra­ri­e­dade. Haver quem im­peça a sis­te­má­tica e gros­seira vi­o­lação da lei fun­da­mental é ex­pressão de blo­queio. O facto deste Go­verno pos­suir no seu cur­rí­culo o in­ve­jável feito de nos três or­ça­mentos do Es­tado que fez aprovar contar com igual nú­mero de in­cons­ti­tu­ci­o­na­li­dades é questão menor. Pelo que, não po­dendo mudar de texto cons­ti­tu­ci­onal, Passos veio su­gerir que se mude de juízes. É certo que, não tendo co­ragem de re­velar o pa­drão de es­colha que ima­gina mais con­forme os in­te­resses do Go­verno, o País se in­ter­rogue sobre o que lhe po­voará os pen­sa­mentos. Na au­sência de maior cla­ri­fi­cação por parte do pri­meiro-mi­nistro não fal­tarão as mais le­gí­timas, ló­gicas ou até es­pe­cu­la­tivas de­du­ções. Não serão poucos os que a partir da mais po­pular ob­ser­vação sobre o «bater a bota com a per­di­gota» ima­ginam, olhando para aquilo que tem sido a linha es­sen­cial da po­lí­tica do Go­verno, que o que Passos de­se­jaria mesmo era um Tri­bunal Cons­ti­tu­ci­onal pe­jado de Oli­veiras e Costas. Ou­tros, não for­ço­sa­mente em menor nú­mero, mas do­tados de uma visão mais exi­gente e tec­no­crá­tica al­vi­tram que juízes tipo Ar­nauts ou Gas­pares cor­res­pon­de­riam me­lhor e com mais ope­ra­ci­o­na­li­dade àquela ava­li­ação sin­to­ni­zada entre os que por cá go­vernam e os que de lá a partir do FMI, e an­tros se­me­lhantes, os co­mandam. Frus­trados por não po­derem fazer o que am­bi­ci­onam, Passos e Portas pros­se­guem na chan­tagem ras­teira, pro­cu­rando con­di­ci­onar de­ci­sões fu­turas ou ga­nhar es­paço para jus­ti­ficar novos des­mandos. Mesmo que te­nham de re­correr, como se vê, a ar­gu­men­tação pri­mária como a de in­si­nuar que o novo au­mento de im­postos que pre­param sobre os tra­ba­lha­dores e o povo se de­veria ao re­cente acórdão quando se sabe que não foi pre­ciso ne­nhuma de­cisão do Tri­bunal Cons­ti­tu­ci­onal para o Go­verno ter im­posto, pelos seus pró­prios pés, aquilo que Vítor Gaspar de­signou então como «brutal au­mento de im­postos» ou de há pouco mais de um mês ter anun­ciado um novo au­mento do IVA e da TSU. Por todo o País não res­tarão grandes dú­vidas que não é nem a Cons­ti­tuição nem o Tri­bunal que devem ser re­mo­vidos mas sim este Go­verno e a sua po­lí­tica.




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