Em defesa do valor de todas as horas de trabalho

Travar o assalto ao tempo

O «tempo de dis­po­ni­bi­li­dade» deve ser pago como tempo de tra­balho, re­a­firmou à Fec­trans a ACT. Na Sonae Dis­tri­buição e no Pingo Doce, o CESP e os tra­ba­lha­dores com­batem os «bancos» de horas e exigem o pa­ga­mento do tra­balho ex­tra­or­di­nário.

A re­sis­tência dos tra­ba­lha­dores dá re­sul­tado

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As leis da ex­plo­ração ca­pi­ta­lista ditam que o au­mento do ho­rário de tra­balho é um re­curso para au­mentar o qui­nhão do ca­pital na re­par­tição da ri­queza criada pelo tra­balho. Alargar o tempo de tra­balho, sem o de­vido acrés­cimo de re­mu­ne­ração, acaba por pro­duzir o mesmo re­sul­tado que teria uma di­mi­nuição no­minal dos sa­lá­rios: baixa o valor de cada hora de tra­balho as­sa­la­riado.
Esse efeito teve a re­dução para me­tade do valor do tra­balho ex­tra­or­di­nário, que vi­gorou du­rante dois anos, por força do acordo entre Go­verno, pa­trões e UGT, e que de­veria ter­minar a 31 de Julho, por im­po­sição do Tri­bunal Cons­ti­tu­ci­onal, mas que a mai­oria PSD/​CDS de­cidiu pro­longar até final do ano.
As su­ces­sivas al­te­ra­ções à le­gis­lação la­boral têm pro­cu­rado alargar os li­mites a tais prá­ticas e fa­ci­litar o em­ba­ra­te­ci­mento do tra­balho, de­sig­na­da­mente o que é pres­tado fora do ho­rário normal.
Para as em­presas de trans­portes e as ca­deias co­mer­ciais do Pingo Doce e da Sonae, as pos­si­bi­li­dades le­gais ofe­re­cidas pelos pro­ta­go­nistas da po­lí­tica de di­reita não bastam. As es­tru­turas da CGTP-IN, em co­mu­ni­cados que estão a dis­tri­buir desde o início de Agosto, de­nun­ciam este as­salto ao tempo de quem tra­balha, apelam à re­sis­tência e in­formam sobre di­li­gên­cias já re­a­li­zadas.

Dis­po­ni­bi­li­dade paga-se

O ar­ti­fício do «tempo de dis­po­ni­bi­li­dade», a que vá­rias em­presas de trans­porte ro­do­viário de pas­sa­geiros estão a re­correr, foi o mo­tivo da reu­nião que a Fe­de­ração dos Sin­di­catos de Trans­portes e Co­mu­ni­ca­ções teve, no dia 4, com os ser­viços do Ins­pector-Geral, na Au­to­ri­dade para as Con­di­ções do Tra­balho.
Para a as­so­ci­ação pa­tronal do sector (An­trop), como «tempo de dis­po­ni­bi­li­dade» de­veria ser con­si­de­rado «qual­quer pe­ríodo, que não seja in­ter­valo de des­canso (pausa), des­canso diário ou des­canso se­manal», «cuja du­ração pre­vi­sível seja pre­vi­a­mente co­nhe­cida pelo tra­ba­lhador, nos termos pre­vistos em con­venção co­lec­tiva ou, na sua falta, antes da par­tida ou ime­di­a­ta­mente antes do início efec­tivo do pe­ríodo em questão» e «em que o tra­ba­lhador não es­teja obri­gado a per­ma­necer no local de tra­balho, em­bora se man­tenha ads­trito à re­a­li­zação da ac­ti­vi­dade em caso de ne­ces­si­dade».
De­veria ainda en­trar nesta clas­si­fi­cação, «qual­quer pe­ríodo que um tra­ba­lhador que con­duza em equipa (tri­pu­lação múl­tipla) passe ao lado do con­dutor ou num be­liche du­rante a marcha do veí­culo (2.º ou 3.º con­du­tores)».
Em Ou­tubro de 2013, quando di­vulgou às em­presas a sua po­sição, de forma sis­te­ma­ti­zada, a An­trop de­fendeu também que o «tempo de dis­po­ni­bi­li­dade» não deve ser con­si­de­rado na con­tagem do nú­mero total de horas de tra­balho e do nú­mero de horas de tra­balho su­ple­mentar. Re­co­mendou ainda que o «tempo de dis­po­ni­bi­li­dade» fosse re­mu­ne­rado pelo valor da hora normal.
A Bar­ra­queiro Trans­portes, se­gundo a Fec­trans, de­cidiu em Julho que cada hora de «dis­po­ni­bi­li­dade» seria paga com um acrés­cimo de apenas 1,20 (um euro e vinte cên­timos!). Mesmo assim, muito abaixo do que tem que pagar por tra­balho su­ple­mentar.
Na reu­nião de 4 de Agosto, a ACT re­a­firmou que todo o tempo de tra­balho deve ser re­mu­ne­rado, nos termos da con­tra­tação co­lec­tiva e do Có­digo do Tra­balho, e in­formou que, no se­gui­mento de casos co­lo­cados pela Fec­trans/​CGTP-IN e pelos seus sin­di­catos, estão a de­correr in­ter­ven­ções de fis­ca­li­zação em 13 em­presas. Estas ac­ções po­derão cul­minar em coimas, caso as em­presas per­sistam em não pagar a re­mu­ne­ração de­vida.
A fe­de­ração re­velou ainda que a ACT está a ana­lisar ou­tras im­pli­ca­ções da ofen­siva pa­tronal, como su­cede com a con­ta­bi­li­zação dos li­mites do tra­balho ex­tra­or­di­nário ou com o facto de a me­dida estar a ser apli­cada ile­gal­mente, à re­velia da con­tra­tação co­lec­tiva vi­gente.
«Hoje, quer pelo pro­nun­ci­a­mento dos tri­bu­nais, quer pela po­sição da ACT, é re­co­nhe­cido que aquilo que os pa­trões chamam “tempo de dis­po­ni­bi­li­dade” e que até en­tendem que não têm obri­gação de pagar, é para todos os efeitos de re­mu­ne­ração, tempo de tra­balho e tem que ser pago como tal», su­blinha a Fec­trans. Esta é «uma vi­tória im­por­tante dos tra­ba­lha­dores, que tem que ser con­so­li­dada nas em­presas».

Um «banco» mau

O Sin­di­cato do Co­mércio, Es­cri­tó­rios e Ser­viços de Por­tugal de­cidiu re­correr aos tri­bu­nais para anular os re­gu­la­mentos que o Pingo Doce (do Grupo Je­ró­nimo Mar­tins) e a Sonae Dis­tri­buição (Con­ti­nente, Mo­delo e ou­tras in­síg­nias co­mer­ciais) usaram para impor o «banco» de horas in­di­vi­dual.
Na re­visão do Có­digo do Tra­balho, em 2012, esta fi­gura passou a ser ad­mi­tida, me­di­ante pro­posta da em­presa e ne­go­ci­ação com o tra­ba­lhador, que se pode opor num prazo de 14 dias. Os gi­gantes da dis­tri­buição co­mer­cial pu­bli­caram re­gu­la­mentos e de­sen­ca­de­aram vá­rias formas de pressão para obter a adesão dos tra­ba­lha­dores. Esta falta de pro­posta ne­go­cial é con­si­de­rada ilegal pelo CESP/​CGTP-IN.
O sin­di­cato, além da via ju­di­cial, es­ti­mula e apoia a re­sis­tência dos tra­ba­lha­dores a «bancos» que per­mitem às em­presas au­men­tarem a jor­nada de tra­balho até duas horas. A luta de­sen­volve-se nos lo­cais de tra­balho, através da es­tru­tura sin­dical, e no sítio elec­tró­nico do CESP está pu­bli­cada uma mi­nuta da de­cla­ração que cada tra­ba­lhador deve apre­sentar no seu local de tra­balho, a re­cusar o «banco».
No Pingo Doce, «muitos tra­ba­lha­dores estão a as­sinar de­cla­ra­ções», en­quanto a em­presa tenta «travar o mo­vi­mento de re­núncia do banco de horas, através de pres­sões di­ri­gidas», no­me­a­da­mente «te­le­fo­nemas in­di­vi­duais a partir dos re­cursos hu­manos cen­trais». O sin­di­cato ve­ri­ficou que o tra­balho ex­tra­or­di­nário está a ser pago como tal a quem re­cusou o «banco» de horas; quem aderiu ao «re­gu­la­mento» é com­pen­sado apenas com igual tempo de des­canso.

 

Diz a ACT

Como pode de­finir-se o tempo de tra­balho?
Tempo de tra­balho é qual­quer pe­ríodo du­rante o qual o tra­ba­lhador de­sem­penha a sua ac­ti­vi­dade ou se en­contra à dis­po­sição da en­ti­dade em­pre­ga­dora.
Con­si­dera-se, ainda, tempo de tra­balho:
A in­ter­rupção de tra­balho como tal con­si­de­rada em IRCT, em re­gu­la­mento in­terno da em­presa ou re­sul­tante do uso da em­presa;
A in­ter­rupção oca­si­onal do pe­ríodo de tra­balho diário ine­rente à sa­tis­fação de ne­ces­si­dades pes­soais ina­diá­veis do tra­ba­lhador ou re­sul­tante do con­sen­ti­mento do em­pre­gador;
A in­ter­rupção do tra­balho por mo­tivos téc­nicos;
O in­ter­valo para re­feição em que o tra­ba­lhador tenha de per­ma­necer no es­paço ha­bi­tual de tra­balho ou pró­ximo dele, para poder ser cha­mado a prestar tra­balho normal em caso de ne­ces­si­dade;
A in­ter­rupção ou pausa no pe­ríodo de tra­balho im­posta por normas de se­gu­rança e saúde no tra­balho.

Pu­bli­cado nas «Per­guntas mais fre­quentes»
no sítio elec­tró­nico da ACT (www.act.gov.pt)

 

 



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