Ampla participação

Filipe Diniz

Há tí­tulos nos jor­nais que valem por pá­ginas in­teiras. Veja-se (CM, 30.08.2014) o que in­forma que «cresce o nú­mero de re­clusos que quer par­ti­cipar nas elei­ções in­ternas do PS». É certo que muitas das su­ges­tões que abre podem ser mal­dosas, mas não de­vemos en­ve­redar por aí. Do mesmo modo que não de­vemos querer tomar par­tido sobre tais elei­ções em con­creto.

Mas são múl­ti­plas as in­ter­ro­ga­ções que tal von­tade de par­ti­cipar sus­cita. Por exemplo, se o tédio da vida pri­si­onal atin­girá um ponto tão ex­tremo que leve os re­clusos a in­tervir em tão en­fa­donho de­bate, em que até os golpes baixos já são todos co­nhe­cidos. Em que um can­di­dato apre­senta um «pro­jecto de mu­dança» e o outro uma «mu­dança de caras», mas em que ambos sabem que o que re­al­mente querem é mais do mesmo.

Se os que es­tejam em re­clusão for­çada de­vido a al­guma vi­ga­rice se sentem na obri­gação de par­ti­cipar na mo­nu­mental vi­ga­rice que cons­titui a es­colha do «can­di­dato a pri­meiro-mi­nistro». Se, como ou­tros mem­bros do «apa­relho», es­peram que a sua par­ti­ci­pação traga algum mo­desto be­ne­fício, quem sabe se uma dis­creta am­nistia.

Aqueles que as com­pli­ca­ções da vida co­lo­caram atrás das grades não devem de­sistir da par­ti­ci­pação cí­vica e fazem muito bem, mesmo que seja apenas nesta en­ce­nada dis­puta in­terna sem real al­ter­na­tiva. Não são menos do que ou­tros.

Mas será bom que, eles e ou­tros, te­nham cons­ci­ência clara de uma coisa: é que podem par­ti­cipar na es­colha do «can­di­dato a pri­meiro-mi­nistro» do PS. Mas que não ris­carão nada na po­lí­tica que tal «can­di­dato» irá efec­ti­va­mente de­fender. Porque, por muito que Se­guro venha pro­clamar «a ne­ces­si­dade de uma total se­pa­ração entre a po­lí­tica e os ne­gó­cios» e que lu­tará «contra o cen­trão dos in­te­resses», a triste ex­pe­ri­ência do papel de­sem­pe­nhado pelo PS em 38 anos de po­lí­tica de di­reita – em que tanto Se­guro como Costa há dé­cadas as­sumem fortes res­pon­sa­bi­li­dades – mostra que, se há coisa que está na massa do sangue deste PS é o ser­viço ao grande ca­pital na­ci­onal e trans­na­ci­onal e ao dito «cen­trão de in­te­resses».

Nem esses «ne­gó­cios» nem esses «in­te­resses» vão a votos. O pe­queno pu­nhado de gente que os impõe não pre­cisa de tais de­ta­lhes. Ainda que boa parte dessa gente de­vesse estar a fazer com­pa­nhia aos em­pe­nhados re­clusos que agora querem «par­ti­cipar nas elei­ções in­ternas do PS».




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