- Nº 2144 (2014/12/30)

Uma outra axiomática

Opinião

A maioria de nós está habituada a pensar no quadro da axiomática clássica, onde um mais um é igual a dois. Mas nas missas com que os governantes infestam a comunicação social, abusando da subserviente ausência de contraditório, cada vez mais um mais um é «tudo o que o senhor quiser», sendo este «senhor» um misto de divino e de feudal.

Só assim se explica aparecerem como coisa séria, muitas vezes em título e parangonas, declarações que deveriam merecer a piedade colectiva, por exporem o estado de embriaguez de quem as profere, ou serem justa razão para uma gargalhada monumental, de tão patéticas e contraditórias.

Encontramos muitos e bons exemplos disto mesmo no recente processo de privatização da TAP e da greve marcada em resposta: Alberto João Jardim, que num dia afirma que a TAP é a maior praga da Madeira e no dia seguinte afirma que um dia de greve na TAP destruiria a economia da ilha por milénios; Fernando Pinto, ameaçando que a sobrevivência da TAP está em perigo se continuar a instabilidade actual, mas dirigindo-se aos trabalhadores e não ao Governo que decreta processos de privatização sobre processo de privatização e nos intervalos aprova medidas para dificultar a gestão das empresas públicas; Pires de Lima, justificando a requisição civil porque os interesses particulares não se podem sobrepor aos interesses públicos; Sérgio Monteiro, informando que a greve foi desconvocada e ameaçando de imediato os sindicatos que não desconvocaram a greve que ele acabava de anunciar ter sido desconvocada; ou de novo Pires de Lima, oferecendo a retirada da requisição civil se os sindicatos retirassem a greve contra a qual o Governo decretou a requisição civil.

É este o estado lamentável e caricato do poder e da comunicação social que o serve. Um poder real e objectivo, colocado ao serviço do grande capital, da concentração e da exploração capitalista. Mas um poder crescentemente limitado pelas suas próprias contradições.

Consequência disso mesmo é o facto de que, apesar da barragem desinformativa, cada vez mais portugueses pensam como nós: «A TAP faz falta ao País, este Governo não!».

Manuel Gouveia