Subserviência do Governo alvo da crítica de Jerónimo de Sousa

A abdicação dos interesses nacionais

O PCP voltou a acusar o Go­verno de «não as­se­gurar a de­fesa do in­te­resse na­ci­onal» e de con­ti­nuar a pautar a sua acção pela obe­di­ência aos di­tames dos grandes in­te­resses eco­nó­micos e dos países mais ricos.

Só a re­ne­go­ci­ação da dí­vida pode li­bertar o País do gar­rote a que está su­jeito

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São vá­rias as si­tu­a­ções que ilus­tram essa pos­tura sub­ser­vi­ente do Go­verno, desde a forma como «exe­cutou obe­di­en­te­mente todas as im­po­si­ções da troika, à forma como se tem sub­me­tido a todo o tipo de con­di­ci­o­na­mentos» com origem nos grande grupos eco­nó­micos e fi­nan­ceiros trans­na­ci­o­nais e nos países mais po­de­rosos da Eu­ropa, exem­pli­ficou o Se­cre­tário-geral do PCP ao abordar o tema no de­bate quin­zenal com o pri­meiro-mi­nistro de sexta-feira pas­sada.

E o mais re­cente exemplo tem a ver com a forma como aquele re­agiu às elei­ções na Grécia, numa de­mons­tração, se­gundo Je­ró­nimo de Sousa, de que o «Go­verno está mais pre­o­cu­pado em ficar bem na fo­to­grafia dos grandes in­te­resses eco­nó­micos do que em de­fender os in­te­resses do País».

Num quadro em que a pro­posta de re­ne­go­ci­ação da dí­vida pode ga­nhar força, ques­ti­onou-se, por isso, sobre a in­qua­li­fi­cável afir­mação de Passos Co­elho de que tal pers­pec­tiva não passa de um «conto de cri­anças».

«In­siste em clas­si­ficar de conto de cri­anças essa pro­posta de re­ne­go­ci­ação da dí­vida que pode li­bertar Por­tugal do gar­rote a que hoje o País está su­jeito?», in­quiriu o líder co­mu­nista, que não es­condeu a sua per­ple­xi­dade por esse fe­char de portas do chefe do Exe­cu­tivo a uma pro­posta que «pode gerar os re­cursos fi­nan­ceiros de que o País ne­ces­sita, como pão para a boca, para uma po­lí­tica eco­nó­mica que ponha Por­tugal a pro­duzir, que crie em­prego e me­lhore as con­di­ções de vida».

Não e não

Na res­posta, Passos Co­elho afirmou-se con­victo de que a «re­ne­go­ci­ação da dí­vida – como no pas­sado a re­ne­go­ci­ação do me­mo­rando – não de­fende nem teria de­fen­dido o in­te­resse na­ci­onal». E te­o­ri­zando sobre as ra­zões que o levam a dis­cordar da busca de outra so­lução para o pro­blema da dí­vida grega, afirmou que a «Grécia foi o único país na Eu­ropa que fez uma re­ne­go­ci­ação, que teve um "aircut" da sua dí­vida, que tem con­di­ções de pa­ga­mento de juros, prazo de alon­ga­mento de ma­tu­ri­dade para pa­ga­mento dos em­prés­timos que ne­nhum outro país eu­ropeu tem».

«Isso foi feito à custa da so­li­da­ri­e­dade eu­ro­peia», su­bli­nhou, che­gando ao por­menor de lem­brar que Por­tugal entre 2010 e 2011 fez em­prés­timos bi­la­te­rais à Grécia no valor de quase 1100 mi­lhões de euros.

«E hoje a Grécia, de­pois de ter re­es­tru­tu­rado a sua dí­vida junto dos fundos pri­vados, só pode ter a ex­pec­ta­tiva de não pagar àqueles que lhe em­pres­taram», não se coibiu de dizer Passos Co­elho, di­zendo «ser esta a questão».

Afirmou, por outro lado, não achar que seja uma van­tagem para Por­tugal um tal pro­cesso. «Não foi no pas­sado, não é hoje, não será no fu­turo», en­fa­tizou, antes de pôr uma pedra sobre o as­sunto: «Com a re­es­tru­tu­ração da dí­vida, não con­cordo».

Pelo meio, de­pois de de­sejar que a Grécia «con­siga re­solver os seus pro­blemas», afirmou que é de­vido «res­peito» ao go­verno he­lé­nico, mas que este deve também «res­peito aos dos ou­tros países», dado que «não há povos de pri­meira, de se­gunda e de ter­ceira».

Sem brio pa­trió­tico

A res­posta não sa­tisfez de todo o líder co­mu­nista, que lem­brou que isso de os países serem todos iguais na União Eu­ro­peia é uma ba­lela. «Há uns mais iguais do que ou­tros», anotou, su­bli­nhando que a in­ter­venção de Passos Co­elho de­mons­trara que «no es­sen­cial o pri­meiro-mi­nistro por­tu­guês está mais do lado da se­nhora Merkel do que pro­pri­a­mente do lado dos in­te­resses na­ci­o­nais».

Je­ró­nimo de Sousa não se ficou pela acu­sação. Provou-a, tra­zendo à co­lação exem­plos dessa re­a­li­dade, como é o da pri­va­ti­zação da TAP, em­presa que qua­li­ficou de «ins­tru­mento fun­da­mental» para o de­sen­vol­vi­mento do País.

À co­lação trouxe também – no que é um outro tes­te­munho claro de ab­di­cação do in­te­resse na­ci­onal – a de­cla­ração do se­cre­tário de Es­tado dos Trans­portes se­gundo a qual com­pete à União Eu­ro­peia de­cidir se a EMEF e a CP Carga são para pri­va­tizar ou para en­cerrar.

«Este é que é o brio pa­trió­tico deste Go­verno? En­tregar o nosso fu­turo co­lec­tivo? En­tregar em­presas que são es­tra­té­gicas para esse de­sen­vol­vi­mento, de que tanto se fala, e dizer que isso com­pete à União Eu­ro­peia?», in­quiriu, em tom in­dig­nado, o líder co­mu­nista, antes de la­mentar que ande assim tão por baixo na ca­beça de al­guns o con­ceito de in­te­resse na­ci­onal.

São re­gras...

Passos Co­elho, na ré­plica, de­pois de re­ferir que «vi­vemos na União Eu­ro­peia e que isso traz van­ta­gens e des­van­ta­gens», pro­curou jus­ti­ficar a afir­mação do se­cre­tário de Es­tado dos Trans­portes ar­gu­men­tando que «quando se faz parte de um pro­jecto desta na­tu­reza tem de se cum­prir as re­gras». E que as «re­gras sobre a con­cor­rência, no caso da EMEF e da CP Carga e que en­volvem au­xí­lios de Es­tado, são re­gras que se aplicam a todos os países eu­ro­peus», e que «não po­demos deixar de res­peitar essas re­gras».

Mas não se ficou por aí e acres­centou que são «boas re­gras, não são más re­gras». En­ten­di­mento que tornou ex­ten­sivo à TAP, di­zendo que a «me­lhor ma­neira de a de­fender, man­tendo as re­gras, é pri­va­tizá-la».

Pa­la­vras que Je­ró­nimo de Sousa in­ter­pretou como sendo, no es­sen­cial, a con­fir­mação da sua «pre­o­cu­pação e de­núncia» quanto à visão do chefe do Go­verno sobre o in­te­resse na­ci­onal.

 



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