A peçonha

Henrique Custódio

A áu­lica trupe que nos go­verna ca­ra­co­leia ac­tu­al­mente contra a «Grécia do Sy­riza», onde deu mote o pro­to­colo do pri­meiro-mi­nistro Co­elho a clas­si­ficar o pro­grama do seu con­gé­nere he­lé­nico como «um conto de cri­anças», se­guindo-se de­cor­rên­cias dos com­parsas mais useiros na tran­qui­bérnia in­for­ma­tiva, sempre com re­levo para o ine­fável Portas que, com apru­mada fe­ro­ci­dade de egré­gios avós, bradou a todo o País que «eu não sou grego, mas por­tu­guês!», quiçá ci­tando des­ven­tu­ra­da­mente a frase atri­buída a Só­crates (o fi­ló­sofo, não o de Évora), «não sou nem ate­ni­ense nem grego, mas sim ci­dadão do mundo». É homem para isso e muito mais.

E o de­sa­tino vai con­ti­nuar, até que Co­elho e a sua cauda mi­nis­te­rial fuljam, nos céus da Eu­ropa, como so­li­tária, apa­gada, mas ainda e sempre fiel aça­fata da sra. Merkel.

Vai ser um es­pec­tá­culo digno de se ver, como já se pres­sente no de­sa­li­nha­mento an­te­ci­pado, dito com pé­trea fe­reza por Passos Co­elho, a ga­rantir que «não ali­nha­remos» nas reu­niões (de que já se fala) dos países sob res­gate, jus­ti­fi­cando que o «não pa­ga­remos» é coisa com que não contam com ele, em­bora também seja coisa que nin­guém diz, rei­vin­dica ou conta que venha a acon­tecer – mas isso é ver­dura a mais para tão vi­çoso chan­celer.

Nem só a Grécia in­co­modou esta se­mana os po­deres es­ta­tais em Por­tugal. Apa­receu uma carta di­ri­gida à co­missão de inqué­rito da AR ao «Caso BES» e as­si­nada por Ri­cardo Sal­gado, onde este es­miu­çava com datas pre­cisas os en­con­tros que ti­vera com o Pre­si­dente da Re­pú­blica (dois), o pri­meiro-mi­nistro e Paulo Portas, a todos ex­pondo os riscos de in­sol­vência que pai­ravam sobre o BES/​GES. Houve atra­pa­lhação geral e cada um dos vi­sados es­tre­bu­chou para onde pôde.

O Pre­si­dente da Re­pú­blica fez duas de­cla­ra­ções de su­petão ga­ran­tindo que «nunca falei do BES», apa­ren­te­mente sem lhe vir à ideia que estão gra­vadas nas te­le­vi­sões (que, ob­vi­a­mente, já o mos­traram em abun­dância) afir­ma­ções suas ga­ran­tindo «a so­lidez do BES» por in­ter­posto Banco de Por­tugal – atrás de quem pre­sume es­conder a sua res­pon­sa­bi­li­dade em iludir os in­ves­ti­dores com o seu apoio ex­presso ao BES.

Passos Co­elho fez-se de novas – ex­pe­di­ente que de­nuncia atra­pa­lhação – e afectou sor­risos à pre­tensão de que já havia dito tudo o que tinha a dizer sobre o as­sunto. Pro­va­vel­mente, vai andar atrás do pre­juízo e dizer mais coisas sobre o as­sunto de que já tinha dito tudo.

Quanto a Paulo Portas re­correu ao es­ta­fado nú­mero de «os se­nhores jor­na­listas já de­viam saber...» (neste caso, que ele já tem au­di­ência pre­vista na co­missão da AR) para fugir às per­guntas que lhe fa­ziam e pôr o ónus do «não saber» a quem lhe per­gun­tava o que é que ele, afinal, sabia. Enfim, es­per­ta­lhices à Portas.

En­tre­tanto, como uma pe­çonha, esta gente con­tinua a pu­tre­fazer o tónus do País.



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