Venezuela – operação Jericó

Nome bíblico para uma provocação

Pedro Campos

A nova ten­ta­tiva de golpe de Es­tado na Ve­ne­zuela – abor­tada pelas au­to­ri­dades bo­li­va­ri­anas –com o nome de có­digo Je­ricó, en­volve co­nhe­cidas fi­guras da re­acção e tem o pa­tro­cínio dos EUA.

In­tenção era pedir a in­ter­venção dos EUA para que sal­vassem o país

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A um ano dos acon­te­ci­mentos de 2014 (12 Fe­ve­reiro) que pro­vo­caram 43 ví­timas mor­tais, cen­tenas de fe­ridos, re­dução a cinzas de uma uni­ver­si­dade e in­cêndio de vá­rios nú­cleos as­sis­ten­ciais, a re­ação ve­ne­zu­e­lana não pára nas suas in­ten­ções de as­saltar o poder e pre­para-se para novas «aven­turas», outra vez com o apoio dos EUA.

O pon­tapé de saída foi no dia 11 de Fe­ve­reiro. A «san­tís­sima trin­dade» do fas­cismo criolo – Co­rina Ma­chado, An­tónio Le­desma e Le­o­poldo López – pu­blicou um dito «Acordo Na­ci­onal para Tran­sição», uma nova ma­ni­fes­tação de des­co­nhe­ci­mento da le­ga­li­dade cons­ti­tu­ci­onal. López está preso por ter in­ci­tado os in­ci­dentes de 2014 que, se­gundo pa­la­vras suas, de­ve­riam ter con­du­zido «à saída» de Ma­duro e des­truição do pro­cesso bo­li­va­riano. Le­desma, vindo de uma so­cial-de­mo­cracia já de si ran­çosa, não du­vida em fazer coro com os «amos do vale» como Co­rina Ma­chado. Esta, ver­da­deira oli­garca de fa­mília, perdeu o lugar de de­pu­tada (Abril 2014) porque, na sua orgia par­ti­cular para der­rubar o go­verno, chegou ao ex­tremo de se pro­nun­ciar na OEA contra o go­verno do seu país, como re­pre­sen­tante al­ter­na­tiva do... Pa­namá! Esta é a «san­tís­sima trin­dade» vi­sível. Mas é só ponta do ice­berg.

Dias de­pois do tal Acordo (muito ba­da­lado nos media, mas sem eco na ar­raia miúda), o pre­si­dente Ma­duro de­nun­ciou pu­bli­ca­mente nova ten­ta­tiva de golpe de es­tado, uma ope­ração bap­ti­zada com o nome de Je­ricó. Para além da eli­mi­nação fí­sica do pre­si­dente, Je­ricó im­pli­cava ainda o bom­bar­de­a­mento do pa­lácio pre­si­den­cial, chan­ce­laria, con­selho mu­ni­cipal da ca­pital, vá­rios mi­nis­té­rios e a ca­deia de te­le­visão Te­lesur, todas elas edi­fi­ca­ções em zonas al­ta­mente po­vo­adas, o que teria pro­du­zido um mas­sacre de pro­por­ções pa­vo­rosas. Se­gundo de­núncia pú­blica de Di­os­dado Ca­bello – pre­si­dente do par­la­mento – e Jorge Ro­drí­guez – re­pre­sen­tante CM de Ca­racas (o pai, de­pois de tor­tu­rado, foi lan­çado de uma ja­nela da po­lícia po­lí­tica) – quem «su­geriu» os lo­cais a bom­bar­dear foi o de­pu­tado Júlio Borges, do Par­tido Pri­meiro Jus­tiça, his­to­ri­ca­mente li­gado aos actos mais agres­sivos do fas­cismo criolo.

Quem afirma isto? O ge­neral (Av) Oswaldo Her­nández, um dos im­pli­cados no golpe. Este mi­litar está preso, assim como ou­tros de menor gra­du­ação, entre eles An­tich Za­pata, pi­loto e ins­trutor de aviões Tu­cano (e que fazia a li­gação entre os gol­pistas e a em­bai­xada dos EUA. Ou­tros cons­pi­ra­dores de­tidos são: Henry Sa­lazar, Sa­lazar Mon­cada e Mo­reno Gue­vara. Vá­rios mais estão em fuga, entre eles Luis Lugo, que par­ti­cipou numa ten­ta­tiva se­me­lhante em 2014, mas es­tava em li­ber­dade.

O plano dos cons­pi­ra­dores era uti­lizar um Tu­cano para os bom­bar­de­a­mentos (os Tu­canos ve­ne­zu­e­lanos estão todos em ma­nu­tenção pelo que esse Tu­cano – ao que pa­rece da fa­mi­ge­rada Blackwater, mas em nome de EP Avi­a­tion – teria que vir do es­tran­geiro!) e fazê-los coin­cidir com a trans­missão de uma peça de te­le­visão (a gra­vação está na mão dos ser­viços de in­te­li­gência) onde apa­re­ce­riam mi­li­tares e civis com farda. No meio da luta que ine­vi­ta­vel­mente se daria a in­tenção era pedir a in­ter­venção dos EUA para que sal­vassem o país!

Para além dos EUA, já se sabe que Nancy Bir­beck (em­bai­xada do Ca­nadá) es­teve num ae­ro­porto pró­ximo da ca­pital (Va­lencia) para saber das ca­pa­ci­dades do mesmo em «casos es­pe­ciais». Um fun­ci­o­nário do Reino Unido também está im­pli­cado na ten­ta­tiva gol­pista. E a em­bai­xada de Merkel ad­vertiu o seu pes­soal sobre uma «pos­sível si­tu­ação ir­re­gular» no país.

A cons­pi­ração foi abor­tada a tempo, mas in­sere-se numa guerra eco­nó­mica e também psi­co­ló­gica que con­firma o rosto pi­no­che­tista do sector mais ra­dical e mais me­diá­tico da opo­sição. Como em San­tiago em 1973 são vá­rios os pro­dutos bá­sicos que de­sa­pa­recem dos hi­per­mer­cados e mer­ce­a­rias. Na Casa dos Es­pí­ritos (1982), ro­mance que re­fere parte da his­tória do Chile, Isabel Al­lende es­creve: «No de­ses­pero de açam­barcar pro­dutos, ge­ravam-se con­fu­sões e os que nunca ti­nham fu­mado aca­bavam pa­gando qual­quer preço por uma caixa de ci­garros, e quem não ti­nham fi­lhos pe­quenos lu­tava por ali­mentos para lac­tantes (...) As pes­soas fa­ziam bi­chas sem saber o que es­tava à venda, só para não deixar de com­prar al­guma coisa, menos que não ne­ces­si­tassem dela». Tudo de­se­nhado nos la­bo­ra­tó­rios da guerra suja para criar na po­pu­lação, tal como no Chile de Al­lende, a «an­gústia da es­cassez», o que fez com que em 15 dias hi­per­mer­cados e mer­ce­a­rias ti­vessem ven­dido o que seria normal em dois meses!


Dura luta contra

o im­pe­ri­a­lismo

Ni­colas Ma­duro apelou, se­gunda-feira, 24, ao go­verno norte-ame­ri­cano para cessar «as san­ções, as ame­aças e as agres­sões contra a Ve­ne­zuela» e lem­brou que não vai aceitar «nem mais uma ofensa do im­pe­ri­a­lismo norte-ame­ri­cano».

Num co­mício do Par­tido So­ci­a­lista Unido da Ve­ne­zuela, o pre­si­dente ve­ne­zu­e­lano também la­mentou que Ba­rack Obama tenha con­du­zido as re­la­ções entre Ca­racas e Washington a «um beco sem saída» e in­sistiu que não vai «per­mitir que o go­verno dos Es­tados Unidos e a sua em­bai­xada con­ti­nuem a chamar mi­li­tares, a com­prar jor­na­listas, “opi­na­dores”, di­ri­gentes», de­fen­dendo «re­la­ções de res­peito» entre os dois es­tados.

No dia 21, Ma­duro so­li­citou à União de Na­ções Sul-Ame­ri­canas (UNASUR) e à Co­mu­ni­dade de Es­tados La­tino-Ame­ri­canos e Ca­ri­be­nhos (CELAC) para que es­tejam alerta em de­fesa da paz. No mesmo dia, os EUA con­fir­maram que «estão a con­trolar de perto esta si­tu­ação e pon­deram (aplicar) as fer­ra­mentas dis­po­ní­veis para re­con­duzir o go­verno da Ve­ne­zuela na di­recção que de­veria di­rigir-se».

Já na sexta-feira, 20, Ni­colás Ma­duro con­firmou que o pre­si­dente da Área Me­tro­po­li­tana de Ca­racas, An­tónio Le­dezma, de­tido na quinta-feira, 19, é alvo de um pro­cesso por cons­pi­ração.




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