Férias
De férias, na parca medida das possibilidades que me restam devido aos cortes no salário, aos múltiplos descontos de IRS, à taxa de não sei quê e ganhando menos por mês com os duodécimos do subsídio (?) de Natal que, em vez de me conceder um 14.º mês, feitas as contas, me retira, meticulosamente, menos 12 euros por 30 dias de trabalho, permito-me reflectir no que hoje me é dado ter e no que, há meia dúzia de anos, podia usufruir. Concluo, sem grande esforço, que as férias, agora, são menos, a saber: nos dias que duram, na lonjura onde se quedam, na qualidade delas.
Leio jornais. Lembro-me de cantigas, que também é para isso que o lazer se presta, com tanto mais tempo quanto me sobra por usá-lo noutras coisas que não a maçadora ida ao restaurante ou a profana jornada de copos num bar, vícios de que, por bem me querer a governação do País, fiquei afastado (não curado, já que anseio por que a maleita seja recidiva, se me faço entender...).
Dos jornais extraio bitates sobre eleições, candidatos, posturas partidárias, tudo isso entremeado com a importantíssima notícia, velha de meses e que, segundo os manuais, por não ser um facto actual e muito menos de interesse geral, não deveria ser notícia, que a senhora que faz o favor de ser mãe do Cristiano Ronaldo foi apanhada com 55 mil euros na carteira, que mal tem isso, a dona tem posses e teme que o seu banco seja estilo BES ou BPN e guardou a (muitíssima!) massa no bolso, lá terá as suas razões; e, outra, da magnífica vitória do futebol luso sobre a esquadra azurra, 39 anos depois, mais mês menos mês, parabéns.
Quanto ao que a generalidade da comunicação social me elucida sobre as eleições, repete-se a treta do costume, com os partidos (do costume) a lavar roupa suja porque este candidato a candidato não serve, por ser amigo do outro que não é nosso amigo, ou porque se abrem portas ou se dão passos em direcção a Coimbra, a Aveiro ou a Lisboa, ou ainda porque há um rapaz farto e entradote, ex-dono de arquipélago, que se vai candidatar à Presidência da República por vingança ou manifestação de estertor político, não querendo, como afirma, ou não podendo, digo eu, fazer de Belém o seu jardim. E lá segue a marcha, com quem tem uma postura decente a lembrar que este ano são as legislativas e só depois serão as presidenciais e outros (os do costume, partidos, comentaristas, putativos candidatos) a confundir as hostes e a baralhar sem dar de novo.
Recusando a bagunça dos que temem que o voto não lhes prorrogue a ditadura austeritária, dos que prometem aquilo que não fizeram quando podiam tê-lo feito se tivessem optado pelas pessoas e não por desvios ideológicos dúbios que atraiçoaram o nome da ideologia que apregoam, há quem faça o seu trabalho sem alardes nem parangonas, partindo de bases representativas e sólidas, pensando nos passos a dar para que possa haver mais equidade, mais solidariedade, mais justiça social.
E porque estou de férias e me vou lembrando de cantigas, não é que me está nos ouvidos «Power to the people» (o poder ao povo), de John Lennon? Vá lá saber-se porquê...