Programa nuclear iraniano

Acordo assinado em Viena

O Irão e o Grupo 5+1 (as po­tên­cias com as­sento per­ma­nente no Con­selho de Se­gu­rança mais a Ale­manha) as­si­naram um acordo sobre o pro­grama nu­clear ira­niano, an­te­ontem, 14, em Viena.

Acordo não viola li­nhas ver­me­lhas da Re­pú­blica Is­lâ­mica

«Co­meçou um novo ca­pí­tulo e agora po­demos con­cen­trar-nos nou­tras ques­tões», disse o pre­si­dente ira­niano Hassan Rouhani num dis­curso à nação, em que ga­rantiu que o acordo foi con­se­guido sem vi­olar o que clas­si­ficou de «li­nhas ver­me­lhas da Re­pú­blica Is­lâ­mica».

O do­cu­mento, con­si­de­rado «his­tó­rico» pelo Irão, foi subs­crito pelo mi­nistro dos Ne­gó­cios Es­tran­geiros ira­niano, Mohammad Javad Zarif, e pelos seus ho­mó­logos dos Es­tados Unidos, John Kerry; da França, Lau­rent Fa­bius; da China, Wang Yi; da Rússia, Sergei La­vrov; e da Grã-Bre­tanha, Phillip Ham­mond, mais o da Ale­manha, Frank-Walter Stein­meier.

Em de­cla­ra­ções à im­prensa, na ca­pital aus­tríaca, Mohammad Javad Zarif e a chefe da di­plo­macia da UE, Fe­de­rica Moghe­rini, en­fa­ti­zaram que o acor­dado «prova que a di­plo­macia, a co­or­de­nação e a co­o­pe­ração podem su­perar dé­cadas de ten­sões e con­fron­tação», as­se­gu­rando ao mesmo tempo haver ga­ran­tias de que o pro­grama nu­clear ira­niano «será ex­clu­si­va­mente pa­cí­fico».

Em co­mu­ni­cado di­vul­gado pela agência IRNA em Te­erão, as au­to­ri­dades ira­ni­anas lem­braram por seu turno que este acordo foi al­can­çado após dois anos de in­tensos es­forços e de avanços e re­cuos, e mais de uma dé­cada de­pois de con­tro­vér­sias e ten­sões di­plo­má­ticas. Com o cha­mado Plano de Acção Con­junta Global, en­fa­tizam, o país fica livre de san­ções eco­nó­micas, sem re­nun­ciar ao seu le­gí­timo di­reito de de­sen­volver as ac­ti­vi­dades nu­cle­ares para fins pa­cí­ficos, como de resto sempre pro­clamou ser o seu ob­jec­tivo.

De acordo com as in­for­ma­ções até agora di­vul­gadas, Te­erão aceita li­mitar o âm­bito do seu pro­grama nu­clear, em troca do le­van­ta­mento total e ime­diato das san­ções eco­nó­micas que lhe foram im­postas pelas po­tên­cias oci­den­tais, en­ca­be­çadas pelos EUA, e pela ONU. O acordo es­ta­be­lece igual­mente a cri­ação de uma co­missão para re­de­finir as fun­ções do re­actor ató­mico de Arak, sem que isso im­plique no en­tanto a re­núncia ao en­ri­que­ci­mento de urânio para fins civis.

Se­gundo a Prensa La­tina, fora do acordo fi­caram duas exi­gên­cias de Washington, Paris, Lon­dres e Berlim: o acesso de ins­pec­tores es­tran­geiros a ins­ta­la­ções mi­li­tares e en­tre­vistas com ci­en­tistas nu­cle­ares ira­ni­anos. Em con­tra­par­tida, o Or­ga­nismo In­ter­na­ci­onal da Energia Ató­mica es­ta­be­leceu uma agenda com o Irão para pros­se­guir a co­o­pe­ração e fa­ci­litar de algum modo a ve­ri­fi­cação no ter­reno, ainda que sem ca­rácter vin­cu­la­tivo.

Re­ac­ções in­ter­na­ci­o­nais

À ex­cepção de Is­rael (ver caixa), as re­ac­ções ao acordo de Viena foram de sa­tis­fação. Em Washington, o pre­si­dente Ba­rack Obama con­gra­tulou-se com o re­sul­tado das ne­go­ci­a­ções. An­te­ci­pando as crí­ticas do Con­gresso, que terá de ra­ti­ficar o do­cu­mento, Obama as­se­verou que o «acordo com o Irão não é ba­seado na con­fi­ança, mas sim, nas ins­pec­ções. Es­ta­remos na po­sição de ve­ri­ficar, pela pri­meira vez, todos esses com­pro­missos. Te­remos acesso a todas as ins­ta­la­ções ira­ni­anas». E deixou um re­cado aos con­gres­sistas: «ve­tarei qual­quer lei que se oponha» ao ne­go­ciado.

Também Vla­dimir Putin saudou o des­fecho das ne­go­ci­a­ções, con­si­de­rando que se deu um passo im­por­tante no re­forço da se­gu­rança re­gi­onal e in­ter­na­ci­onal e no re­gime global de não pro­li­fe­ração ató­mica. Re­cor­dando que Te­erão sempre de­fendeu o seu di­reito ao uso pa­cí­fico da energia nu­clear e re­jeitou as acu­sa­ções dos EUA e de ou­tras po­tên­cias oci­den­tais sobre a sua ale­gada in­tenção de de­sen­volver a arma ató­mica, o pre­si­dente russo lem­brou que o Irão pode agora voltar ao mer­cado de va­lores e de hi­dro­car­bo­netos, com a pos­si­bi­li­dade de co­meçar a pro­duzir até dois mi­lhões e meio de barris diá­rios de pe­tróleo num prazo de três meses.

A União Eu­ro­peia, por seu turno, de­cidiu pro­longar por seis meses a sus­pensão das san­ções eco­nó­micas adop­tadas em No­vembro de 2013 contra o Irão. Com este gesto, a UE quer poder «fazer as di­li­gên­cias e pre­pa­ra­ções ne­ces­sá­rias para a apli­cação do novo plano de acção.

 

Is­rael ameaça

O pri­meiro-mi­nistro de Is­rael, Ben­jamin Ne­tanyahu, re­agiu vi­o­len­ta­mente contra o acordo sobre o pro­grama nu­clear ira­niano, que clas­si­fica de um «grave erro de pro­por­ções his­tó­ricas».

«Em todas as áreas em que se de­veria evitar que o Irão ti­vesse ca­pa­ci­dade de de­sen­volver armas nu­cle­ares, houve grandes con­ces­sões», con­si­dera Ne­tanyahu. O di­ri­gente is­ra­e­lita não se exime mesmo de afirmar que o «Irão vai con­se­guir umas cen­tenas de mi­lhões de dó­lares, o que vai pos­si­bi­litar que o país con­tinue a exercer a sua agressão e ter­ro­rismo na re­gião e no mundo. O Irão vai re­ceber um ca­minho certo para as armas nu­cle­ares».

Na mesma linha se pro­nun­ciou a vice-mi­nistra dos Ne­gó­cios Es­tran­geiros, Tzipi Ho­to­vely, ao es­crever no Twitter que o acordo com o Irão é «uma ca­pi­tu­lação de pro­por­ções his­tó­ricas do Oci­dente ao eixo do mal li­de­rado pelo Irão». Ho­to­vely ga­rante que Is­rael re­cor­rerá a «todos os meios pos­sí­veis para tentar im­pedir que o acordo seja ra­ti­fi­cado», numa clara re­fe­rência às pres­sões dos lobby is­ra­e­litas sobre e no Con­gresso dos EUA.

A re­acção is­ra­e­lita, em­bora ex­pec­tável, é pre­o­cu­pante. Em­bora as au­to­ri­dades não o re­co­nheçam, Is­rael é a única po­tência nu­clear no Médio Ori­ente (dis­porá de cerca de 200 ogivas) e não subs­creveu o tra­tado de não pro­li­fe­ração de ar­ma­mento ató­mico. Os EUA já o re­co­nhe­ceram, mas – ao con­trário do que fi­zeram em re­lação ao Irão, por meras sus­peitas – não se mos­tram pre­o­cu­pados nem exercem qual­quer pressão sobre o seu aliado di­lecto para que eli­mine os seus meios de des­truição mas­siva.




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