«Mais uma medida que não rompe» com o rumo anterior

Acordo não serve a TAP nem o País

Para o PCP, o acordo entre o Go­verno e a Ga­teway é uma ten­ta­tiva de le­ga­lizar a pri­va­ti­zação da TAP e, em­bora as­se­gure que 50 por cento do ca­pital fica no Es­tado, acaba por re­pre­sentar a sal­vação da venda re­a­li­zada pelo go­verno PSD/​CDS.

A gestão pri­vada serve pri­meiro os in­te­resses de Ne­e­leman

Pouco de­pois de for­ma­li­zado o acordo, no sá­bado, dia 6, o Par­tido anun­ciou que irá re­co­locar na As­sem­bleia da Re­pú­blica a dis­cussão em torno das me­didas ne­ces­sá­rias à de­fesa da TAP e do sector aéreo na­ci­onal, no­me­a­da­mente através de um pro­jecto de re­so­lução «Em de­fesa da TAP!».
Numa po­sição ins­crita num co­mu­ni­cado da cé­lula co­mu­nista da TAP/​SPdH e também di­fun­dida pelo Ga­bi­nete de Im­prensa do PCP, con­si­dera-se que aquele en­ten­di­mento é «mais uma me­dida que não rompe com um longo e aci­den­tado per­curso, no qual su­ces­sivos go­vernos foram to­mando de­ci­sões que ame­a­çaram e li­mi­taram o de­sen­vol­vi­mento da TAP». O Par­tido «apela aos tra­ba­lha­dores da em­presa para que re­forcem a sua uni­dade e luta, em de­fesa da TAP, do sector aéreo e da so­be­rania na­ci­onal».

O PCP co­meça por re­cordar que, desde Ou­tubro de 2015, vem de­nun­ci­ando que o pro­cesso de pri­va­ti­zação do Grupo TAP, re­a­li­zado pelo an­te­rior go­verno, é ilegal, por três mo­tivos:
foram dadas ga­ran­tias ban­cá­rias a este ne­gócio sem cum­prir os re­qui­sitos le­gais;
foi pro­ces­sada a venda da em­presa quando o Go­verno já es­tava de­mi­tido pela As­sem­bleia da Re­pú­blica;
e os su­postos «com­pra­dores» não o po­de­riam ser, à luz do Di­reito co­mu­ni­tário.

Por este mo­tivo, «o que se exigia era a pura e sim­ples anu­lação do que era nulo, ex­pul­sando da TAP o grupo mo­no­po­lista que tomou conta da em­presa e que o Go­verno PSD/​CDS lá meteu ile­gal­mente». Con­tudo, «o que o Go­verno do PS veio agora anun­ciar foi a sal­vação da pri­va­ti­zação, num ne­gócio de con­tornos pouco claros», em que se as­sume a ma­nu­tenção de 50 por cento do ca­pital na posse do Es­tado, mas ab­di­cando da gestão para o con­sórcio de David Ne­e­leman com Hum­berto Pe­drosa.
«Esta so­lução não cor­res­ponde às ne­ces­si­dades do País nem acau­tela o fu­turo da TAP e da so­be­rania na­ci­onal», con­si­dera o PCP.
Ao manter no Es­tado me­tade do ca­pital, o acordo «au­menta as pos­si­bi­li­dades de con­trolo pú­blico das de­ci­sões to­madas pela Ad­mi­nis­tração da TAP», re­co­nhece o Par­tido, as­se­gu­rando que «não dei­xará de exercer o mais aper­tado es­cru­tínio à forma como esse con­trolo pú­blico é exer­cido».
 

A fonte dos riscos

Só que «os riscos de des­truição da TAP advêm exac­ta­mente da sua gestão pri­vada, na me­dida em que o Grupo TAP tende a ser co­lo­cado ao ser­viço de uma es­tra­tégia que lhe é alheia – a que in­te­ressa aos ac­ci­o­nistas da Ga­teway, que detêm ou­tros in­te­resses mais es­tra­té­gicos para eles do que a TAP».
Desde a en­trada em fun­ções da ad­mi­nis­tração pri­vada, em me­ados de No­vembro, ocor­reram factos «re­ve­la­dores dos pe­rigos» para que o PCP alertou:

aviões Airbus da TAP foram tro­cados com a Azul, o que re­pre­sentou a trans­fe­rência de mi­lhões de euros para a com­pa­nhia bra­si­leira (uma das prin­ci­pais em­presas de avi­ação em que David Ne­e­leman tem forte par­ti­ci­pação);
a compra pela TAP, através de um novo em­prés­timo de 400 mi­lhões de euros, de aviões que a Azul tinha pa­rados;
as eli­mi­na­ções de voos a partir do Porto;
o acordo de code-share (par­tilha de rotas) da TAP com a Azul, em único be­ne­fício desta úl­tima;
o mo­delo anun­ciado de ponte aérea Lisboa-Porto, numa sub­con­tra­tação de ser­viços que in­dicia até onde se pre­tende ir na de­gra­dação da TAP.

O PCP cri­tica o Go­verno por esta «opção er­rada e pe­ri­gosa para o País» e vai exigir que seja re­ve­lada toda a in­for­mação re­la­ci­o­nada com o pro­cesso. Nos pró­ximos dias, os de­pu­tados co­mu­nistas vão en­tregar um re­que­ri­mento, «para que toda a do­cu­men­tação re­le­vante sobre este ne­gócio seja en­viada aos grupos par­la­men­tares da As­sem­bleia da Re­pú­blica (in­cluindo sobre os ne­gó­cios de­cor­rentes das re­so­lu­ções ile­gais do an­te­rior Con­selho de Mi­nis­tros)».

 

In­ter­venção ur­gente

O PCP «con­ti­nuará a in­tervir para ga­rantir uma TAP in­tei­ra­mente pú­blica, re­ca­pi­ta­li­zada, ao ser­viço do de­sen­vol­vi­mento do País e factor de afir­mação e pro­jecção da so­be­rania na­ci­onal», e «exi­girá si­mul­ta­ne­a­mente a pronta in­ter­venção do Go­verno, em al­gumas ques­tões mais ur­gentes», de­sig­na­da­mente:

Fim ime­diato dos pro­cessos de ca­du­ci­dade da con­tra­tação co­lec­tiva;
Fim da in­tenção de sub­con­tra­tação de ser­viços re­gu­lares à White (do Grupo OMNI), como os pre­vistos para a ponte aérea Lisboa-Porto, na me­dida em que re­pre­sentam uma torpe ten­ta­tiva de fugir à con­tra­tação de tra­ba­lha­dores com di­reitos;
Apu­ra­mento do ponto da si­tu­ação do ne­gócio com as op­ções de compra dos aviões A350, e adopção de me­didas para a sal­va­guarda do in­te­resse na­ci­onal;
Fim de qual­quer in­tenção de ali­enar os ter­renos do re­duto TAP;
De­fesa do sector da as­sis­tência em es­cala, através da TAP, im­pe­dindo-a de aderir a prá­ticas des­re­gu­la­doras e através de le­gis­lação que im­peça a pressão que hoje se vive no sen­tido da des­re­gu­la­men­tação e pre­ca­ri­zação das re­la­ções la­bo­rais.

 

Opção po­lí­tica no Porto

A su­pressão, anun­ciada para Março, de quatro li­ga­ções da TAP no Porto (Bru­xelas, Roma, Milão e Bar­ce­lona) «tem como jus­ti­fi­cação uma clara opção po­lí­tica dos novos donos da TAP, nada tendo a ver com a ne­ces­si­dade de “ren­ta­bi­lizar” re­cursos da em­presa, facto que jus­ti­fica, aliás, a forma como foram ig­no­radas as ele­vadas taxas mé­dias de ocu­pação dos voos em causa», acusou a Di­recção da Or­ga­ni­zação Re­gi­onal do Porto do PCP.
Numa nota di­vul­gada dia 5, a DORP des­taca que aquele plano de eli­mi­nação de voos – de que re­sul­tará a perda de cerca de 190 mil pas­sa­geiros na re­gião – re­força a ne­ces­si­dade de re­verter a pri­va­ti­zação. O PCP «junta-se à de­núncia pú­blica em curso dos efeitos ne­fastos da pri­va­ti­zação» de­ci­dida pelo go­verno PSD/​CDS e re­a­firma «a exi­gência de que o Go­verno re­verta, o mais de­pressa pos­sível, a pri­va­ti­zação da TAP, abrindo ca­minho a uma po­lí­tica ra­di­cal­mente di­fe­rente, que apoie a TAP em vez de a des­truir».

 

Não faça o que cri­ticou

«O País e os tra­ba­lha­dores pre­cisam de co­nhecer todo este ne­gócio, pelo que se exige do Go­verno que não faça hoje o que cri­ticou na opo­sição e que torne trans­pa­rente tudo aquilo que o ne­gócio en­volve», afirmou a Fe­de­ração dos Sin­di­catos de Trans­portes e Co­mu­ni­ca­ções.
Para a Fec­trans/​CGTP-IN, o acordo fir­mado pelo Go­verno com o con­sórcio Atlantic Ga­teway cons­titui «um ne­gócio que não vai in­verter o rumo da TAP». Numa nota pu­bli­cada ao prin­cípio da noite de sá­bado, a fe­de­ração de­clarou que «a re­versão da pri­va­ti­zação da TAP é uma me­dida que, na de­fesa dos in­te­resses do País, se impõe, que nós de­fen­demos e que apoi­a­remos, quando con­fron­tados com uma me­dida que, efec­ti­va­mente, faça re­tornar à mão do Es­tado por­tu­guês esta em­presa es­tra­té­gica».
Não foi pre­ciso passar muito tempo desde a en­trega da TAP ao grupo pri­vado, para que fi­casse de­mons­trado, como aler­taram os re­pre­sen­tantes dos tra­ba­lha­dores, que tal ne­gócio «iria co­locar o fun­ci­o­na­mento da em­presa sob os in­te­resses es­tra­té­gicos do grupo pri­vado». A Fec­trans aponta a troca da en­co­menda de aviões Airbus A350, que be­ne­fi­ciou a Azul «em muitos mi­lhares de euros»; a compra pela TAP de aviões que a Azul tinha pa­rados; o anúncio da eli­mi­nação de voos do Porto; o anúncio de li­ga­ções Lisboa-Porto numa sub­con­tra­tação.
A Fec­trans «la­menta» que o acordo do Go­verno com a Ga­teway não vá «no sen­tido de in­verter esta si­tu­ação, mas que, apesar do au­mento de ca­pital do Es­tado, a em­presa con­tinue do­mi­nada pelos in­te­resses pri­vados que, con­forme já foi de­mons­trado, estão longe deste canto da Pe­nín­sula Ibé­rica».

 



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De­tentor de uma his­tória he­róica, órgão de in­for­mação único no País e ins­tru­mento de or­ga­ni­zação e luta do Par­tido Co­mu­nista Por­tu­guês, o Avante! faz 85 anos no pró­ximo dia 15, cons­ci­ente da sua im­por­tância e dos de­sa­fios que tem pela frente. O prin­cipal é, desde logo, chegar mais longe para me­lhor cum­prir a sua função de jornal co­mu­nista, órgão cen­tral do PCP e tri­buna dos in­te­resses e as­pi­ra­ções dos tra­ba­lha­dores e do povo. A cam­panha de di­fusão que está em pre­pa­ração, vi­sando evi­den­te­mente os mi­li­tantes e amigos do Par­tido, di­rige-se também aos tra­ba­lha­dores, aos re­for­mados, aos pe­quenos e mé­dios em­pre­sá­rios e agri­cul­tores, às mu­lheres e aos jo­vens – a quem o Avante! dá voz e, como ne­nhum outro, de­fende.