Coro dos inconformados

Jorge Cordeiro

Quando As­sunção Cristas, ir­re­vo­gável su­ces­sora de Portas no CDS, veio bradar de en­tu­si­asmo, aquando das pri­meiras ame­aças de Bru­xelas pe­rante o Or­ça­mento do Es­tado, que se iria passar «do sonho rosa aver­me­lhado para um es­tado de pe­sa­delo», me­lhor se per­cebeu o mote do ar­senal ar­gu­men­ta­tivo dos que en­gros­saram a plêiade dos que não con­se­guem re­primir, sempre que olham para a ac­tual si­tu­ação, aquele rosnar de zanga. Aquilo que os move não é o que o Or­ça­mento re­pre­senta, as suas con­tra­di­ções, in­su­fi­ci­ên­cias e li­mi­ta­ções, mas sim a per­cepção de que a sua agenda de des­truição e em­po­bre­ci­mento, com a car­tilha de­ter­mi­nista que a acom­panha, está a ser ques­ti­o­nada. Quando Cristas re­gur­gita eu­fó­rica com as ame­aças da Co­missão Eu­ro­peia o que a move é aquela es­pe­rança de ver quem, ali, a ajude a repor o ce­nário de pe­sa­delo e in­fer­ni­zação da vida dos por­tu­gueses que ela e os seus im­pu­seram ao País.

As vozes da ma­tilha po­lí­tica que se er­gueram contra o Or­ça­mento estão afi­nadas. Quer as dos mais em­pe­der­nidos di­rei­tistas quer as que, sob uma ado­ci­cante re­tó­rica, se ex­primem com rou­pagem de es­querda por in­cor­ri­gí­veis fe­de­ra­listas. Quanto aos pri­meiros, os Mon­teiro ou o Sousas Ta­vares cá do burgo, aí os temos es­gri­mindo contra os que na de­fesa do in­te­resse na­ci­onal cri­ticam a in­ge­rência, acu­sando-os de agitar o «ini­migo ex­terno» para es­conder a sua in­con­fes­sada ali­ança com este. Pouco ha­verá a acres­centar que não a to­le­rante com­pre­ensão com os que, in­con­for­mados com o rumo da vida po­lí­tica, lá vão es­cre­vendo o que os cen­tros do ca­pital trans­na­ci­onal ou as agên­cias de ra­ting lhes re­co­mendam. Olhando para o outro lado, aí temos Rui Ta­vares a pro­clamar in­fla­mado, na­quele seu la­bi­rín­tico ra­ci­o­cínio, a sua ale­gada razão quanto a ser «pos­sível fazer um or­ça­mento de es­querda sem sair do euro nem romper com a UE». Fá-lo, so­bre­tudo, para chegar onde queria, ou seja, ver­berar o que chama de «es­querda euro-cép­tica» que quando car­rega «na re­tó­rica contra os ini­migos ex­ternos pre­tende que não no­temos que deixou cair as suas pro­messas de rom­pi­mento com a UE e mesmo a saída do euro». A tese de Ta­vares é uma des­graça: não só é ma­ni­festo exa­gero ver no Or­ça­mento, um or­ça­mento de es­querda, como é so­bre­tudo ce­gueira não querer ver que para lá das op­ções do Go­verno são as im­po­si­ções ex­ternas que am­pliam as suas li­mi­ta­ções.




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