35 horas: luta, vitória, experiência

Francisco Lopes (Membro da Comissão Política do PCP)

As 35 horas de tra­balho na função pú­blica vão ser re­postas. É uma vi­tória dos tra­ba­lha­dores e uma der­rota da ope­ração do grande ca­pital, as­su­mida pelo go­verno PSD/​CDS-PP que, ao au­mentar o ho­rário de tra­balho se­manal de 35 para 40 horas na função pú­blica, teve como ob­jec­tivo ini­ciar um pro­cesso de au­mento da jor­nada de tra­balho para todos os tra­ba­lha­dores e in­verter a marcha da his­tória de re­dução pro­gres­siva do ho­rário de tra­balho fruto da luta do mo­vi­mento ope­rário no úl­timo sé­culo e meio.

Os tra­ba­lha­dores nunca acei­taram o au­mento do ho­rário de tra­balho

As 35 horas serão re­postas para todos os tra­ba­lha­dores que as ti­nham em 2013. Não foi ainda con­fir­mado o alar­ga­mento a todos os tra­ba­lha­dores que exercem fun­ções na Ad­mi­nis­tração Pú­blica, mas está também aberto o ca­minho para que tal acon­teça através da ne­go­ci­ação co­lec­tiva. As ma­no­bras e chan­ta­gens foram fortes, do grande ca­pital na­ci­onal e trans­na­ci­onal, da UE e do BCE, do PSD e do CDS-PP, com uma po­sição con­tra­di­tória do PS, ma­no­bras e chan­ta­gens que não pa­raram e im­plicam uma grande atenção e mo­bi­li­zação dos tra­ba­lha­dores para que, em de­fi­ni­tivo, se con­cre­tize a eli­mi­nação desta in­jus­tiça e se acabe com a des­cri­mi­nação de tra­ba­lha­dores.

O des­fecho que agora se pers­pec­tiva sig­ni­fi­cará uma grande vi­tória dos tra­ba­lha­dores e da sua luta. Os tra­ba­lha­dores da Ad­mi­nis­tração Pú­blica nunca acei­taram o re­tro­cesso da pas­sagem das 35 para as 40 horas e lu­taram du­rante três anos para o com­bater. Re­a­li­zaram jor­nadas de luta su­ces­sivas, ma­ni­fes­ta­ções, pa­ra­li­sa­ções, greves com mi­lhares e mi­lhares de tra­ba­lha­dores. No poder local, os tra­ba­lha­dores com os seus sin­di­catos (o mo­vi­mento sin­dical uni­tário teve um papel de pri­meiro plano), com a im­por­tante po­sição das au­tar­quias da CDU (apesar de todas as chan­ta­gens feitas sobre os eleitos au­tár­quicos), con­se­guiram que em boa parte das au­tar­quias as 35 horas se man­ti­vessem. Foram as­si­nados Acordos Co­lec­tivos de En­ti­dade Em­pre­ga­dora Pú­blica (ACEEP) cuja pu­bli­cação o go­verno PSD/​CDS-PP boi­cotou mas que, já após a sua der­rota nas elei­ções de 4 de Ou­tubro, foi obri­gado a pu­blicar, face ao pros­se­gui­mento da luta e à de­cisão do Tri­bunal Cons­ti­tu­ci­onal sus­ten­tada na au­to­nomia do poder local.

Dois anos de­pois, e apesar de todas as ame­aças, chegou-se às elei­ções de 4 de Ou­tubro de 2015, com a apli­cação na prá­tica das 35 horas na grande mai­oria das au­tar­quias lo­cais. Esta re­sis­tência e vi­tória na prá­tica da vida deu força ao PCP na sua exi­gência, obrigou o PS a afirmar a re­po­sição das 35 horas (em­bora com uma re­fe­rência de não pro­vocar au­mento de custos que po­deria dar para tudo). Com a der­rota do go­verno PSD/​CDS-PP, a sua queda e re­moção do poder, abriu-se uma nova fase da vida po­lí­tica na­ci­onal, em que o PCP as­sumiu a ne­ces­si­dade de não de­sa­pro­veitar ne­nhuma opor­tu­ni­dade para de­fender, repor e con­quistar di­reitos.

Luta e ini­ci­a­tiva

A questão das 35 horas foi das pri­meiras a ser co­lo­cada com a apre­sen­tação dum pro­jecto-lei do PCP em 28 de Ou­tubro de 2015. Após dis­cussão pú­blica, tal como o pro­jecto-lei do PEV, foi agen­dado para dia 13 de Ja­neiro de 2016 e dis­cu­tido na As­sem­bleia da Re­pú­blica jun­ta­mente com pro­jectos do PS e BE apre­sen­tados em cima da hora. O pro­jecto-lei do PCP (tal como os ou­tros) foi apro­vado na ge­ne­ra­li­dade em 15 de Ja­neiro, abrindo o ca­minho para a re­po­sição e fi­xação das 35 horas de tra­balho se­manal para todos os tra­ba­lha­dores da função pú­blica. Os tra­ba­lha­dores pros­se­guiram a luta, se­guiu-se um tempo de ava­li­a­ções e au­di­ções, con­tra­di­ções e chan­ta­gens. Fi­nal­mente esta se­mana é apro­vada a lei que repõe as 35 horas a partir de 1 de Julho.

A re­po­sição e fi­xação do ho­rário de tra­balho se­manal de 35 horas na função pú­blica in­sere-se na acção mais geral de luta contra a des­re­gu­lação do ho­rário de tra­balho e pela sua re­dução para as 35 horas para todos os tra­ba­lha­dores. Uma luta a travar nas em­presas e lo­cais de tra­balho, na con­tra­tação co­lec­tiva, alar­gando cada vez mais o nú­mero de em­presas em que se pra­ticam ho­rá­rios in­fe­ri­ores a 40 horas. Uma luta em que o PCP toma a ini­ci­a­tiva com a sua in­ter­venção po­lí­tica, agindo na As­sem­bleia da Re­pú­blica e es­ti­mu­lando a uni­dade e or­ga­ni­zação dos tra­ba­lha­dores.

Na in­tensa luta contra o ca­pi­ta­lismo, a classe ope­rária e todos os tra­ba­lha­dores, sempre des­ta­caram a im­por­tância do ho­rário de tra­balho. O ca­minho do fu­turo com o de­sen­vol­vi­mento ci­en­tí­fico e tec­no­ló­gico, com­ba­tendo a ex­plo­ração, com­ba­tendo o de­sem­prego e a pre­ca­ri­e­dade la­boral é o da re­dução do ho­rário de tra­balho. Neste ano em que se as­si­nala 130 anos sobre a trá­gica re­pressão de Chi­cago que deu origem ao 1.º Maio, Dia In­ter­na­ci­onal do Tra­ba­lhador, a re­po­sição das 35 horas para os tra­ba­lha­dores da função pú­blica é mais um es­tí­mulo na luta que con­tinua, pelo em­prego, por me­lhores con­di­ções de vida, pela eman­ci­pação so­cial, por uma so­ci­e­dade livre da ex­plo­ração do homem pelo homem.

_



Mais artigos de: Opinião

Dois casos sintomáticos

No debate quinzenal na AR, na passada sexta-feira, Jerónimo de Sousa questionou o primeiro-ministro sobre diversas matérias, das quais se regista aqui dois exemplos. Sobre a necessidade de revogar a caducidade do Contrato Colectivo de Trabalho (CCT) do sector têxtil (negociado em 2012) e, ao...

O sr. Praet acha coisas

Peter Praet é membro do Conselho Executivo do Banco Central Europeu. Antes disso, passou pelo FMI e pelo banco central belga. Um currículo que fala por ele e que nos deixa logo preparados para o pior. Para a grande maioria do povo português – e dos povos do resto da zona euro com grande margem...

O golo fora

Foi o Presidente do Sindicato quem o disse, referindo-se ao acordo entre o Sindicato dos Estivadores e o patronato do Porto de Lisboa: um empate, com sabor a vitória pelo golo marcado fora. Depois de meses de luta, o acordo assinado trava os principais objectivos de patronato: implica a assinatura de um novo...

Obama em Hiroshima

O primeiro presidente dos EUA a visitar Hiroshima depois do seu bombardeamento atómico em 6 de Agosto de 1945 recusou pedir desculpa ao povo japonês, recusa que foi cinicamente sublinhada numa vasta operação mediática em que Obama é apresentado como campeão da luta por um...

Mas têm

Armou-se um aranzel com a greve portuária de Lisboa, em crescendo de há três semanas para cá. Houve «directos» televisivos em barda, foram na televisão ouvidos uma infinidade de peritos, cuja selecção cuidadosa conduziu à «conclusão...