Brasil criminaliza luta política

Manifesto em defesa do MST

A re­cente cri­mi­na­li­zação do Mo­vi­mento dos Tra­ba­lha­dores Ru­rais Sem Terra (MST) por sec­tores da Jus­tiça de Goiás, que já levou à prisão de dois ac­ti­vistas, está a in­dignar o Brasil.

Mo­vi­mento so­cial não é or­ga­ni­zação cri­mi­nosa

Os pre­si­dentes das Co­mis­sões de Di­reitos Hu­manos do Con­gresso Na­ci­onal, ou­tros 25 par­la­men­tares, 67 en­ti­dades e de­zenas de ci­dadãs e ci­da­dãos bra­si­leiros e es­tran­geiros as­si­naram um ma­ni­festo contra a cri­mi­na­li­zação do MST. Com base na clas­si­fi­cação do Mo­vi­mento como «or­ga­ni­zação cri­mi­nosa» – crime pre­visto na Lei nº 12.850/​2013 – estão presos José Valdir Mis­ne­ro­vicz, geó­grafo e Luiz Ba­tista Borges, tra­ba­lhador rural. Essas de­ci­sões ju­di­ciais são ab­so­lu­ta­mente in­com­pa­tí­veis com as leis vi­gentes, com a Cons­ti­tuição e com o Es­tado De­mo­crá­tico de Di­reito, con­si­deram os subs­cri­tores do ma­ni­festo.

O do­cu­mento, aberto à subs­crição pú­blica, lembra que a «luta por novos di­reitos e pela efec­ti­vação de di­reitos já pre­vistos é ine­rente à de­mo­cracia, além de ser um im­pe­ra­tivo de­cor­rente da Cons­ti­tuição de 1988», pelo que a «or­ga­ni­zação em mo­vi­mentos so­ciais não apenas é lí­cita como de­se­jável».

São as ar­ti­cu­la­ções com pro­pó­sitos rei­vin­di­ca­tivos que per­mitem o avanço na con­cre­ti­zação dos ob­jec­tivos fun­da­men­tais pre­vistos pelo pró­prio cons­ti­tuinte, re­fere o texto, su­bli­nhando que o «pro­pó­sito dos mo­vi­mentos so­ciais não é vi­olar o Di­reito, mas ri­go­ro­sa­mente o con­trário, fazê-lo valer».

Es­tado re­pres­sivo

O ma­ni­festo faz notar que a «ocu­pação de terras, de­lito es­pe­cí­fico que daria a ca­rac­te­rís­tica de or­ga­ni­zação cri­mi­nosa ao MST de Goiás, é ex­pressão dos di­reitos civis e po­lí­ticos» e «visa con­cre­tizar as normas cons­ti­tu­ci­o­nais que pre­vêem que a pro­pri­e­dade pri­vada é ga­ran­tida na me­dida em que se ve­ri­fique o cum­pri­mento de sua função so­cial». Ou seja, no «caso dos imó­veis ru­rais, aqueles que não te­nham apro­vei­ta­mento ra­ci­onal e ade­quado, que não uti­lizem de forma ade­quada os re­cursos na­tu­rais dis­po­ní­veis, que não ob­servem as normas do di­reito do tra­balho e que não fa­vo­reçam o bem-estar dos pro­pri­e­tá­rios e dos tra­ba­lha­dores, não cum­prem o dis­posto cons­ti­tu­ci­onal», en­fa­tiza o do­cu­mento.

Con­si­de­rando que as ocu­pa­ções de terras são um «ins­tru­mento com­ple­ta­mente le­gí­timo de pressão para re­a­li­zação de po­lí­tica pú­blica» e «me­ca­nismos de efec­ti­vação ur­gente de ne­ces­si­dades vi­tais que são dos di­reitos hu­manos à ali­men­tação e mo­radia», os sig­na­tá­rios do ma­ni­festo frisam que a «de­cisão de con­si­derar como cri­mi­nosas as ac­ti­vi­dades de um dos mais im­por­tantes mo­vi­mentos so­ciais do Brasil e do mundo, es­sen­cial para o avanço na efec­ti­vação dos di­reitos hu­manos, tem viés po­lí­tico e ar­bi­trário», sendo «in­com­pa­tível com o que se es­pera de um sis­tema de Jus­tiça que res­peite a Cons­ti­tuição de 1988». «Mo­vi­mento so­cial não é or­ga­ni­zação cri­mi­nosa; a luta po­lí­tica não é crime», con­cluem.

Em en­tre­vista ao MST a pro­pó­sito desta si­tu­ação, o ad­vo­gado Mar­celo La­venère, autor do pe­dido de im­pe­a­ch­ment de Fer­nando Collor de Mello, em 1992, con­si­dera a prisão dos mi­li­tantes do MST em Goiás «ab­surda e ina­cei­tável» e re­ve­la­dora da «in­ten­si­fi­cação do Es­tado re­pres­sivo bra­si­leiro contra aqueles que ousam atentar contra o pa­trão, o chefe, o pro­pri­e­tário».

«O en­du­re­ci­mento da le­gis­lação a que as­sis­timos [Lei An­ti­ter­ro­rismo e de Or­ga­ni­zação Cri­mi­nosa] e ou­tras que estão no mesmo quadro, como a ten­ta­tiva de re­dução da mai­o­ri­dade penal e a de­cisão do Su­premo Tri­bunal Fe­deral que manda exe­cutar sen­tenças antes que elas ter­minem o seu ciclo ju­di­ciário – todo esse quadro de en­du­re­ci­mento le­gis­la­tivo é ex­tre­ma­mente pre­o­cu­pante e cen­su­rável», afirma.

 



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