Portugueses no mundo
Todos os dias úteis, a rádio pública emite uma rubrica de meia dúzia de minutos intitulada «Portugueses no Mundo», temática que tem agora também um formato televisivo.
Todas as manhãs, à hora do trânsito, uma simpática jornalista telefona para um qualquer país do mundo e, do lado de lá, aparece, invariavelmente, uma não menos simpática voz, a dar conta de como, para lá das saudades do sol, do mar, da sardinha assada e dos pastéis de nata, vivem bem, são felizes e a experiência de emigração correu bem e valeu a pena.
Note-se que não há, nestas linhas, nenhum azedume ou desvalorização face à importância do fenómeno da emigração, em geral, e do papel dos milhões de emigrantes em particular, na sociedade portuguesa e de como, em muitas circunstâncias, essa foi a solução para os problemas criados por criminosas políticas concretizadas, seja pelo fascismo, que originou o surto de emigração dos anos 60, seja pela política de direita das últimas décadas agravada brutalmente pelos PEC e pelo pacto de agressão, que expulsaram do País, num período muito concentrado de tempo, mais de meio milhão de portugueses.
Mas não podemos deixar de assinalar que, pelo tom de todas as peças, se procura dar da emigração portuguesa uma imagem idílica, glamorosa até, em que muitos dos emigrantes não conseguirão reconhecer-se, pelas dificuldades que encontram e pelos obstáculos que lhe são colocados seja pelo grau de exploração a que são sujeitos na sua condição de emigrantes, seja por uma política de desvalorização do apoio a estes portugueses, de que o encerramento de consulados levados a cabo pelo governo anterior é expressivo exemplo.
Este tipo de programas, inseridos numa lógica de afirmação das ditas «notícias positivas», não podem ser desligados da ofensiva ideológica que procura não apenas responsabilizar cada um pela sua situação pessoal, partindo da ideia de que se todos os que aparecem no programa conseguem, por que é que cada um que está desempregado não consegue, mas também esquecer os milhares de homens e mulheres que tendo tentado a sua sorte no estrangeiro, porque o seu país os abandonou, não encontraram o El Dorado, antes continuam a lutar com sérios problemas tanto mais agudos quanto se passam a milhares de kms da sua terra natal.