O Avante! é uma arma

Anabela Fino

Sem li­ber­dade de im­prensa não há de­mo­cracia. Eis uma frase em que todos pa­recem rever-se, ra­ra­mente pa­rando para pensar que li­ber­dade de im­prensa é essa que existe nas de­mo­cra­cias bur­guesas, como se a mul­ti­pli­cação de tí­tulos, ca­nais de rádio, te­le­visão e ou­tros su­portes ditos de in­for­mação fossem con­dição su­fi­ci­ente para ga­rantir a li­ber­dade, o plu­ra­lismo, a isenção, a se­ri­e­dade. Como se os de­ten­tores dos meios não fossem de­ter­mi­nantes na men­sagem, como se a in­for­mação jor­na­lís­tica fosse um pro­duto qui­mi­ca­mente puro, não su­bor­di­nada a in­te­resses e ob­jec­tivos. Como se in­formar não fosse es­co­lher e es­co­lher não fosse sempre uma forma de «tomar par­tido». Como se ig­no­rás­semos que os media são há muito veí­culos pri­vi­le­gi­ados da pro­pa­ganda.

«No sis­tema de pro­pa­ganda, os veí­culos diá­rios das em­presas de co­mu­ni­cação so­cial, jor­nais e rá­dios, foram sempre as armas mais de­ci­sivas e mais mor­tais», es­creveu re­cen­te­mente o jor­na­lista aus­tra­liano John Pilger, num ar­tigo sobre o papel dos jor­na­listas, onde ad­voga que «sem os en­sur­de­ce­dores tam­bores ba­tidos pela pro­pa­ganda tra­ves­tida de jor­na­lismo, os mons­tros do ISIS e da Al-Qaeda e Frente al-Nusra e o resto da gangue jiha­dista talvez nem exis­tissem». A afir­mação nada tem de le­viano e está longe de ser uma opi­nião pes­soal. Con­cei­tu­ados jor­na­listas en­tre­vis­tados por Pilger, uns ainda no ac­tivo e ou­tros de­di­cados ao en­sino e in­ves­ti­gação, como Charles Lewis, Dan Rather da CBS, David Rose do Ob­server e jor­na­listas e pro­du­tores na BBC que fa­laram sob ano­ni­mato, não ti­veram dú­vidas na res­posta a dar à per­gunta: «o que teria acon­te­cido se a ‘im­prensa mais livre do mundo’ ti­vesse re­al­mente de­nun­ciado como pro­pa­ganda o que, todos sa­biam, não pas­sava de pro­pa­ganda pró-guerra?». Todos re­co­nhe­ceram que «se os jor­na­listas ti­vessem feito jor­na­lismo, se ti­vessem in­ves­ti­gado o que não pas­sava de pro­pa­ganda, em vez de re­petir e am­pli­ficar a pro­pa­ganda sem qual­quer in­ves­ti­gação, cen­tenas de mi­lhares de ho­mens, mu­lheres e cri­anças es­ta­riam vivos». Re­por­tando-se às guerras pro­mo­vidas pelos EUA nas úl­timas dé­cadas, Pilger lembra que o «ataque contra o Iraque, o ataque contra a Líbia, o ataque contra a Síria acon­te­ceram porque o go­ver­nante, em cada um desses países, não era um fan­toche e vas­salo do oci­dente» e ad­verte que os «to­ca­dores de tambor do Washington Post in­ci­tando à guerra com a Rússia são os mesmos re­dac­tores de edi­to­riais que pu­bli­caram a men­tira de que Saddam Hus­sein teria (não tinha) armas de des­truição em massa».

Não será ne­ces­sário um grande es­forço de me­mória ou uma pes­quisa atu­rada para en­con­trar pa­ra­le­lismo – para não dizer mi­me­tismo – na cena me­diá­tica na­ci­onal.

Em dia de ani­ver­sário do Avante! e quando está em marcha uma cam­panha de di­vul­gação e pro­moção do nosso jornal, cabe lem­brar que, ao con­trário dos «fa­ci­li­ta­dores cúm­plices», como um porta-voz de Ge­orge Bush de­signou um dia as em­presas de co­mu­ni­cação so­cial, o órgão cen­tral do PCP não só as­sume ple­na­mente o seu es­ta­tuto de jornal que «toma par­tido» pelos tra­ba­lha­dores, pelo povo, pelos in­te­resses na­ci­o­nais, como afirma sem sub­ter­fú­gios os va­lores que de­fende e pelos quais se bate.

Não sendo, nem pre­ten­dendo ser, apenas um bo­letim par­ti­dário, antes se rei­vin­di­cando como um jornal no pleno sen­tido do termo – que in­forma, forma e es­cla­rece – o Avante! ocupa no pa­no­rama me­diá­tico uma po­sição (quase) única. Não é por acaso que o fo­lheto dis­tri­buído no âm­bito da cam­panha em curso se afirma que este é o jornal que dá voz aos que não têm voz, o jornal que diz o que os ou­tros es­condem, que é um ins­tru­mento in­dis­pen­sável nas mãos dos que se batem por uma so­ci­e­dade justa e so­li­dária, por um mundo de paz.

Pensar que se está bem in­for­mado só com a «in­for­mação» do ini­migo de classe é não só uma ilusão como uma ilusão pe­ri­gosa. A in­for­mação é uma arma. Há que saber es­co­lher as armas com que lu­tamos, sob pena de nos tor­narmos as suas pri­meiras ví­timas. O Avante! está, como sempre es­teve, ao al­cance de todos. Para ser lido, es­tu­dado, dis­cu­tido, usado. E isso torna-nos a todos mais fortes para as lutas de todos os dias.

 



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