«Baratas tontas»

Carlos Gonçalves

No quadro de ex­cep­ci­onal gra­vi­dade dos in­cên­dios flo­res­tais, que o PSD devia con­si­derar «di­a­bó­lico», abundam os co­men­ta­ristas da «pós ver­dade», apo­lo­getas ou sub­con­tra­tados da ope­ração de ocul­tação, mis­ti­fi­cação e bran­que­a­mento da po­lí­tica de di­reita e das suas res­pon­sa­bi­li­dades nesta ca­la­mi­dade.

Mar­ques Mendes, «en­ter­tainer» po­lí­tico da SIC, ex-mi­nistro e ex-líder do PSD, opta por es­conder a his­tória – «Por­tugal arde mais que ou­tros países do Sul da Eu­ropa», afirma, mas não diz que nas flo­restas na­ci­o­nais do­mina a mo­no­cul­tura para pro­dução de ce­lu­lose, neta do fas­cismo e filha de qua­renta anos de PS/​PSD/​CDS. Se há menos fogos nesses países, então é só «co­piar as suas me­lhores prá­ticas», afirma, mas não diz que PS/​PSD/​CDS não o fi­zeram. O ca­minho con­fesso do Mendes é o da con­cen­tração da pro­pri­e­dade nas «matas das ce­lu­loses» – de­ser­ti­fi­cação e aban­dono rural, en­tregar tudo ao ca­pital, que de­cide o quê, quando e como vai arder.

Hen­rique Mon­teiro, re­dactor do Ex­presso e di­rector geral ad­junto no Grupo Im­presa, es­creve que es­tamos pior do que ou­tros países da Eu­ropa, não pela po­lí­tica des­gra­çada de dé­cadas (que ele apoiou), mas porque «todos os par­tidos» da AR, (ex­clui o PAN), «ti­veram ou têm res­pon­sa­bi­li­dades» e con­ti­nuam as suas «inú­teis cam­pa­nhas au­tár­quicas», «ba­ratas tontas», num País que pre­cisa «de um líder à al­tura». Uma pro­cla­mação «pós ver­da­deira» – porque o PCP e a CDU não cabem no saco da po­lí­tica de di­reita, que está na gé­nese desta ca­la­mi­dade e porque, com a po­lí­tica que pro­pomos, a si­tu­ação seria di­fe­rente, in­ver­tendo o ciclo de ca­tás­trofe dos fogos flo­res­tais. O resto da sua lauda é apenas «pós de­mo­crá­tica» e re­ac­ci­o­nária.

Para es­conder a res­pon­sa­bi­li­dade da po­lí­tica de di­reita na ca­tás­trofe dos fogos flo­res­tais, por exemplo, quando Passos Co­elho e As­sunção Cristas, no an­te­rior go­verno, des­vi­aram noutra di­recção, du­zentos mi­lhões de euros de in­ves­ti­mento flo­restal (PRODER), estes se­nhores perdem o verniz de­mo­crá­tico e ar­gu­mentam como «ba­ratas tontas».




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