Não há dois caminhos

Jorge Pires (Membro da Comissão Política)

Numa de­cla­ração po­lí­tica na As­sem­bleia da Re­pú­blica cujo tema foi o ba­lanço ao ano lec­tivo de 2016/​2017, o Grupo Par­la­mentar do PCP, con­si­derou que este «co­meçou bem, mas acabou menos bem».

O PS tem de es­co­lher qual o ca­minho que quer per­correr

Pode ler-se no texto da de­cla­ração que «con­tra­ri­a­mente aos anos an­te­ri­ores, que fi­caram mar­cados pela ins­ta­bi­li­dade de­vido aos pro­fes­sores por co­locar e aos mi­lhares de alunos sem aulas, o ano lec­tivo ini­ciou-se com nor­ma­li­dade, as es­colas abriram dentro do pe­ríodo pre­visto, no fun­da­mental com os pro­fes­sores co­lo­cados a tempo e horas através de con­curso com lista na­ci­onal (tendo para isso con­tri­buído a ex­tinção da bolsa de con­tra­tação de es­cola)». Uma ava­li­ação que tem em conta a im­ple­men­tação de um con­junto de me­didas, al­gumas delas há muito pro­postas pelo PCP e ou­tras em re­sul­tado da luta dos tra­ba­lha­dores da edu­cação e da co­mu­ni­dade edu­ca­tiva em geral.

Era por isso ex­pec­tável que o Go­verno apro­vei­tasse a parte final do ano lec­tivo para anun­ciar um con­junto de de­ci­sões para 2017/​2018 que per­mi­tisse novos e mais pro­fundos avanços de forma a ir re­sol­vendo pro­blemas de fundo que há muito se mantêm, mas não o fez. Pre­feriu ali­mentar al­guma ins­ta­bi­li­dade, quer por via da omissão de me­didas ab­so­lu­ta­mente in­dis­pen­sá­veis, quer man­tendo al­gumas si­tu­a­ções ina­cei­tá­veis. As ques­tões re­la­ci­o­nadas com a vin­cu­lação ex­tra­or­di­nária de do­centes, não vin­cu­lando se­quer o nú­mero de pro­fes­sores que reúnem os re­qui­sitos exi­gidos pelos cri­té­rios de­fi­nidos pelo Go­verno e a re­cusa em as­sumir um ca­len­dário para a re­so­lução fa­seada do pro­blema, bem como o pro­jecto de DL posto em dis­cussão pú­blica sobre In­clusão que, a não ser pro­fun­da­mente al­te­rado, le­vará à se­gre­gação de mi­lhares de cri­anças e jo­vens con­tra­ri­ando prin­cí­pios bá­sicos de uma es­cola in­clu­siva. Estes são apenas dois exem­plos de uma pos­tura pró­pria de quem não aprendeu com o pas­sado, man­tendo-se fiel aos com­pro­missos com a po­lí­tica de di­reita.

Ques­tões em aberto

A quinze dias da aber­tura do ano lec­tivo 2017/​2018, a grande in­ter­ro­gação que está co­lo­cada é saber-se se o Go­verno do PS está ou não dis­posto a mudar de po­lí­tica edu­ca­tiva, co­me­çando por apro­veitar o Or­ça­mento do Es­tado para 2018 para re­forçar o fi­nan­ci­a­mento da edu­cação.

Se está dis­po­nível para ini­ciar um pro­cesso que con­duza ao fim dos mega-agru­pa­mentos, es­paços in­ge­rí­veis e pro­fun­da­mente de­su­ma­ni­zados.

Se vai abrir um novo pro­cesso de vin­cu­lação de do­centes, na pers­pec­tivo de du­rante a le­gis­la­tura vin­cular os cerca de 20 000 pro­fes­sores com vín­culos pre­cá­rios.

Se vai con­tratar os mi­lhares de as­sis­tentes ope­ra­ci­o­nais em falta nas es­colas.

Se está dis­po­nível para dis­cutir e en­con­trar, mesmo que de forma fa­seada, so­lu­ções para a re­dução do nú­mero de alunos por turma, dei­xando de dis­cutir este pro­blema numa ló­gica eco­no­mi­cista.

Se pre­tende con­ti­nuar a tratar as ques­tões cur­ri­cu­lares de forma avulsa, ou está dis­po­nível para avançar com uma ver­da­deira re­forma.

Quer ou não apro­fundar o pro­cesso que con­duza à gra­tui­ti­dade dos ma­nuais es­co­lares para todo o en­sino obri­ga­tório até ao final da le­gis­la­tura.

Está ou não dis­po­nível para fazer re­gressar às es­colas a gestão de­mo­crá­tica, uma das mais im­por­tantes con­quistas de Abril na Edu­cação e in­dis­pen­sável para a afir­mação de uma ver­da­deira au­to­nomia das es­colas.

Estas são apenas al­gumas das muitas ques­tões que estão em aberto de cuja res­posta po­si­tiva de­pende não apenas o êxito do pró­ximo ano lec­tivo, mas so­bre­tudo a cor­recção de um ca­minho er­rado que emana da po­lí­tica de di­reita que tem vindo a des­va­lo­rizar a es­cola pú­blica por­tu­guesa, com me­didas que se ca­rac­te­rizam pela su­bal­ter­ni­zação de cri­té­rios pe­da­gó­gicos em prol de cri­té­rios eco­no­mi­cistas e eli­tistas, ao mesmo tempo que pro­curam ins­tru­men­ta­lizar cada vez mais a es­cola como um centro de for­mação ao ser­viço dos in­te­resses do cha­mado mer­cado de tra­balho.

O PS tem de es­co­lher qual o ca­minho que quer per­correr.

Da parte do PCP existe toda a dis­po­ni­bi­li­dade para ga­rantir novos e mais pro­fundos avanços, mas também uma re­cusa muito clara em apoiar o ma­rasmo ou o apro­fun­da­mento da po­lí­tica de di­reita.

 



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