A habitação é um direito

João Dias Coelho

É ne­ces­sário que o Es­tado as­suma a suas res­pon­sa­bi­li­dades

Nos pri­meiros anos da Re­vo­lução de Abril, com pro­gramas e es­tru­turas cri­ados no âm­bito da ad­mi­nis­tração cen­tral e en­vol­vendo as au­tar­quias, ini­ciou-se o re­a­lo­ja­mento de fa­mí­lias re­si­dentes em bar­racas, pro­moveu-se a cons­trução de fogos de custo con­tro­lado e de renda so­cial, de­sen­volveu-se as co­o­pe­ra­tivas de ha­bi­tação, lançou-se pro­gramas de re­cu­pe­ração de casas, avançou-se com re­cu­pe­ração de bairros de gé­nese ilegal.

Com o pro­cesso contra-re­vo­lu­ci­o­nário, su­ces­sivos go­vernos vi­eram con­tra­riar estas po­lí­ticas pro­gres­sistas, afas­tando o Es­tado do seu papel es­sen­cial para res­ponder à ca­rência de ha­bi­tação. Para o PS, o PSD e o CDS a so­lução do pro­blema es­tava – está – no mer­cado na en­trega ao ca­pital fi­nan­ceiro-imo­bi­liário. Tal con­duziu a que, mais de qua­renta anos pas­sados, o di­reito Cons­ti­tu­ci­onal à ha­bi­tação não só não foi cum­prido, como o pro­blema se agravou.

Cabe ainda dizer que o Pro­grama Es­pe­cial de Re­a­lo­ja­mento criado em 1993 com o ob­jec­tivo de er­ra­di­cação das bar­racas, para além de obrigar as au­tar­quias a pe­sados en­cargos, não foi con­cluído e, desde 2009, não tem verbas do Or­ça­mento do Es­tado.

Sendo certo que o PS tem pe­sadas res­pon­sa­bi­li­dades, in­clu­sive com a sis­te­má­tica fra­gi­li­zação e o des­man­te­la­mento de es­tru­turas da ad­mi­nis­tração cen­tral na área da ha­bi­tação, foi com o go­verno PSD/​CDS e a sua po­lí­tica de classe, de au­mento da ex­plo­ração e de em­po­bre­ci­mento da es­ma­ga­dora mai­oria da po­pu­lação, que as con­di­ções para o exer­cício do di­reito Cons­ti­tu­ci­onal à ha­bi­tação se de­gra­daram e, cada vez mais, a ha­bi­tação se tornou um campo de es­pe­cu­lação fi­nan­ceira.

Das pa­la­vras aos actos

Du­rante o an­te­rior go­verno PSD/​CDS foi al­te­rada a leis do ar­ren­da­mento ur­bano, jus­ta­mente co­nhe­cida por lei dos des­pejos. O valor das rendas tornou-se in­com­por­tável para muitos ar­ren­da­tá­rios e ve­ri­ficou-se o des­pejo de mi­lhares de fa­mí­lias. Também a Lei da Renda Apoiada foi al­te­rada, abrindo a porta ao au­mento das rendas e a des­pejos to­tal­mente in­justos nos bairros so­ciais. Em si­mul­tâneo, o au­mento do de­sem­prego, a re­dução dos ren­di­mentos e dos apoios so­ciais, o au­mento da carga fiscal, le­varam a que mi­lhares de pes­soas se vissem im­pe­didas de sa­tis­fazer as suas obri­ga­ções do cré­dito à ha­bi­tação pe­rante os bancos, o que deu origem a mi­lhares de des­pejos co­er­civos.

Hoje pe­rante a es­puma das pro­messas elei­to­rais ou­vimos vá­rios can­di­datos au­tár­quicos fa­larem do di­reito à ha­bi­tação, da cons­trução de ha­bi­tação so­cial, da fi­xação dos jo­vens, mas im­porta lem­brar que, sendo a prá­tica o me­lhor cri­tério da ver­dade, as au­tar­quias da CDU têm de­sen­vol­vido um in­tenso e me­ri­tório tra­balho no en­vol­vi­mento da po­pu­lação dos bairros so­ciais, na re­pa­ração de ha­bi­ta­ções e equi­pa­mentos so­ciais, na re­cu­pe­ração de bairros de gé­nese ilegal, no apoio à auto re­pa­ração de ha­bi­ta­ções. E que o grupo par­la­mentar do PCP apre­sentou, entre ou­tras, um con­junto de pro­postas vi­sando pro­fundas al­te­ra­ções à lei das rendas/​lei dos des­pejos, à lei da renda apoiada, in­ter­veio e propôs a sus­pensão das de­mo­li­ções e des­pejos nos bairros de ha­bi­tação pre­cária e de­gra­dada sem al­ter­na­tiva e o au­mento das do­ta­ções or­ça­men­tais no âm­bito do pro­grama Porta 65 Jovem.

No PCP e na CDU con­si­de­ramos, em pri­meiro lugar, que a ga­rantia de ha­bi­tação é um di­reito, ca­bendo ao Es­tado, em ar­ti­cu­lação com as au­tar­quias, con­cre­tizá-lo.




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