Atraso do Governo sobre longas carreiras não se resolve com propostas recuadas
FAZER JUSTIÇA «Recuado» e «desresponsabilizador» dos compromissos do Governo, assim avalia o PCP o projecto de lei do BE sobre o regime das reformas antecipadas.
É de elementar justiça eliminar o factor de sustentabilidade
LUSA
O diploma foi chumbado sexta-feira passada, 13, por PS, PSD e CDS, depois de ter estado em debate na antevéspera. Apesar das dúvidas e críticas suscitadas pelo diploma, a bancada comunista votou-o favoravelmente e o mesmo fez o PEV, optando o PAN pela abstenção.
Das bancadas à direita do hemiciclo foram outras as razões para a reprovação ao diploma, com Carla Barros (PSD) a acusar os seus autores de «encenação mediática», e Filipe Anacoreta Correia (CDS) a apelidar a iniciativa de «número inconsequente».
Já o PS, pela voz Catarina Marcelino, justificou o voto contra alegando que a viabilização do diploma viola a «lei travão», com um impacto orçamental que não foi calculado.
De natureza e consistência bem diversas foram as reservas levantadas no debate pela bancada comunista, com João Oliveira, a defender que as «hesitações» e «atrasos» do Governo do PS não têm solução em respostas que são «mais recuadas que os compromissos que este próprio já assumiu» em Maio do ano passado e que apontam para «novos atrasos».
Antes, Diana Ferreira criticara já o facto de o diploma do BE não considerar a «idade pessoal de reforma de acordo com a carreira contributiva, conforme constava da proposta inicial do Governo», nem apresentar «qualquer solução para as pessoas que iniciaram muito cedo a sua carreira contributiva (antes dos 16 anos), como a proposta do Governo também contemplava, para a primeira fase, e que não foi concretizada».
A deputada comunista chamou ainda a atenção para o facto de o projecto do BE concretizar «parcialmente a segunda fase da revisão do regime das reformas antecipadas, que é da responsabilidade do Governo», com um calendário que este se comprometeu (entrada em vigor em Janeiro deste ano) mas que não cumpriu.
«Com esta proposta o BE acaba por assumir esse atraso», realçou Diana Ferreira, explicando que tendo presente as regras de entrada em vigor de uma lei da AR, caso tivesse sido aprovada, a «solução seria empurrada para o próximo OE e para 2019, quando, por via de decreto-lei do Governo, «pode e deve ser tomada imediatamente».
«Em vez de exigir do Governo a efectiva valorização das longas carreiras contributivas», o BE o que faz é passar para a Assembleia da República a responsabilidade de resolver a situação criada pelo incumprimento do calendário assumido pelo Governo, diminuindo mesmo o alcance das alterações», insistiu João Oliveira, antes de reafirmar que as propostas do PCP «não pretendem substituir-se às do Governo e aos compromissos por este assumidos». Pelo contrário, «são propostas estruturais que vão muito para lá dos compromissos do Governo para dar resposta a quem começou cedo demais a trabalhar e tem direito a reformar-se sem penalizações», rematou.
Diferenças que contam
João Oliveira não deixou de registar o que considerou ser a «grande diferença» entre a discussão que agora teve lugar e a ocorrida entre 2011 e 2015: «onde antes se falava de cortes e retrocessos, onde se questionava a sustentabilidade da Segurança Social e os direitos adquiridos dos pensionistas, que viam as suas pensões cortadas e ameaças de cortes de mais 600 milhões de euros, hoje a discussão é sobre a reposição de direitos, sobre a eficácia dessa reposição para a melhoria das condições de vida e para a recuperação a economia e da Segurança Social», afirmou.
Diferença que em sua opinião «só é possível» porque os portugueses lutaram «contra a política de agravamento da exploração e empobrecimento executada pelo PSD e CDS». E não só. Essa diferença só existe porque foi igualmente possível afastar aqueles partidos do governo, lembrou, «num quadro em que o Governo minoritário do PS está condicionado pela AR e, em particular, pelas posições e propostas apresentadas pelo PCP».
Pelo direito à reforma sem penalizações
Já entregue pela bancada comunista no Parlamento foi entretanto um conjunto de medidas que visam, entre outros objectivos, a valorização das longas carreiras contributivas para a Segurança Social, possibilitando designadamente o acesso à reforma sem penalizações com 40 anos de descontos, independentemente da idade.
A eliminação do factor de sustentabilidade, a reposição da idade legal de reforma nos 65 anos, soluções para facilitar o acesso à reforma antecipada aos trabalhadores em situação de desemprego de longa duração, a correcção das injustiças a todos aqueles que foram «empurrados para a reforma antecipada, sofrendo fortíssimas penalizações», são outras tantas medidas que integram o pacote de iniciativas legislativas do PCP, «autónomas das propostas do Governo», e «não dependentes de calendários ou processos de outros», como assinalou a deputada Diana Ferreira.
Não deixando de reconhecer o sentido «positivo» das alterações introduzidas em Outubro último sobre as longas carreiras contributivas, a parlamentar comunista realçou porém que ficaram «aquém das expectativas criadas e da necessidade de fazer justiça a quem passou a vida inteira a trabalhar».
«Não é aceitável a imposição do regresso ao tempo em que as pessoas eram obrigadas a trabalhar até ao limite das suas vidas e das suas forças», sublinhou Diana Ferreira, para quem é também da mais elementar justiça a eliminação do factor de sustentabilidade e a reposição da idade legal de reforma nos 65 anos.
É que o aumento da idade de reforma e o factor de sustentabilidade, criticou, «são instrumentos economicistas» que degradam as condições de vida dos trabalhadores e dos reformados, põem em causa o seu direito a envelhecer com direitos, a uma pensão digna».
A reposição de critérios de justiça para os trabalhadores forçados à reforma antecipada - e que por isso sofreram cortes brutais nas pensões -, foi igualmente tida em conta pelo PCP, que avança com a eliminação dessas penalizações, do mesmo modo que não esqueceu os desempregados de longa duração, defendendo uma resposta que não os penalize por não conseguirem encontrar emprego, eles que são em muitos casos injustamente vistos como «demasiado velhos para trabalhar e novos para a reforma».