Benchmarking

Anabela Fino

A ne­ces­si­dade do ca­pi­ta­lismo de dis­farçar a sua es­sência ex­plo­ra­tória é tão grande que os seus de­fen­sores não olham a meios para tentar atingir os seus fins. Pouco im­porta o que te­nham de dizer, de mentir, de en­ganar. O que im­porta é que o façam, com a ga­rantia de que as suas pa­la­vras terão re­per­cussão bas­tante.

O cerco aos sec­tores que ainda não do­minam em ab­so­luto é per­ma­nente, mas tende a in­ten­si­ficar-se em vés­peras de elei­ções e/​ou da apro­vação do Or­ça­mento de Es­tado. É o que está mais uma vez a acon­tecer.

O alvo é o Ser­viço Na­ci­onal de Saúde (SNS), há muito a sus­citar a gula dos pri­vados. Porque é pre­ciso dourar a pí­lula, não há quem não pro­clame que o SNS é um bem a pre­servar e a me­lhorar, mas... será tanto me­lhor quanto mais se abrir à gestão pri­vada. Re­su­mindo, dizem-nos que o pri­meiro ob­jec­tivo dos pri­vados não é o lucro, aliás le­gí­timo, sal­va­guardam, mas sim a de­fesa do di­reito dos por­tu­gueses à saude, como a Cons­ti­tuição con­sagra. Para tal só é pre­ciso ge­ne­ra­lizar as PPP, que é aquele ne­gócio em que o Es­tado paga um ele­vado custo de fi­nan­ci­a­mento e a pres­tação do ser­viço su­pos­ta­mente de ex­ce­lência.

Não é pre­ciso de­mons­trar que a gestão pri­vada é me­lhor do que a pú­blica. A coisa é dada como ad­qui­rida, como convém aos ges­tores co­nhe­cidos pela sua tran­su­mância entre pú­blico e pri­vado, que assim se dis­pensam de ex­plicar o fe­nó­meno que os faz passar de bestas a bes­tiais mal passam pela porta gi­ra­tória que liga os dois sec­tores.

Mas adi­ante. Dando se­gui­mento à ini­ci­a­tiva de no­tá­veis gi­ra­tó­rios que há uns tempos es­pre­meram as me­ninges para dar à luz um es­tudo sobre o SNS, o tema voltou à baila em Junho úl­timo pela mão do BE, que quer uma nova Lei de Bases da Saúde, ale­ga­da­mente para acabar com as taxas mo­de­ra­doras e as PPP no sector, em­bora ne­nhuma delas re­sulte da Lei de Bases em vigor.

Um mês de­pois, numa Con­venção re­a­li­zada em Lisboa, Mar­celo Re­belo de Sousa e Rui Rio sin­to­ni­zaram-se: qual­quer al­te­ração à re­fe­rida Lei deve con­sa­grar a par­ti­ci­pação dos pri­vados e as PPP.

A se­mana pas­sada, o PSD voltou à carga com o do­cu­mento «Uma po­lí­tica de Saúde para Por­tugal», onde se de­fende a ne­ces­si­dade de «que­brar o tabu ide­o­ló­gico» contra a ge­ne­ra­li­zação das PPP.

O ob­jec­tivo, claro, é «salvar e não eli­minar» o SNS, como disse Luís Fi­lipe Pe­reira, ex-mi­nistro da Saúde do PSD e an­tigo ad­mi­nis­trador do Banco Mello e do grupo CUF (ambos com PPP na saúde). A ga­rantia de que tudo seria um mar de rosas, se­gundo o do­cu­mento dis­po­nível na pá­gina do par­tido, é dada pelo «ben­ch­mar­king» (sic), que em por­tu­guês cor­rente sig­ni­fica ava­li­ação com­pa­ra­tiva.

Ava­li­ando o que já se sabe, ocorre-nos a sa­be­doria po­pular de Aleixo: Vinho que vai para vi­nagre / não re­tro­cede o ca­minho; / só por obra de mi­lagre, / pode de novo ser vinho.




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