20 anos. Festa rija?
Esta semana, em Estrasburgo, o plenário do Parlamento Europeu celebrou o vigésimo aniversário do euro. Não houve lugar a debate. Apenas uma celebração encenada, enfeitada com estafadas profissões de fé na moeda única.
Arredados da celebração ficaram os efeitos do euro: a estagnação económica, os desequilíbrios comerciais, a desindustrialização da periferia, o esmagamento dos salários e o crescimento dos lucros do grande capital, logo, o crescimento das desigualdades sociais, a explosão do endividamento, a especulação sobre as dívidas soberanas, a instabilidade do sistema financeiro, a crise económica e social.
Estando conjunturalmente mascarados alguns destes efeitos, a situação de fundo não se alterou. O que não é igual a dizer-se que a Zona Euro não se modificou ao longo dos anos. Modificou-se. Está hoje mais rígida, mais constrangedora, mais intolerante. Aprofundou o seu pendor neoliberal e federalista.
A maquilhagem financeira e monetária promovida pelo Banco Central Europeu, com o despejo de liquidez no sistema financeiro, em nada modificou os alicerces do euro.
O edifício da moeda única foi reforçado com instrumentos como a Governação Económica, o Semestre Europeu, o Pacto de Estabilidade revisto e o Tratado Orçamental, que impõem regras cada vez mais intrusivas na vida dos Estados e no seu funcionamento democrático, mesmo no plano meramente formal. Atente-se nos vistos prévios aos orçamentos nacionais, nos avisos, nas ameaças de sanções e nas sanções propriamente ditas.
O alívio conjuntural de alguns dos efeitos do euro dá gás a novas e velhas ilusões e a requentadas promessas. Determina reposicionamentos oportunistas dos que, pela sua natureza, tendem a vogar ao sabor do vento. Ilusões como a de que é possível, a um país periférico, dentro do Euro, crescer de forma sustentada. Desenvolver-se. Implementar políticas alternativas, de cariz progressista. Há quem pareça pouco ter aprendido com a capitulação governo grego.
A par das ilusões, agitam-se falsas soluções, próprias de quem não procura senão manter o actual estado de coisas. É o caso da mirífica «capacidade orçamental da Zona Euro», bandeira da social-democracia europeia (e portuguesa), que se espera possa redistribuir umas migalhas dos ganhos alemães para cofinanciar subsídios de desemprego nos países periféricos, estagnados, cronicamente endividados e com desemprego estruturalmente elevado.
Vinte anos de euro justificam festa rija, sim, para todos os que dele beneficiaram: o grande capital, que beneficiou da redução dos custos unitários do trabalho, que aumentou a exploração; e particularmente o alemão, veja-se como a Alemanha aumentou espectacularmente os seus superávites comerciais. No fundo, os que assumiram o euro desde a primeira hora como um seu projecto político.
Mas vinte anos de euro justificam também que se intensifiquem esforços para o alargamento da compreensão da necessidade de rupturas. Sobretudo entre os que foram e são prejudicados pelo euro.
Para grande males, grandes remédios. O euro foi e é um obstáculo ao desenvolvimento de países como Portugal. Um obstáculo que deve ser removido.
Passados vinte anos, a questão que está colocada não é manter os trabalhadores e os povos amarrados à estagnação económica e ao retrocesso social, mas sim a libertação da teia de condicionamentos que coarctam o seu desenvolvimento. Entre esses condicionamentos, avulta a presença no euro.
A libertação da submissão ao euro é um percurso exigente e complexo. Mas é o único consentâneo com a afirmação soberana do direito ao desenvolvimento, com a recusa da dependência económica e da subordinação política.