Pensões e outros direitos sob ataque

João Ferreira

A poucos dias do fim da le­gis­la­tura, no Par­la­mento Eu­ropeu, este é o tempo de des­pa­char, a todo o vapor, a apro­vação das mais di­versas di­rec­tivas e re­gu­la­mentos.

O tur­bi­lhão le­gis­la­tivo tende a furtar ao ade­quado es­cru­tínio pú­blico al­gumas das peças que o com­põem. Não por serem pouco im­por­tantes. Ve­jamos dois exem­plos re­centes.

PS, PSD e CDS con­tri­buíram, com os seus votos, para aprovar le­gis­lação que ins­titui um mer­cado pan-eu­ropeu de fundos de pen­sões. Uma velha pre­tensão dos co­lossos fi­nan­ceiros que se de­dicam a jogar na ro­leta da es­pe­cu­lação bol­sista as pen­sões e re­formas dos tra­ba­lha­dores. É o caso da norte-ame­ri­cana Blac­kRock, que terá as­ses­so­rado a Co­missão Eu­ro­peia na con­cepção das pro­postas le­gis­la­tivas agora apro­vadas. Es­tamos pe­rante um passo im­por­tante no sen­tido da pri­va­ti­zação dos sis­temas pú­blicos de se­gu­rança so­cial.

Nada acon­tece por acaso. Esta pro­posta nasce pela mão dos mesmos que, em Por­tugal, que­riam forçar um corte per­ma­nente de 600 mi­lhões de euros nas pen­sões a pa­ga­mento. Era esta a «re­co­men­dação» da Co­missão Eu­ro­peia que cons­tava do ca­derno de en­cargos do go­verno PSD-CDS, der­ro­tado a tempo. Ne­nhum deles de­sistiu dos seus ob­jec­tivos. Sem sur­presa, o PS con­vergiu com PSD e CDS no apoio à pro­posta. Isto poucos dias de­pois de mem­bros do seu go­verno terem am­pli­fi­cado pu­bli­ca­mente cos­tu­meiros alertas sobre a «sus­ten­ta­bi­li­dade da se­gu­rança so­cial», que volta e meia re­gressam às te­le­vi­sões e às pá­ginas dos jor­nais.

O sector fi­nan­ceiro teve um papel co­nhe­cido na ir­rupção da crise ca­pi­ta­lista de 2008. Nos prin­ci­pais cen­tros do ca­pi­ta­lismo, foram muitos os tra­ba­lha­dores que viram es­vair-se as pou­panças de uma vida, ca­na­li­zadas que foram para com­plexos pro­dutos fi­nan­ceiros, as­so­ci­ados aos fundos de pen­sões pri­vados, que de um mo­mento para o outro se des­fi­zeram no ar como frá­geis cas­telos de cartas, le­vando con­sigo as pers­pec­tivas de uma ve­lhice tran­quila.

Na mesma sessão ple­nária, na se­mana pas­sada, foi também apro­vada – com os votos fa­vo­rá­veis de PS, PSD e CDS – a Di­rec­tiva sobre «con­ci­li­ação entre a vida pro­fis­si­onal e a vida fa­mi­liar dos pro­ge­ni­tores e cui­da­dores». O seu con­teúdo e pre­vi­sí­veis con­sequên­cias estão longe, muito longe, da apa­rente bon­dade dos ob­jec­tivos enun­ci­ados no tí­tulo.

Face aos di­reitos con­sa­grados na le­gis­lação por­tu­guesa, esta di­rec­tiva cons­titui um claro recuo. De­fine uma li­cença de pa­ter­ni­dade não obri­ga­tória e uma li­cença pa­rental de du­ração mi­ni­ma­lista, sem re­mu­ne­ração obri­ga­tória as­se­gu­rada. A re­fe­rência para a de­fi­nição do mon­tante da re­mu­ne­ração é o sub­sídio de do­ença, em vez do sa­lário efec­tivo, o que de­ter­mina uma sig­ni­fi­ca­tiva re­dução dos ren­di­mentos da fa­mília, de­sin­cen­ti­vando o gozo da li­cença e cri­ando uma pressão para que a mesma seja usu­fruída pelo ele­mento do casal com menor sa­lário, quase sempre as mu­lheres. A di­rec­tiva con­traria, assim, a ten­dência, que se vem re­gis­tando em Por­tugal, para uma cres­cente par­tilha de res­pon­sa­bi­li­dades entre os dois pro­ge­ni­tores no gozo da li­cença pa­rental.

Pior. O acesso às li­cenças e às cor­res­pon­dentes re­mu­ne­ra­ções está su­jeito a con­di­ci­o­na­lismos di­versos, desde as ne­ces­si­dades do pa­tro­nato a fac­tores de se­ni­o­ri­dade e tempo de tra­balho an­te­ri­ores ao pe­dido de li­cença. Re­sul­tado: tra­ba­lha­dores pre­cá­rios, com con­tratos de tra­balho tem­po­rá­rios, po­derão ser ex­cluídos do acesso à li­cença.

Se é certo que esta di­rec­tiva, por si só, não impõe a al­te­ração para pior da le­gis­lação por­tu­guesa, não é menos certo que po­derá não apenas fa­ci­litar ata­ques a di­reitos con­sa­grados, como li­mitar fu­turos avanços...

 



Mais artigos de: Europa

PCP defende nova orientação da Política Agrícola Comum

PRODUÇÃO Ao invés de se de­fender a agri­cul­tura fa­mi­liar e a so­be­rania ali­mentar e pro­mover a co­esão so­cial e ter­ri­to­rial, mantém-se uma PAC li­be­ra­li­zada, cada vez mais aberta à con­cor­rência mun­dial.

UE nivela por baixo direitos de progenitores e cuidadores

RE­TRO­CESSO A di­rec­tiva sobre con­ci­li­ação entre vida pro­fis­si­onal e fa­mi­liar dos pro­ge­ni­tores e cui­da­dores é um re­tro­cesso na de­fesa dos di­reitos das cri­anças e dos pro­ge­ni­tores e na pro­moção da pa­ren­ta­li­dade.

Face à seca extrema, PCP pede medidas para apoiar agricultores

Miguel Viegas, deputado do PCP no Parlamento Europeu, apresentou no dia 4 uma pergunta escrita à Comissão Europeia sobre criação de linha de apoio de emergência aos agricultores face à seca extrema. Lembrou o deputado comunista que no final do mês de Março, em Portugal continental confirmaram-se as piores previsões:...

Assinalado em Praga 80.º aniversário da ocupação nazi da Checoslováquia

O Movimento Checo da Paz e outras organizações contra a guerra e anti-fascistas assinalaram o 80.º aniversário da ocupação nazi alemã da Checoslováquia. O acto público comemorativo decorreu no dia 15 de Março, na Praça Venceslau, em Praga, capital da República Checa. Entre outros oradores,...