A União Africana concedeu à junta militar do Sudão dois meses para entregar o poder a uma autoridade civil que dirija a transição para a democracia.
A organização pan-africana vai assim ao encontro das exigências das forças democráticas sudanesas que, com expressivo apoio popular, desde há meses intensificaram a luta contra a ditadura e pela liberdade.
O Sudão é o terceiro maior país africano. Com mais de 40 milhões de habitantes, é rico em petróleo e gás natural – apesar de ter perdido três quartos desses recursos com a secessão do Sudão do Sul, em 2011. Além dos hidrocarbonetos, o Sudão beneficia da sua localização, junto do Mar Vermelho, via fundamental do comércio mundial.
Desde Dezembro de 2018 que a revolta sudanesa cresceu, primeiro com protestos contra a alta do preço do pão, depois com manifestações nas ruas e praças de Cartum e de outras cidades. Luta que a proclamação do estado de emergência e a brutal repressão, com mortes e prisões, não conseguiram travar.
O levantamento popular, incluindo manifestações permanentes à porta do Ministério da Defesa, cercado por populares, forçou a 11 de Abril o afastamento e a prisão do presidente Omar al-Bashir, através de um golpe palaciano levado a cabo por oficiais comprometidos com o regime, que assim procuraram preservar, com outros rostos, o poder ditatorial.
Os generais criaram um Conselho Militar de Transição (CMT), pretenderam prolongar o estado de emergência e prometeram entregar a governação aos civis num prazo de dois anos, o que não foi aceite pelas forças democráticas, apoiadas por centenas de milhares de pessoas nas ruas exigindo a imediata transferência do poder.
Os democratas sudaneses são representados pela plataforma Forças para a Liberdade e Mudança, que aglutina diferentes partidos políticos, incluindo o Partido Comunista Sudanês, associações profissionais e outras organizações que se opuseram à ditadura de al-Bashir. Nos últimos dias, têm estado em conversações com a junta militar para a formação de um órgão de transição com a participação maioritária de civis, o que, até agora, os generais não aceitaram.
A situação no Sudão é tensa, por um lado com a recusa do CMT em entregar ou sequer partilhar o poder com os civis e, por outro lado, com as massas populares a exigir o avanço de transformações democráticas. E é tanto mais grave quanto se sabe que os Estados Unidos e os seus aliados na região estão a apoiar os generais da junta militar, com as já habituais manobras de pressão e ingerência.
Na verdade, ao mesmo tempo que o povo sudanês rejeitava a usurpação ilegítima do poder pelos generais, os EUA, a Arábia Saudita, o Bahrein e os Emiratos Árabes Unidos reconheciam o CMT. Um enviado de Washington, Steven Koutsis, reuniu-se há dias, em Cartum, com Mohamed Daglo, número dois do CMT. Este general, explicam democratas sudaneses, é o comandante das Forças de Apoio Rápido, formadas no essencial pelas milícias Janjaweed, «que durante 15 anos espalharam o terror na região do Darfur, onde assassinaram milhares de pessoas, sendo por isso responsáveis por crimes contra a Humanidade».
Apesar das ingerências do imperialismo estado-unidense, o povo sudanês em luta vencerá e, mais cedo do que tarde, concretizará as suas aspirações à liberdade, paz e progresso.