Ver, ouvir e depois

Correia da Fonseca

Com a «redefinição de conteúdos» a que o «Jornal do Fundão» procedeu recentemente, foi extinta a área de crítica de televisão que aquele jornal mantinha há cerca de quarenta anos. Em consequência, a crítica de TV, que em tempos teve muita leitura na imprensa portuguesa e um consequente impacto na consciencialização dos telespectadores perante a carga televisiva que diariamente recebem, ficou reduzida aos notáveis textos de Bernardo de Brito e Cunha na edição em papel do «Jornal de Sintra» e a esta magra coluna. Se nos lembrarmos de que a televisão é um meio de comunicação social com uma «tiragem» de milhões distribuída ao domicílio e que entra pelos olhos e ouvidos de cada cidadão, isto é, com um incomparável poder de penetração, ficamos com alguma ideia acerca da sua relevância social, política, cultural, e apercebemo-nos de que uma reflexão acerca dos seus conteúdos é como o direito/dever de defesa mínimo que cabe a cada cidadão. É essa reflexão que cabe à crítica fazer, no elementar direito de opinião, e também suscitar no telepúblico como fundamental atitude de autodefesa. Perante o televisor não basta ver e ouvir: é preciso confrontar os conteúdos televisivos com outras fontes, lembrar quem escolheu aquelas mensagens e não quaisquer outras, e porquê. A crítica de televisão pode ajudar.

Em guarda

A crítica de televisão pode ajudar, e decerto por isso não tem tido uma existência fácil ao longo das décadas em que vem acompanhando a quotidiana convivência dos cidadãos com a TV. A coisa chegou ao ponto de, no tempo sombrio do fascismo, os mais impactantes textos de crítica de televisão, os de Mário Castrim no «Diário de Lisboa», terem sido terminantemente proibidos e o seu regresso só se ter verificado na sequência de uma verdadeira pressão popular. Esse tempo passou, hoje a imprensa respira melhor (mas nem sempre tão fundo quanto se supõe e quanto seria necessário), mas a crítica de TV continua escassa e débil. Como se não fosse necessária, isto é, como se uma reflexão acerca dos conteúdos que nos são diariamente injectados não fosse indispensável. E aqui caberá uma espécie de advertência: em verdade, na televisão tudo é informação, sem exclusão dos enredos das telenovelas e das notícias aparentemente anódinas. Sem exclusão dos bons momentos de TV, toda a televisão tem lastro, digamos assim. Pelo que é preciso estar como que permanentemente em guarda. Para nosso bem. E também talvez para bem dela.




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