Excedentes

Jorge Cordeiro

Num tempo em que con­ceitos apa­recem vi­rados de avesso, maior pru­dência se exige para que a co­luna dos in­cautos não ganhe gros­sura maior. Vem a pre­venção a pro­pó­sito da inu­si­tada pro­jecção que por via de ta­blóides e ecrãs foi dada à no­ticia de que o País tinha al­can­çado nos pri­meiros nove meses do ano um ex­ce­dente de 2,5 mil mi­lhões de euros. Não se vá tomar a «nuvem por Juno» e para que o di­lúvio que dali re­sulte só apanhe des­pre­ve­nido quem quiser, nada como co­locar água na fer­vura na ex­ta­si­ante eu­foria que tão épico e glo­rioso feito pa­rece ter pro­vo­cado nos cír­culos po­lí­ticos e eco­nó­micos que bem se co­nhecem.

Perdoe-se-nos esta mania de «des­mancha-pra­zeres», mas tro­quemos a coisa por miúdos. Per­cor­ramos o di­ci­o­nário e lá en­con­tra­remos que ex­ce­dente é por de­fi­nição, em termos eco­nó­micos, «uma quan­ti­dade que sobra de algo». Dei­xemos de lado con­ceitos de sig­ni­fi­cância mais com­plexos, que nos le­va­riam neste plano da ter­mi­no­logia eco­nó­mica a ou­tros des­tinos, e não nos fi­xemos, também, em mais densas re­fle­xões di­a­léc­ticas do que o termo con­tenha de «to­ta­li­dade» e «con­tra­dição», e fi­quemos pelo que mais li­teral e com­pre­en­si­vel­mente se al­cança. Ou seja, o que de modo co­me­zinho e pro­saico, em mais sim­ples falar, se re­sume ao co­nhe­cido «deve e haver».

O en­tu­si­asmo do go­verno, e da corte de ana­listas de «eco­nomês» ca­pi­ta­lista, tem que se lhe diga. O que tendo so­brado, com o des­tino que se co­nhece, em algum lado faltou. Dito de outro modo, o que tendo so­brado para o al­forge de cre­dores ex­ternos faltou na saúde, nos trans­portes, na cul­tura, no in­ves­ti­mento, na res­posta aos pro­blemas na­ci­o­nais. Em termos mais ge­rais e po­li­ti­ca­mente fa­lando sempre se pode dizer que este «ex­ce­dente» o que re­vela é que o que sobra neste go­verno em sub­missão lhe falta em von­tade para de­fender os in­te­resses do País e do povo.




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