Subsídiodependente, 35 anos, desempregado, em casa da avó

António Santos

Con­versas sobre os atri­butos com­pa­rados das «ge­ra­ções» causam-me uma re­acção cu­tânea hor­rível: fico logo cheio de co­mi­chões. Esta malta da minha ge­ração é muito sen­sível, não é? Mas de todos os mitos sobre as guerras ge­ra­ci­o­nais, que já de si são mais ve­lhos que a Sé de Braga, poucos serão mais senis do que aquela ideia de que os jo­vens cada vez saem de casa mais tarde porque, por condão ge­ra­ci­onal, são pre­gui­çosos e não gostam de sair da len­dária «zona de con­forto».

Se­gundo a mi­to­logia ge­ra­ci­onal, tratar-se-ia de uma coin­ci­dência que os países da UE onde os jo­vens saem mais tarde de casa dos pais (lista em que Por­tugal ocupa o oi­tavo lugar) sejam também os países onde os sa­lá­rios são mais baixos e o custo de vida é mais alto. Foi, por­tanto, com choque e per­ple­xi­dade que li, esta se­mana, no­tí­cias que me fi­zeram ques­ti­onar tudo aquilo em que acre­dito sobre este tema.

Num dos países que ocupa o ex­tremo oposto da lista do Eu­rostat, o Reino Unido, e onde, lo­gi­ca­mente, sair de casa dos pais devia ser a coisa mais normal do mundo, foi es­tre­pi­tosa no­tícia a his­tória de um jovem (?) de 35 anos e da sua mu­lher, que de­ci­diram sair de casa da avó, onde vi­viam, para se tor­narem in­de­pen­dentes. Pior: o mesmo jovem, que res­ponde pelo nome de Harry, nunca tra­ba­lhou um dia em toda a vida, de­pen­dendo in­tei­ra­mente de sub­sí­dios mi­li­o­ná­rios pagos pelos con­tri­buintes para sus­tentar uma vida de luxo e os­ten­tação… na casa da avó.

Es­tranho aos há­bitos in­gleses, só com al­guma in­ves­ti­gação com­pre­endi a jus­ti­fi­cação das pa­ran­gonas: o re­fe­rido jovem (?) Harry, que viveu na zona de con­forto, à sombra da ba­na­neira do Es­tado bri­tâ­nico, até aos 35 anos, em casa da avó, afinal até é, de toda a fa­mília, aquele que saiu de casa mais cedo. Diz que é uma tra­dição da fa­mília do Harry nunca sair de casa dos avós, não tra­ba­lhar, e viver à custa de sub­sí­dios fa­bu­losos pagos por quem tra­balha.

Fe­liz­mente para o Harry, mesmo tendo de pagar uma renda e per­dendo quase todos os sub­sí­dios, con­ti­nuará a viver con­for­ta­vel­mente, ga­rante a co­mu­ni­cação so­cial, dos ren­di­mentos da sua pró­pria imagem. Para se sus­tentar, o re­fe­rido jovem pla­neia pu­blicar sel­fies na sua conta de Ins­ta­gram, se­guida por dez mi­lhões de pes­soas, e en­caixar as rendas re­la­ci­o­nadas com di­reitos de imagem sempre que al­guém, que tra­balha ou quer tra­ba­lhar, que paga renda ou vive com os pais porque não a con­segue su­portar, que não tem di­reito a sub­sí­dios ou mesmo com eles vive à rasca, de­seje pos­suir ou con­sumir qual­quer coisa com o nome ou a fo­to­grafia do Harry, o tipo, re­corde-se, que saiu aos 35 anos de casa da avó, nunca tra­ba­lhou, e viveu sempre à custa de sub­sí­dios.

Eis a prova de como as ge­ra­ções se su­cedem tão idên­ticas que se es­pe­lham umas nas ou­tras: con­ti­nuam, sé­culo após sé­culo, as ge­ra­ções dos tra­ba­lha­dores a su­portar as ge­ra­ções dos pa­ra­sitas, en­quanto, uma após a outra, sempre a ide­o­logia do­mi­nante vai pro­mo­vendo a ideia de que a an­te­rior era me­lhor.



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