Legado da Vitória é decisivo para o êxito das lutas de hoje

DE­BATE O PCP pro­moveu no sá­bado, por ví­de­o­con­fe­rência, uma sessão pú­blica evo­ca­tiva dos 75 anos da Vi­tória sobre o nazi-fas­cismo, na qual se des­tacou a ne­ces­si­dade de co­nhecer as li­ções da His­tória para en­frentar com êxito os com­bates do pre­sente e do fu­turo pela pela paz, a de­mo­cracia e o pro­gresso so­cial.

É fun­da­mental aos re­vo­lu­ci­o­ná­rios apre­en­derem as li­ções da Se­gunda Guerra Mun­dial

O Dia da Vi­tória, que se as­si­nala pre­ci­sa­mente a 9 de Maio, é da­quelas datas de evo­cação obri­ga­tória, não só para os co­mu­nistas como para todos os de­mo­cratas e an­ti­fas­cistas. Quer pelo im­pacto de­ci­sivo que teve no rumo dos acon­te­ci­mentos e pelas li­ções e en­si­na­mentos que lega, como também pelo com­bate que urge dar ao re­vi­si­o­nismo his­tó­rico pro­mo­vido, a este pro­pó­sito, pelo im­pe­ri­a­lismo.

Aliás, se a po­de­rosa e mul­ti­fa­ce­tada ofen­siva ide­o­ló­gica em torno desta questão mostra a im­por­tância que as classes do­mi­nantes lhe atri­buem, os seus eixos cen­trais re­velam não só as suas in­ten­ções como também os seus re­ceios. É que não está em causa apenas a cons­trução da me­mória do pas­sado, mas também – e so­bre­tudo – a in­tenção de a uti­lizar para ob­jec­tivos bem ac­tuais: a in­ten­si­fi­cação da ex­plo­ração dos tra­ba­lha­dores e a ma­nu­tenção do pre­do­mínio eco­nó­mico e geo-es­tra­té­gico mun­dial, ­re­ceita do im­pe­ri­a­lismo para res­ponder à pro­funda crise sis­té­mica com que está con­fron­tado. Como os dias de hoje bem mos­tram, o fas­cismo e a guerra são al­guns dos seus in­gre­di­entes.

In­ver­sa­mente, o co­nhe­ci­mento da ver­da­deira na­tu­reza do nazi-fas­cismo, sua na­tu­reza, ori­gens e crimes; das causas, de­curso e des­fecho da guerra; dos an­ti­fas­cistas, com par­ti­cular des­taque para a União So­vié­tica, o Exér­cito Ver­melho, os par­ti­zans, os co­mu­nistas; do im­pe­tuoso ca­minho de li­ber­tação e eman­ci­pação que a Vi­tória pos­si­bi­litou, que marca ainda o nosso tempo – são im­por­tantes armas nas mãos dos que hoje pros­se­guem a luta pela paz, a de­mo­cracia e o pro­gresso so­cial. A questão foi assim co­lo­cada, no lan­ça­mento do de­bate, por Pedro Guer­reiro, do Se­cre­ta­riado do Co­mité Cen­tral do PCP, que in­sistiu na pre­mência da luta em de­fesa da ver­dade his­tó­rica.

Paz, so­be­rania, di­reitos

Luís Ca­ra­pinha, da Secção In­ter­na­ci­onal do PCP, abordou este «tema quase ines­go­tável» sob di­versos pontos de vista, ques­ti­o­nando, no final, se a Hu­ma­ni­dade seria capaz de re­tirar as de­vidas li­ções da His­tória. Nos tempos tur­bu­lentos em que vi­vemos, a maior po­tência im­pe­ri­a­lista do pla­neta, os EUA, «in­sistem em manter a sua he­ge­monia em de­clínio através da sua su­pe­ri­o­ri­dade inequí­voca no plano mi­litar», vi­sando pôr fim ao «equi­lí­brio nu­clear es­tra­té­gico» com a Rússia, alertou.

Mas a in­tenção do im­pe­ri­a­lismo de des­truir o «quadro criado no pós-guerra», com o qual, aliás, nunca se con­formou, vai para além da di­mensão mi­litar, su­bli­nhou Luís Ca­ra­pinha, re­fe­rindo-se ao per­ma­nente ataque aos di­reitos la­bo­rais, so­ciais e na­ci­o­nais então con­quis­tados. Aliás, lem­brou, o ex-pre­si­dente norte-ame­ri­cano Ge­orge W. Bush chegou mesmo a con­fessar o ob­jec­tivo de «mandar para o lixo» a ordem mun­dial de Ialta.

Com a fal­si­fi­cação da His­tória a atingir, hoje, um nível inau­dito, re­a­bi­lita-se e re­cu­pera-se o fas­cismo em muitos países, e com par­ti­cular vi­o­lência, na Eu­ropa Ori­ental. Na Ucrânia, aliás, o poder saído do golpe de Es­tado de 2014, apoiado pelos EUA e UE, é sus­ten­tado em grupos ne­o­nazis e fas­cistas e ar­vorou o an­ti­co­mu­nismo a «ide­o­logia de Es­tado».

As res­pon­sa­bi­li­dades das ins­ti­tui­ções da União Eu­ro­peia em todo este pro­cesso foram de­nun­ci­adas pelo res­pon­sável do Ga­bi­nete de Apoio aos De­pu­tados do PCP no Par­la­mento Eu­ropeu, João Pi­menta Lopes. A re­so­lução an­ti­co­mu­nista de 2019 não só fal­si­fica des­pu­do­ra­mente a his­tória dos acon­te­ci­mentos como pro­move «con­cep­ções re­ac­ci­o­ná­rias» e abre a porta à ge­ne­ra­li­zação da per­se­guição e proi­bição de par­tidos co­mu­nistas, de ou­tras forças pro­gres­sistas e do mo­vi­mento sin­dical, como su­cede já em vá­rios países da UE.

A cum­pli­ci­dade e apoio ex­plí­cito à NATO e ao seu con­fronto face à Rússia foi outra das ques­tões su­bli­nhadas por João Pi­menta Lopes, des­mon­tando a visão idí­lica da UE como «pro­cesso de in­te­gração que pro­move a paz». Também o papel que de­sem­pe­nhou na agressão à Ju­gos­lávia, nas guerras contra ou­tros países e no golpe de 2014 na Ucrânia valem mais do que todas as belas pa­la­vras. Além disso, acres­centou, as po­lí­ticas de ataque a di­reitos la­bo­rais e so­ciais «estão na origem do re­cru­des­ci­mento da ex­trema-di­reita».

Ne­o­li­be­ra­lismo e fas­cismo

O jor­na­lista José Goulão também alertou para o res­sur­gi­mento da ex­trema-di­reita, con­si­de­rando porém que esse não é o «único fas­cismo com que es­tamos con­fron­tados»: o ne­o­li­be­ra­lismo, ga­rante, «tem ten­dência para o fas­cismo» e «vive mal com a de­mo­cracia, mesmo que formal». Aliás, re­cordou, foi no Chile de Pi­no­chet que o ne­o­li­be­ra­lismo surgiu e há que ter pre­sente as pa­la­vras de Mar­garet That­cher quando la­mentou o facto de a Cons­ti­tuição do seu país não lhe per­mitir con­cre­tizar as «re­formas» le­vadas a cabo no Chile.

Cha­mando a atenção para o con­fronto entre «ca­pi­ta­lismos» – um de ten­dência glo­ba­lista e outro mais na­ci­o­na­lista, de sec­tores pre­ju­di­cados por essa mesma «glo­ba­li­zação» –, o jor­na­lista ga­rante que ambos «estão sin­to­ni­zados com o ne­o­li­be­ra­lismo» e sua na­tu­reza au­to­ri­tária: o caso da Ucrânia prova-o. Para José Goulão, a ac­tual si­tu­ação pan­dé­mica pode até ser o «ponto de agra­va­mento» destas ten­dên­cias fas­ci­zantes e cons­ti­tuir um novo «11 de Se­tembro». As ma­no­bras au­to­ri­tá­rias em curso em vá­rios países, a ins­ti­tu­ci­o­na­li­zação da cen­sura e da vi­gi­lância são ques­tões par­ti­cu­lar­mente pre­o­cu­pantes.

Kaoê Ro­dri­gues, da Di­recção Na­ci­onal da JCP, re­feriu-se à vi­o­lenta ofen­siva ide­o­ló­gica sobre a ju­ven­tude, pa­tente desde logo no con­teúdo dos ma­nuais es­co­lares, que, sobre a Se­gunda Guerra Mun­dial, equi­param co­mu­nismo e nazi-fas­cismo, apagam com­ple­ta­mente o papel de­ter­mi­nante da União So­vié­tica na Vi­tória e so­bre­va­lo­rizam a acção dos EUA.

Re­cor­dando todos os jo­vens que deram a vida na luta contra o nazi-fas­cismo, muitos dos quais co­mu­nistas, os com­bates tra­vados desde então pela paz e os di­reitos da ju­ven­tude e o papel as­su­mido pela Fe­de­ração Mun­dial da Ju­ven­tude De­mo­crá­tica, cons­ti­tuída logo em 1945, Kaoê Ro­dri­gues apontou a ne­ces­si­dade de travar o ataque em curso contra os di­reitos, de de­fender os pro­cessos pro­gres­sistas e de travar o fas­cismo.

Acção com­ba­tiva e co­e­rente

O Con­selho Por­tu­guês para a Paz e Co­o­pe­ração (CPPC) e a União de Re­sis­tentes An­ti­fas­cistas Por­tu­gueses (URAP) são duas das or­ga­ni­za­ções que, em Por­tugal, levam por di­ante uma acção com­ba­tiva e co­e­rente pela paz e a li­ber­dade, contra a guerra e o fas­cismo. Ambas in­te­gram pla­ta­formas in­ter­na­ci­o­nais am­plas, cons­ti­tuídas no res­caldo da Vi­tória: o Con­selho Mun­dial da Paz e a Fe­de­ração In­ter­na­ci­onal de Re­sis­tentes.

A pre­si­dente da di­recção na­ci­onal do CPPC, Ilda Fi­guei­redo, re­alçou a pre­mência de, hoje, de­nun­ciar e com­bater o poder des­tru­tivo das armas nu­cle­ares, a nova cor­rida aos ar­ma­mentos que marca o nosso tempo e a «cres­cente agres­si­vi­dade, in­ge­rên­cias e ame­aças do im­pe­ri­a­lismo norte-ame­ri­cano e dos seus ali­ados». Na ac­tual si­tu­ação pan­dé­mica, que afecta a vida de mi­lhões em todo o mundo, «urgia pôr fim a guerras, agres­sões e blo­queios ile­gais, e isso não está a acon­tecer», acusou, lem­brando a carta aberta ao Se­cre­tário-geral das Na­ções Unidas, subs­crita pelo CPPC e ou­tras or­ga­ni­za­ções, exi­gindo pre­ci­sa­mente o fim de blo­queios e san­ções.

Lem­brando a im­por­tância, para o mo­vi­mento da paz, da luta contra as armas nu­cle­ares, Ilda Fi­guei­redo chamou a atenção para a pe­tição exi­gindo das au­to­ri­dades por­tu­guesas a adesão do País ao Tra­tado de Proi­bição de Armas Nu­cle­ares, ne­go­ciado em 2017 no quadro das Na­ções Unidas. Re­alçou, em se­guida, a con­so­nância das causas e ac­ti­vi­dade do CPPC com os prin­cí­pios con­sa­grados na Carta das Na­ções Unidas e na cons­ti­tuição da Re­pú­blica Por­tu­guesa, prin­ci­pal­mente no seu ar­tigo 7.º.

O membro do Con­selho Di­rec­tivo da URAP, Fran­cisco Ca­nelas, de­nun­ciou as ten­ta­tivas em curso para re­a­bi­litar o fas­cismo que do­minou Por­tugal du­rante quase meio sé­culo, ga­ran­tindo que, também aqui, a «me­mória é um factor es­tru­tu­rante». Também o res­sur­gi­mento de forças de ex­trema-di­reita está longe de ser «es­pon­tâneo ou ino­cente», des­tacou o jovem an­ti­fas­cista. «Como vimos em re­lação ao pas­sado, são usadas nos pe­ríodos de crise para com­bater os que co­e­rente e or­ga­ni­za­da­mente se batem em de­fesa dos di­reitos, da so­be­rania, da de­mo­cracia e da paz», acres­centou Fran­cisco Ca­nelas.

Va­lo­ri­zando a ampla acção que cul­minou na cri­ação do Museu Na­ci­onal da Re­sis­tência e da Li­ber­dade, no Forte de Pe­niche, a luta contra a cri­ação de um museu Sa­lazar na terra natal do di­tador e as múl­ti­plas ses­sões que todos os anos se re­a­lizam em es­colas por oca­sião do 25 de Abril, o di­ri­gente da URAP ga­rantiu serem muitos os que, hoje, estão de­ter­mi­nados em de­fender e am­pliar a de­mo­cracia e com­bater o fas­cismo em qual­quer ex­pressão que ele res­surja.

Se há lição que a Vi­tória lega é pre­ci­sa­mente a de que só a re­sis­tência e a luta – ab­ne­gada, or­ga­ni­zada, de massas – são ca­pazes de travar os mais agres­sivos pro­jectos do im­pe­ri­a­lismo e er­guer al­ter­na­tivas pro­gres­sistas. É esse o de­safio que está hoje co­lo­cado aos co­mu­nistas, de­mo­cratas e an­ti­fas­cistas e, também para isso, é fun­da­mental co­nhecer a His­tória.




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