Longe do fim

Anabela Fino

Três dé­cadas de­pois de o ci­en­tista po­lí­tico e eco­no­mista norte-ame­ri­cano Francis Fu­kuyama ter pu­bli­cado o seu fa­moso ar­tigo «O fim da his­tória?» na re­vista The Na­ti­onal In­te­rest, a luta de classes – pasme-se! – não de­sa­pa­receu.

Para quem não se lembra, re­corda-se que Fu­kuyama, as­sessor in­te­lec­tual do pre­si­dente dos EUA Ro­nald Re­agan, ad­vo­gava então – ene­briado pela queda do muro de Berlim – que o «li­be­ra­lismo eco­nó­mico seria o ex­po­ente da evo­lução eco­nó­mica da so­ci­e­dade con­tem­po­rânea», que se ca­rac­te­ri­zaria pela «de­mo­cracia e pela igual­dade de opor­tu­ni­dades», e onde «todos se­riam li­vres e ca­pazes de con­quistar os seus ob­jec­tivos».

To­mando o fim da ordem mun­dial bi­polar pela acei­tação acé­fala do ca­pi­ta­lismo, os se­gui­dores do ideó­logo da era Re­agan/​That­cher sau­daram com en­tu­si­asmo a afir­mação dos EUA como a única po­tência a nível mun­dial.

Não foi pre­ciso es­perar muito para se per­ceber que a nar­ra­tiva não batia certo com a re­a­li­dade. Como es­creveu o co­lu­nista Ge­orge Will no dia se­guinte aos aten­tados de 11 de Se­tembro de 2001, a His­tória «voltou de fé­rias» e não dá mos­tras de abrandar.

Desde a fa­lência do Lehman Brothers, o quarto maior banco de in­ves­ti­mento dos EUA, em 2008, que gerou a maior crise fi­nan­ceira desde 1930 e pôs a nu a na­tu­reza in­trín­seca do ca­pi­ta­lismo dito de­mo­crá­tico-li­beral e o seu ma­nan­cial de es­quemas de des­re­gu­lação fi­nan­ceira, de­ri­vados fi­nan­ceiros so­bre­va­lo­ri­zados, cré­ditos hi­po­te­cá­rios de alto risco (sub­prime), com as ter­rí­veis con­sequên­cias que se co­nhece para a ge­ne­ra­li­dade dos países eu­ro­peus, que as te­o­rias do fim da his­tória per­deram o pio ou, na me­lhor das hi­pó­teses, pas­saram a piar bai­xinho.

Em con­tra­par­tida, os seus arautos en­grossam a voz em nome da «de­mo­cracia» do sis­tema ca­pi­ta­lista, usando os media ao seu ser­viço para ca­lu­niar, in­to­xicar, mentir, de forma a des­viar as aten­ções do agra­va­mento das de­si­gual­dades, o cres­ci­mento do de­sem­prego, da pre­ca­ri­e­dade, da ex­plo­ração, do re­curso à chan­tagem, às ame­aças e à guerra nas re­la­ções in­ter­na­ci­o­nais.

Por cá, os que no pas­sado re­cente re­pe­tiram à exaustão a men­tira das armas de des­truição ma­ciça que serviu de pre­texto à in­vasão e des­truição do Iraque em 2003, ou apoi­aram a in­ter­venção mi­litar na Líbia em 2011, ou no Afe­ga­nistão em 2001, ou na Síria em 2011, sempre em nome dos «di­reitos hu­manos», de «li­ber­dade» e da «de­mo­cracia», ou que passam ao lado do maior aten­tado ter­ro­rista da his­tória da hu­ma­ni­dade, a des­truição de Hi­roshima e Na­ga­saki com bombas ató­micas, pelos EUA, são os mesmos que re­correm a um dos mai­ores em­bustes da his­tória para de­sa­cre­ditar o so­ci­a­lismo e dizem re­cear a «he­ge­monia» co­mu­nista à frente de um museu. É a luta de classes es­gri­mida com uma das suas mais po­de­rosas armas, a co­mu­ni­cação so­cial.

 



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