Fartos de sobreviver «de mão estendida» bombeiros voluntários exigem valorização

AUDIÇÃO As mis­sões de­sem­pe­nhadas pelas as­so­ci­a­ções huma­ni­tá­rias de bom­beiros vo­lun­tá­rios (AHBV) estão em risco caso não seja al­te­rado o seu mo­delo de fi­nan­ci­a­mento e va­lo­ri­zado o seu papel como força de pro­tecção civil, alertou-se numa au­dição pro­mo­vida pelo PCP.

As AHBV são a mais im­por­tante or­ga­ni­zação de pro­tecção e so­corro

A ini­ci­a­tiva de­correu ao final do dia da pas­sada sexta-feira, 17, no Centro de Tra­balho Vi­tória, em Lisboa, e contou com a par­ti­ci­pação de di­ri­gentes e ope­ra­ci­o­nais de vá­rias AHBV, sete dos quais in­ter­vi­eram na sessão.

Na mesa, Fran­cisco Pe­reira, do Co­mité Cen­tral do PCP, con­duziu os tra­ba­lhos, acom­pa­nhado por Ale­xandre Tei­xeira, res­pon­sável por esta frente de tra­balho na Di­recção da Or­ga­ni­zação Re­gi­onal de Lisboa, An­tónio Fi­lipe, de­pu­tado do PCP na As­sem­bleia da Re­pú­blica (AR), Du­arte Cal­deira, in­ves­ti­gador e pro­fessor na área da pro­tecção civil, e Oc­távio Au­gusto, membro da Co­missão Po­lí­tica do Co­mité Cen­tral do PCP.

Foi aliás Oc­távio Au­gusto quem pri­meiro usou da pa­lavra, co­me­çando por su­bli­nhar que as AHBV «são a mais im­por­tante or­ga­ni­zação de pro­tecção e so­corro do País e as­sumem um papel cen­tral no Sis­tema de Pro­tecção Civil».

«Acon­tece porém que os bom­beiros e as suas as­so­ci­a­ções con­ti­nuam a ser con­fron­tados com uma imen­sidão de pro­blemas que li­mitam a sua acção e que podem co­locar em risco, já a curto prazo, a sua missão», alertou. «O di­ag­nós­tico está feito, o que tarda são as me­didas con­cretas para en­frentar esses pro­blemas», pros­se­guiu, lem­brando que «foi com esse ob­jec­tivo que apre­sen­támos, em 2017, na AR, um pro­jecto de re­so­lução com os eixos en­qua­dra­dores de uma outra po­lí­tica de Pro­tecção Civil que, em vez de os su­bal­ter­nizar, co­lo­casse os bom­beiros no lugar que devem ocupar nesse sis­tema, com as verbas, os meios e equi­pa­mentos cor­res­pon­dentes à im­por­tância es­tra­té­gica da sua missão, tendo sempre pre­sente que ela não se es­gota no com­bate aos in­cên­dios flo­res­tais».

Em sede de Or­ça­mento do Es­tado e mais re­cen­te­mente no con­texto pan­dé­mico, o PCP bateu-se pela va­lo­ri­zação dos bom­beiros e por res­postas à si­tu­ação crí­tica em que se en­con­tram a mai­oria das cor­po­ra­ções, agra­vada pelo surto epi­dé­mico, e para a qual o Go­verno não apre­sentou so­lu­ções, mas adi­a­mentos, sa­li­entou ainda Oc­távio Au­gusto.

O Par­tido, to­davia, não ig­nora que «os pro­blemas são de fundo, ra­dicam nas op­ções, muitas vezes er­radas e ra­ra­mente de­ba­tidas, de entre as quais o cró­nico sub­fi­nan­ci­a­mento é apenas mais um pro­blema», acres­centou o di­ri­gente co­mu­nista, que apro­veitou a oca­sião para re­cordar os eixos fun­da­men­tais e pro­postas que o PCP ins­creveu sobre esta ma­téria no seu pro­grama às úl­timas elei­ções le­gis­la­tivas.

Re­a­li­dade di­fe­rente
Na au­dição, todos os in­ter­ve­ni­entes sa­li­en­taram que a apro­vação, no dia an­te­rior, quinta-feira, 16, na AR, de um pa­cote de apoios às AHBV (ver pá­gina 20), é po­si­tiva. To­davia, não chega e, a con­cluir, Fran­cisco Pe­reira as­se­gurou que o PCP tomou boa nota das rei­vin­di­ca­ções ma­ni­fes­tadas para me­lhor in­tervir no fu­turo.

Unâ­nimes foram as opi­niões sobre os prin­ci­pais pro­blemas apon­tados pelos seis in­ter­ve­ni­entes que se se­guiram à apre­sen­tação de Du­arte Cal­deira, que em traços largos fez o es­quiço do «es­tado da arte» e das al­te­ra­ções ocor­ridas no sector nos úl­timos anos: mais cerca de 200 mil ser­viços anuais, ex­cluindo fogos ru­rais, a mai­oria dos quais de emer­gência pré-hos­pi­talar, pro­to­co­li­zado com o INEM; quebra do nú­mero de vo­lun­tá­rios e cres­ci­mento do nú­mero de pro­fis­si­o­nais, sem os quais é assim im­pos­sível cum­prir as vá­rias mis­sões de so­corro, con­du­zindo a uma mais pe­sada es­tru­tura de custos com o pes­soal; de­sa­de­quação do mo­delo de fi­nan­ci­a­mento em vigor dado que os custos dos ser­viços pres­tados se en­con­tram muito acima dos va­lores re­ce­bidos da Ad­mi­nis­tração Cen­tral e en­ti­dades que dela de­pendem, co­lo­cando uma per­ma­nente sobre-pressão de te­sou­raria nas cor­po­ra­ções, o que foi agra­vado so­bre­ma­neira nos úl­timos meses.

Neste con­texto, con­cluiu Du­arte Cal­deira, é fácil de per­ceber que «não se pode falar em Pro­tecção Civil sem falar em bom­beiros», como é evi­dente a ne­ces­si­dade de uma nova re­lação entre o Es­tado e as cor­po­ra­ções.

De­fi­nição ur­gente
Ora, o gar­rote fi­nan­ceiro às AHBV, que as obriga a «andar de mão es­ten­dida», de­sig­na­da­mente junto das au­tar­quias, pese em­bora aquelas sejam, no ter­reno, os prin­ci­pais e pri­meiros agentes da exe­cução da atri­buição cons­ti­tu­ci­onal de so­corro às po­pu­la­ções, que com­pete ao Es­tado, foi jus­ta­mente abor­dado. E em di­versas ver­tentes por Edu­ardo Cor­reia, do Con­selho Exe­cu­tivo da Liga dos Bom­beiros Por­tu­gueses, por An­tónio Tre­moço e Oc­távio Ma­chado, das di­rec­ções dos BV da Ama­dora e de Pal­mela, res­pec­ti­va­mente; pelos mem­bros dos co­mandos dos BV de Sa­cavém e da Póvoa de Santa Iria, Jorge Jorge e An­tónio Car­valho, por Inácio Es­pe­rança, da Fe­de­ração dos BV de Évora, e Rui La­ran­jeira, dos BV de Águas de Moura.

De entre os vá­rios exem­plos avan­çados, para além do facto de os custos com o pes­soal serem hoje mui­tís­simos mai­ores de­vido à ne­ces­si­dade de as­sentar o fun­da­mental da ac­ti­vi­dade so­li­ci­tada num corpo pro­fis­si­onal (es­tima-se que uma as­so­ci­ação pre­cise, no mí­nimo, entre 30 a 40 ho­mens em per­ma­nência para res­ponder a todas as so­li­ci­ta­ções, ex­cluindo pes­soal de apoio), sa­li­enta-se a dis­cre­pância do custo do trans­porte de do­entes ou dos ser­viços pres­tados ao INEM com os va­lores pagos aos bom­beiros; a exi­gui­dade da com­par­ti­ci­pação pú­blica face ao preço dos Equi­pa­mentos de Pro­tecção In­di­vi­dual, quer para as do­enças in­fecto-con­ta­gi­osas – neste fase o COVID-19, so­bre­tudo –, quer também dos usados no com­bate aos in­cên­dios; a ne­ces­si­dade ex­trema de re­no­vação e re­qua­li­fi­cação da frota e a ine­xis­tência de me­ca­nismos que o pos­si­bi­litem com efi­cácia e sem com­pro­meter as contas.

Alvo de crí­ticas foi também as me­didas do Go­verno que em­purram para mais en­di­vi­da­mento as AHBV na ac­tual con­jun­tura de surto epi­de­mi­o­ló­gico, mas aqueles que de­viam re­pre­sentar as as­so­ci­a­ções, e de­sig­na­da­mente a Liga, não es­capou in­có­lume, me­re­cendo pa­la­vras muito duras por ter acor­dado com o Go­verno apoios que per­pe­tuam e apro­fundam os dé­fices.

Os par­ti­ci­pantes também la­men­taram que, de há 15 anos a esta parte, a aposta da Pro­tecção Civil pri­vi­legie a cri­ação de corpos cen­tra­li­zados, numa ló­gica de mi­li­ta­ri­zação da área que apro­funda as de­si­gual­dades exis­tentes nos apoios às cor­po­ra­ções. Por isso, pe­diram uma de­fi­nição clara do que o Es­tado pre­tende das AHBV, além de rei­vin­di­carem a va­lo­ri­zação das ins­ti­tui­ções e dos que nelas tra­ba­lham e prestam vo­lun­ta­riado, quer ao nível re­mu­ne­ra­tório, quer na atri­buição de sub­sí­dios em ope­ra­ções ou em si­tu­ação de pron­tidão no quartel, quer ainda na pro­tecção em caso de aci­dente, entre ou­tros planos.

 



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